A campanha do presidente Donald Trump está secretamente pagando US$ 15.000 por mês à esposa de um dos filhos de Trump e à namorada de outro, afirmou o Huffington Post na sexta-feira (24), de acordo com “altos republicanos com conhecimento dos pagamentos”.
Trump costuma ser notícia mais pelas tacadas no atacado – como as recentes denúncias sobre as investidas de seus hotéis para serem aquinhoados na ajuda emergencial, o que foi expressamente proibido no pacote de março do Congresso.
Ou por se recusar a mostrar seu imposto de renda [ou as digitais da evasão de impostos?]. Ou pelas diárias que seus hotéis cobram de servidores públicos que optaram por se hospedar, em viagem, nas empresas do chefão. Ou pela nomeação de doadores graúdos de campanha para cargos como embaixadas e agências governamentais.
Mas, como o Huffpost está mostrando, o presidente bilionário também belisca no varejo, sem qualquer preconceito.
As felizardas são Kimberly Guilfoyle, a namorada do filho mais velho, Donald Jr., e Lara Trump, esposa do filho do meio, Eric, conforme duas fontes descritas como “conselheiros informais da Casa Branca e sob condição de anonimato”.
As duas fontes não estão certas de quando os pagamentos começaram, mas disseram ao Huffpost que estão sendo feitos pelo gerente da campanha, Bradley Parscale, através de uma empresa dele, ao invés de diretamente pela campanha ou pelo Partido Republicano, para driblar normas legais.
“Eu posso pagar a elas o quanto eu quiser”, disse ao portal norte-americano o gerente da campanha, Parscale.
Críticos do embróglio, inclusive republicanos, disseram que essa foi a forma encontrada para passar ao largo das normas da Comissão Federal Eleitoral, que requer das campanhas, partidos políticos e outros comitês que detalhem seus gastos.
Parscale é “um lavador de dinheiro, não um gerente de campanha”, afirmou um ex-assessor da campanha presidencial de Mitt Romney de 2012, Stuart Stevens. “É por isso que ele está no posto”, acrescentou.
Para o especialista em financiamento legal de campanhas da ong Causa Comum, Paul Ryan, “um monte de gente” próxima a Trump está se locupletando. “Eles não querem que os doadores saibam – porque, ao final das contas, é dinheiro doado”.
“MULHERES POR TRUMP”
Lara Trump participou da campanha de Trump de 2016 realizando entrevistas na mídia em nome de seu sogro e continuou como conselheira senior dos eventos “Mulheres por Trump” na campanha deste ano.
No início de 2017, Parscale confirmou que a tinha contratado para trabalhar para a empresa dele, que, por incrível coincidência, continua a trabalhar pela campanha de Trump.
Já Guilfoyle tem acompanhado Donald Jr. em eventos de campanha desde que os dois começaram a namorar há dois anos. Ela era apresentadora da Fox News até deixar a rede em 2018.
A namorada de Donald Jr. foi nomeada em janeiro presidente do ‘Vitória de Trump’, um comitê conjunto de levantamento de fundos usado para solicitar e distribuir dinheiro para a campanha de reeleição de Trump e para o Comitê Nacional Republicano (RNC, na sigla em inglês).
“Ela faz alguma coisa, mas é apenas como uma chefe de torcida idiota”, disse sobre Guilfoyle ao Huffpost um dos conselheiros sob anonimato da Casa Branca. “Ela atende telefonemas de doadores, e é ridículo”, acrescentou
A existência dos pagamentos – embora não as quantias – foi primeiro noticiado pelo New York Times, que relatou uma cena na qual Guilfoyle inquiriu Parscale sobre porque os cheques de pagamento dela sempre atrasavam. O incidente ocorreu em 18 de junho de 2019, sugerindo que os pagamentos a ela estavam acontecendo há algum tempo.
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As normas da FEC exigem que campanhas, partidos políticos e outros comitês registrem todos os gastos, inclusive pagamentos para empregados. Normas desrespeitadas pela campanha de reeleição de Trump e pelo RNC através de pagamentos feitos pelas empresas privadas de Parscale.
Ao todo, as empresas de Parscale ― Giles-Parscale e Parscale Strategy LLC ― receberam US$ 38.9 milhões da campanha de Trump, do RNC, dos comitês conjuntos de levantamento de fundos e de um fundo ‘super-PAC’ pró Trump desde o dia da posse até fevereiro de 2020, de acordo com os registros disponíveis.
Canalizar dinheiro das doações para as famílias de seus filhos tornou-se uma prática padrão de Trump para redirecioná-las para seu próprio bolso, o que começou em 2016, assim que esse se tornou o candidato republicano provável e começou a levantar grandes quantias de dinheiro de republicanos.
Trump imediatamente quintuplicou o aluguel que ele estava cobrando de sua campanha na Trump Tower, de cerca de US$ 35.000 por mês, para quase US$ 170.000. Ele também começou a cobrar da campanha somas de cinco ou seis dígitos pelo uso de seus hotéis e clubes de golfe para hospedar levantadores de fundos.
O que continuou depois da sua eleição, até os dias de hoje. Sua campanha ainda paga à Trump Tower US$ 37.542 de aluguel, embora a sede seja em um prédio de escritórios de alto padrão em Arlington, Virgínia.
A campanha de reeleição e o RNC também continuam a hospedar levantadores de fundos nas propriedades de Trump, pondo centenas de milhares de dólares nas caixas registradoras do bilionário.
Todas essas entidades são de propriedade da Organização Trump, que por sua vez é de propriedade de um truste que Trump criou após sua eleição e do qual é o único beneficiário. “Evasão fiscal e corrupção é o negócio da família”, sintetizou Robert Weissman, presidente da entidade Public Citizen.
Antes dessas denúncias sobre as noras de Trump, eram mais freqüentes os comentários sobre Ivanka, a filha preferida, e seu marido, o especulador imobiliário e lobista Jared Kushner, envolvidos em toda a sorte de expedientes.
SEM PÂNTANO
A revelação de que o “negócio da família” de Trump estava buscando para seu hotel da capital Washington um naco da ajuda federal ao setor hoteleiro do pacote de março partiu do New York Times na terça-feira (21), provocando reações de condenação.
“Oh, alô corrupção”, tuitou o roteirista de televisão J. Holtham. “Não sei se é para rir ou para chorar”, disse a jornalista Renee Montagne, conforme o Common Dreams.
“Nada de pântano para drenar aqui, pessoal. Saiam fora”, registrou Karr, da Free Press, em alusão a uma das promessas centrais de campanha de Trump de 2016.
O Trump International Hotel, com 263 quartos, é operado pela Trump Organization, em um prédio federal a poucos blocos da Casa Branca, na Avenida Pensilvânia. A empresa de Trump negociou em 2013 um acordo de leasing por 60 anos e paga ao erário quase $268.000 por mês, mas quer dar um jeito de parar de pagar.
Conforme o NYT, o pagamento do aluguel está em dia, de acordo com o filho Eric Trump, que cuida do dia a dia do hotel, mas ele confirmou que a empresa iniciou uma negociação com a administração federal sobre possíveis atrasos nos futuros pagamentos mensais. “Tratem-nos igual”, declarou Eric.
O jornal observou que a empresa de Trump foi barrada pelo Congresso de obter alívio do fundo de resgate de US$ 500 bilhões administrado pelo Departamento do Tesouro e um executivo disse na terça-feira que fora decidido não pedir um empréstimo federal através da Administração das Pequenas Empresas.
A recusa de Trump em prometer que nenhum dinheiro do bilionário fundo de resgate de empresas sob comando do seu secretário do Tesouro Steven Mnuchin iria para seu império de hotéis e resorts de golfe havia causado enorme indignação na semana que antecedeu a aprovação do pacote.
CAIXINHA OBRIGADO
Apesar da conhecida cláusula constitucional dos “emolumentos”, pela qual o presidente não pode receber benesses de governos estrangeiros nem nenhum recurso proveniente do erário, que não seja seu salário (US$ 400.000 anual), Trump não perde uma oportunidade fazer reforçar o cofrinho.
Como lembrou Robert Reich, ex-secretário do Trabalho de Clinton, lobistas representando o governo saudita pagaram por estimados 500 pernoites no Trump International Hotel de Washington um mês após sua eleição e o príncipe coroado Mohamad bin Salman alugou tantos quarto ali que a receita subiu em 2018 depois de anos de declínio.
Em um comício no Alabama, Trump na maior sem cerimônia disse: “Arábia Saudita, eu me dou bem com todos eles. Eles compram apartamentos de mim. Eles gastam US$ 40 milhões, US$ 50 milhões”. “Eu deveria não gostar deles? Eu gosto muito deles”.
Reich também registrou outra façanha do governo Trump: “Então alguém doou US$ 1 milhão para o comitê da posse de Trump e subsequentemente recebeu um empréstimos de US$ 5 bilhões do Departamento de Energia” – um caso sob investigação de promotores federais. Na lógica de Trump, “qual é o problema? Ambas as partes obtiveram o que queriam”, ironizou.
Redes de tevê também mostraram a enorme quantidade de lobistas que foram nomeados por Trump para as agências encarregadas de fiscalizar as corporações para as quais estes tinham trabalhado – o que nos EUA é conhecido como “porta giratória”. Ora no governo, ora no setor privado, mas sempre faturando e lubrificando a máquina: a ‘arte do acordo’, diria Trump.
Mas, com a atual crise, a boiada, mesmo, vai passar pelo quase meio trilhão de dólares que, depois de devidamente alavancado, vai virar US$ 4 trilhões para obsequiar as corporações e bancos amigos, com o cupincha Mnuchin com a chave do cofre – e Trump na Casa Branca.