Conseguir se cadastrar para solicitar o auxílio emergencial tem sido só o início do verdadeiro calvário a que milhões de brasileiros estão sendo submetidos para ter acesso ao recurso.
As filas não param de crescer em frente às agências da Caixa Econômica e da Receita Federal em todo o país. As aglomerações se estendem, virando esquinas, congestionando calçadas e colocando milhões de pessoas em risco diante da contaminação do Covid-19.
As pessoas viram a madrugada no desespero de receber o auxílio de R$ 600 ou R$ 1.200, para as mães chefes de família. Na maioria dos casos, o único recurso com que podem contar agora para sobreviver.
Os mais necessitados, aqueles que não têm acesso a Internet, que não têm celulares ou se têm, são aparelhos antigos, incompatíveis para aplicativos, sem crédito, ou mesmo pessoas que não estão familiarizadas com o mundo digital, idosos e com parcos recursos de leitura e escrita, são exatamente os que mais sofrem.
Muitos ainda tentam se cadastrar, ou regularizar o CPF para ter direito ao benefício, mas as dificuldades para, de fato, ter acesso ao dinheiro, até para os que já tiveram seu cadastro aprovado e o recurso depositado na conta digital da Caixa, criada para os que não tinham conta bancária, não ficam atrás.
Como conta Dona Ermelinda dos Santos, de 63 anos, que virou a madrugada de quarta para quinta-feira em uma agência da Caixa, no bairro da Aclimação, em São Paulo, com quem conversei.
Antes da pandemia, Dona Ermelinda sustentava a casa trabalhando com reforma de roupas, e diz que agora os fregueses sumiram. Ela até conseguiu se cadastrar no site do Auxílio Emergencial, com a ajuda da neta, e fala da alegria que sentiu quando a neta verificou que o seu pedido tinha sido aprovado. Mas a alegria duraria pouco, como ela relata:
“Acho que até tenho sorte por ter em casa uma pessoa nova, que sabe mexer com essas coisas de internet e celular. Mas mesmo isso não resolveu até agora. Vimos que o cadastro tinha sido aprovado na semana passada e, desde então, minha neta tenta movimentar o dinheiro no aplicativo Caixa Tem, e nada”.
Segundo Dona Ermelinda, elas tentaram de toda forma resolver tudo pelo celular para que ela não precisasse sair à rua e enfrentar fila no banco, se expondo ao coronavírus, já que é diabética e do grupo de risco, mas as tentativas não deram em nada.
Na fila junto com Dona Ermelinda, a neta explica que tem passado horas no aplicativo Caixa Tem, desde que o pedido da avó foi aprovado, mas que sempre aparece um aviso que “você está em uma fila digital” e “continue aguardando”.
“Quando se consegue terminar uma etapa, depois de muito tempo, o sistema cai, e você tem que recomeçar tudo de novo”, conta.
“É uma verdadeira tortura, até a pessoa desistir e vir enfrentar a fila para conseguir ter o dinheiro na mão ou fazer uma transferência, pagar uma conta”, diz.
Mas, para o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, o problema das filas é uma questão cultural da população brasileira.
Em entrevista na quinta-feira, o ministro declarou que “algum grau de fila nas agências da Caixa vai ter porque é da natureza nossa, de nossa cultura”.
“Tem uma parcela da população que não tem aplicativo, que não usa o sistema digital, que precisa ir a Caixa ver e pegar o dinheiro”, afirmou.