O Brasil tem 522 cidades que foram penalizadas, nos últimos quatro anos por consequências do esquema de direcionamento de verbas realizado pelo governo Bolsonaro à sua base, o chamado orçamento secreto. Levantamento do jornal ‘Estado de S. Paulo’ demonstra que as cidades em questão não contam com padrinhos políticos, o que massifica o abandono na distribuição de recursos federais e das políticas públicas.
O levantamento revela “desertos” de representatividade política, onde vivem 13 milhões de pessoas. Esse fenômeno está espalhado por todas as regiões, inclusive em Estados ricos do Sul e do Sudeste.
Deputados e senadores costumam dar mais verbas federais, proporcionalmente, para as cidades onde ganharam mais votos. A Constituição e as leis orçamentárias, porém, exigem que a distribuição siga critérios socioeconômicos e não eleitorais. Sem um mecanismo para garantir que o dinheiro vá para quem realmente precisa, o Brasil se transforma a cada eleição num país dividido entre ganhadores e perdedores.
Os exemplos citados no levantamento estão no sertão do Piauí, separados por duas horas de carro. Considerados extremos, uma cidade tem representantes no Congresso e outra não. Os três mil moradores de João Costa (PI) têm tudo: um estádio de futebol que os moradores consideram “padrão Fifa”; três postos de saúde; dezenas de ônibus escolares e ambulâncias; uma creche nova e uma praça recém-inaugurada, com decoração típica de condomínio fechado. A prefeitura, base eleitoral do senador bolsonarista Ciro Nogueira (PP), atual ministro da Casa Civil, e de sua ex-mulher, a deputada Iracema Portella (PP), sendo a cidade, a campeã nacional de verbas do orçamento secreto em relação à população. É como se cada morador tivesse recebido R$ 1.710,96 desde 2020. O montante é quase R$ 200 maior que a segunda colocada (Afonso Cunha, MA).
Enquanto isso, os 3,8 mil habitantes de Brejo do Piauí têm acesso precário à saúde e à educação. Qualquer ocorrência mais séria precisa ser tratada fora. A cidade apostou em um candidato derrotado ao Legislativo e ficou prejudicada no rateio das verbas. Pacato, o lugarejo tem Índice de Desenvolvimento Humano Municipal de 0,515 – bem abaixo da média do Piauí, de 0,571.
O levantamento inédito feito ao longo de seis meses, foi confrontado uma série de dados para revelar os “desertos” existentes no País, que, juntos, formam um território mais populoso que o do Estado do Paraná e equivalente às áreas da Bahia e de São Paulo. As maiores concentrações estão no sudoeste do Piauí, na área central de Goiás, no sudoeste da Bahia, no Bico do Papagaio – entre Tocantins, Maranhão e Pará -, no leste e no norte de Mato Grosso.
Em média, as prefeituras dessas regiões receberam R$ 11,46 a menos por habitante desde 2019 em relação às demais cidades do País que concentraram os votos em deputados eleitos. Num município de 30 mil habitantes, por exemplo, significaria uma diferença de R$ 330 mil, valor equivalente a um ônibus escolar rural licitado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).