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Parlamentares da oposição a Tarcísio e representantes dos movimentos sociais denunciaram as irregularidades do processo e apresentaram exemplos de crises geradas pela privatização
A Audiência Pública sobre a privatização da Sabesp realizada nesta quinta-feira (16) na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) foi marcada pelos intensos protestos populares em repúdio ao projeto do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) que tramita em regime de urgência.
A discussão, que faz parte do processo de tramitação do Projeto de Lei (PL) 1501/2023, contou com a presença da secretária de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística do Estado, Natália Resende, de representantes do Sindicato dos Trabalhadores em Água e Esgoto (Sintaema), parlamentares e de outros representantes da sociedade civil.
Os parlamentares de oposição e representantes de movimentos sociais, de moradia e estudantis contrários à privatização da Sabesp citaram como exemplo negativo da privatização os problemas recentes com a Enel, concessionária de energia elétrica no estado e alvo de uma CPI na Alesp, após mais de 2 milhões de pessoas na Grande São Paulo serem afetadas pela falta de luz por mais de 7 dias após o temporal do dia 3 de novembro.
Em sua fala inicial, José Faggian, presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema) apresentou os principais dados sobre a eficiência da Sabesp sob controle estatal, desmentindo a suposta “falta de capacidade” da empresa de atender a população do Estado.
“O nosso serviço, oferecido a mais de 70% da população, é um serviço de excelência. Embora o discurso tente, a todo momento, dizer que nós não somos eficientes, os números provam que a Sabesp é uma empresa eficiente, que presta um serviço de excelência para o povo de São Paulo e principalmente porque o saneamento tem uma interface direta com a saúde”, disse.
“Recentemente numa uma pesquisa feita pelo Datafolha mostra que mais da metade da população de São Paulo aprova o serviço feito pela Sabesp e que tem uma grande capacidade, por exemplo, de reação a desastres climáticos, como a gente viu em São Sebastião, no litoral norte e diferente do que acontece ou do que aconteceu nas últimas semanas aqui pela Enel e graças ao processo de privatização”, destacou.
Faggian ressaltou que o estado, ao abrir mão do controle da empresa, perde a capacidade de garantir a qualidade do serviço. “O que vai ser entregue da Sabesp é justamente o controle e, o acionista privado, o controlador privado, ele vai maximizar o lucro e com isso vai demitir os trabalhadores e vai reduzir os investimentos e isso está comprovado na experiência mundial. Não podemos permitir que a Sabesp vire uma nova Enel”, ressaltou.
A base aliada ao governador do estado, favorável ao projeto de privatização, participou da audiência em menor número, mas buscando tumultuar o debate.
A Secretária de Meio Ambiente, Natália Resende defendeu a privatização da Sabesp como o único caminho para a universalização do saneamento básico sem o aumento tarifário para a população. “A gente quer fazer uma venda de ações, ser mais eficiente ao tirar nossas amarras e trazer investidores para ajudar a fazer mais investimentos e usar parte desses recursos na redução tarifária”, afirmou.
Natália foi a única representante do Executivo e ligada à empresa a discursar. A ausência do presidente da Sabesp, André Salcedo, foi duramente criticada pelos deputados.
Da mesma forma, o deputado do Movimento Brasil Livre (MBL) Guto Farias (UB), defendeu a privatização, chamando o serviço da Sabesp de ‘serviço porco’ e alegou que os paulistas não terão aumento na tarifa com a privatização da Sabesp. No entanto, não é isso que os dados e os fatos mostram.
PRIVATIZAÇÃO SEM QUALQUER EMBASAMENTO
O deputado Guilherme Cortez (Psol) denunciou que o estudo encomendado pelo governo não tem nenhum embasamento plausível para a privatização da empresa pública. Além disso, destacou que privatizar a empresa só prejudicará muito a população, pois não haverá subsídio cruzado.
“A secretária Natália cita o estudo do Banco Mundial que foi encomendado pelo governo do estado de São Paulo para embasar a privatização. O deputado Guto Farias (UB) faz o mesmo. O que eles esquecem de dizer, e é importante para os arautos da dignidade com dinheiro público saber o que eles esquecem de dizer é que esse estudo tinha dois valores de contratação. Eram R$ 8 milhões se o estudo fosse contra a privatização e R$ 45 milhões se fosse a favor. O Banco Mundial vai dizer que não tinha um estudo pronto. Era óbvio que se o valor mais alto fosse pago para justificar a privatização, esse estudo já estava encomendado”, disse.
“Agora, o governo fala que a Sabesp é cabide de emprego, porque eles não conhecem o serviço público e não sabem que para entrar no serviço público tem que fazer concursos. Então eu acho que o governo deveria adotar a mesma linha. Quando alguém vai prestar um concurso público, se não passar no concurso, não paga. Só paga se passar, porque é isso que eles estão fazendo com o Banco Mundial para justificar uma privatização. Não há nada que justifique a privatização no estudo”, continuou.
“Eu tenho muito orgulho de representar uma cidade que é Franca, uma região que universalizou o atendimento, o saneamento básico há mais de 20 anos para agora virem falar que precisa privatizar a Sabesp para que isso aconteça. A secretária fala que 180 cidades podem ter o contrato interrompido, mas ela esquece de falar que 360 cidades que a Sabesp atende hoje não são lucrativas para a empresa e que ela só tem acesso à água e saneamento básico porque uma empresa pública faz subsídio cruzado e sabemos que nenhuma empresa privada vai fazer isso, como não fez em nenhum lugar do mundo onde privatizou”, ressaltou.
O parlamentar citou ainda o exemplo de Tocantins, que “tem um dos piores sistemas de saneamento básico do Brasil”. “Sabe o que a empresa privatizada do Tocantins fez? Das 139 cidades do Estado, ela pediu pro Estado pegar de volta 78, as 78 cidades mais pobres, as 78 cidades não iria ter lucro, a capital, o filé, fica com a iniciativa privada, então esse é o neoliberalismo de fachada do Brasil, o investimento tem que continuar sendo público”, denunciou Cortez.
ESTELIONATO ELEITORAL
O deputado Antonio Donato (PT) denunciou o estelionato eleitoral de Tarcísio, pois em seu programa de governo, aprovado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), não há qualquer menção ou qualquer programa para a privatização da Sabesp.
“Estou aqui com o programa de governo do governador Tarcísio registrado no TSE. Não tem nenhuma linha sobre a privatização da Sabesp. Nenhuma linha. Na campanha, o então candidato Tarcísio começou a falar em privatização. Viu que ia perder voto e recuou. O que ele prometeu foi fazer o estudo, e aí se contratou o estudo, que não tem qualquer embasamento ou argumento convincente para a privatização. Secretária Natália, a senhora tem excelente formação acadêmica, a gente vê, a senhora sabe que esse estudo é mal feito, não tem nenhum critério de pesquisa, não tem nenhum critério sério de fontes bibliográficas, de base de dados, não tem nada”, disse Donato.
“Como é que a Assembleia vai autorizar uma venda sem saber o valor da empresa? Você venderia sua casa, autoriza o seu procurador a vender sua casa sem saber por quanto ele vai vender? De jeito nenhum! Então eu queria perguntar para a secretária quantas ações serão colocadas, qual o valor de venda, porque isso até agora não apareceu, e isso é importante. O PL da Sabesp que está aqui nesta casa autoriza a venda da Sabesp sem parâmetros, sem metas. É um cheque em branco”, afirmou.
Contrária à privatização, a deputada Paula da Bancada Feminista (Psol) comparou as tarifas praticadas por companhias de saneamento privadas e públicas. “267 cidades ao redor do mundo que privatizaram o saneamento básico voltaram atrás e reestatizaram os serviços, porque sabem que a desestatização significa a piora dos serviços e tarifas mais caras”, disse.
PRIVATIZAR COLOCA EM RISCO A POPULAÇÃO
O presidente da União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São Paulo (UMES), Lucca Gidra, afirmou que é necessário defender a Sabesp, uma empresa eficiente e que dá lucro, que serve bem o povo paulista.
“Todos aqui consomem a água da Sabesp. Tomam banho, lavam louça, bebem a água fornecida por uma das maiores empresas de saneamento do mundo, a Sabesp. Ao contrário do que o governo tenta passar, a nossa Sabesp é uma empresa eficiente, dá lucro, contribui com a arrecadação do nosso Estado e serve bem, serve muito bem ao povo Paulista! Só há um motivo para privatizar a Sabesp: o governador quer passar a mão na carteira do trabalhador! Querem entregar o que foi construído pelo nosso povo para seus amigos e financiadores”, disse Lucca.
“Realmente o povo está endividado, por conta dos juros abusivos, e o que mais tem consumido o salário da população são as contas básicas. Privatizar a Sabesp é aumentar a quantidade de endividados! Vender a Vale e ter mais de 300 mortos em Brumadinho e Mariana, entregar a Eletropaulo aos incapazes da Enel, que deixaram 2 milhões sem energia por quase 7 dias não foi o suficiente? Privatizar a Sabesp é colocar em risco a saúde, a vida, o meio ambiente e o bolso da população”, disse Lucca.
“Tarcísio está na contramão do mundo! Vários países estão reestatizando o saneamento. A Sabesp é uma empresa estratégica para o Brasil. São Paulo a locomotiva do Brasil, está decaindo. O Estado mais industrializado está perdendo sua indústria e o desemprego e a crise econômica são a nossa triste realidade. Enquanto isso, Tarcísio não mede esforços para vender o que é do povo. Não vamos permitir que isso aconteça!”, afirmou.
Renê Vicente, diretor do Sintaema, ressaltou a importância de deixar claro para os deputados a opinião dos trabalhadores: “Nós temos uma opinião que foi coletada através de milhares de votos aqui no Estado de São Paulo, por meio de votos do Plebiscito Popular Contra a privatização da Sabesp, Metrô e CPTM. Mais de 97%, dos 879 mil votos coletados, mostraram contrariedade ao projeto”, disse.
Segundo Vicente, é fundamental lembrar do perigo que representa a entrega de uma empresa como a Sabesp para a iniciativa privada.
“Hoje no Brasil são cerca de 500 municípios que são tocados pela iniciativa privada. O principal exemplo é o caso da Saneatins, privatizada nos anos 2000. Em 2013, adivinhem? A BRK Ambiental [empresa privada que ficou no lugar da Saneatins], devolveu para o estado de Tocantins 78 municípios não rentáveis, aqueles que não davam lucro. O governo de Tocantins teve que criar às pressas a Agência Tocantinense de Saneamento. Esta é a lógica da iniciativa privada. Ficaram apenas com os municípios que davam lucro”, exemplificou.
TIAGO CÉSAR
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