Essa confirmação de alguém tão próximo do presidente da República o enreda mais em crime de prevaricação
Mais um “segredo de polichinelo” desvendado na esteira da CPI da Covid-19. O ajudante de ordens do presidente Jair Bolsonaro, Jonathas Diniz Vieira Coelho, que é capitão de corveta da Marinha, confirmou em depoimento à Polícia Federal, o encontro do seu chefe com o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF).
Segundo ele, em março deste ano, o deputado o enviou mensagens pedindo que avisasse ao presidente sobre “esquema de corrupção pesado” no Ministério da Saúde, em torno da compra da vacina Covaxin para combater a pandemia do novo coronavírus.
O contrato do governo com a Precisa Medicamentos para comprar a Covaxin, do laboratório indiano Bharat Biotech, era de R$ 1,6 bilhão.
No depoimento, ao qual o jornal O Globo teve acesso, o ajudante de ordens confirmou que conversou com Miranda em 20 de março, após voltar de evento em Taguatinga, cidade do DF distante uns 40 km de Brasília, onde acompanhava o presidente.
No texto enviado pelo deputado, dizia para “avisar o PR que está rolando um esquema de corrupção pesado na aquisição das vacinas dentro do Min. da Saúde”.
Coelho disse, também, que o presidente teve conhecimento dessa mensagem. Imediatamente, Bolsonaro teria pedido encontro com o deputado “ainda no dia 20/03/2021”, no Palácio da Alvorada.
IRMÃOS MIRANDA
O capitão de corveta teria, então, ligado para o deputado federal informando sobre a orientação.
Como resposta, Miranda escreveu que “compareceria ao Palácio da Alvorada acompanhado por duas pessoas”, que depois se soube que eram a esposa e o irmão do deputado Luis Ricardo Miranda, que é concursado do DLog (Departamento de Logística) do Ministério da Saúde.
Além disso, no depoimento, Coelho disse lembrar que o encontro “ocorreu entre às 16h30 e 17h30”. A reunião ocorreu na biblioteca do Alvorada, que é a residência oficial da Presidência da República.
CRIME DE PREVARICAÇÃO
O inquérito da Polícia Federal, no âmbito do qual o ajudante de ordens prestou depoimento, busca apurar se Bolsonaro cometeu crime de prevaricação.
Segundo o Código Penal brasileiro, isso ocorre quando funcionário público “retarda ou deixa de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”.
DENÚNCIAS DOS IRMÃOS MIRANDA
No fim de junho, o deputado Luis Miranda (DEM-DF) revelou ter encontrado Bolsonaro em 20 de março para denunciar irregularidades na negociação de compra da vacina indiana Covaxin, intermediada pela Precisa Medicamentos.
Em nenhum país relevante do mundo houve compra de vacinas intermediadas por atravessadores. No mercado internacional, as negociações, venda e compra são e foram feitas entre farmacêuticas e governos.
O parlamentar também disse que informou ao presidente que o irmão Luis Ricardo estaria sofrendo pressões para aprovar a importação do imunizante e pagar adiantada uma quantia exorbitante (US$ 45 milhões, no câmbio de hoje R$ 250 milhões), que não constava em contrato.
DEPOIMENTO NA CPI
Convocados à CPI da Covid-19 no Senado, os irmãos Miranda detalharam a sequência de acontecimentos, bem como o encontro com Bolsonaro. Durante o depoimento, o deputado federal disse, ainda, que o presidente da República citou o nome do deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, ao ouvir as denúncias de irregularidade.
Depois, o presidente confirmou ter se encontrado com Luis Miranda. Bolsonaro, porém, nunca comentou sobre a menção a Ricardo Barros. É pouco provável que Miranda tenha citado o nome de Barros aleatoriamente.
M. V.