Ele disse que vai revelar os nomes dos países que compram, mas foi ele quem atendeu o pleito dos madeireiros e derrubou as regras de combate à venda ilegal do produto
Na manhã de terça-feira (17) Jair Bolsonaro usou a reunião da Cúpula dos Brics, bloco que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, para afirmar que divulgará uma lista de países que criticam os números do desmatamento do Brasil, mas importam madeira ilegal.
“Revelaremos nos próximos dias o nome dos países que importam essa madeira ilegal nossa através da imensidão que é a região amazônica, porque daí, sim, estaremos mostrando que estes países, alguns deles que muito nos criticam, em parte têm responsabilidade nessa questão”, disse ele.
No mesmo dia em que Bolsonaro fez esse discurso, totalmente contrário ao que tem feito em relação ao meio ambiente, documentos do Ibama são divulgados, pela TV Globo, mostrando que o governo facilitou exportação de madeira extraída ilegalmente. Os documentos mostram que em fevereiro, madeireiras do Pará pediram ao Ibama para mudar uma regra de controle de exportação que existia há nove anos.
As empresas queriam vender madeira para o exterior apresentando apenas o documento de origem florestal (DOF), feito pelas próprias empresas e que originalmente só serve para permitir o transporte da mercadoria até o porto. A regra tinha o objetivo de coibir a extração ilegal de madeira e a sua exportação.
Eduardo Bim, indicado de Bolsonaro para a direção do Ibama, contrariou laudos técnicos da Diretoria de Uso Sustentável da Biodiversidade e florestas do Ibama e fez exatamente o que os madeireiros solicitaram: suspendeu – por meio de um despacho – os efeitos de uma instrução normativa. Isso tudo depois do completo esvaziamento que o governo Bolsonaro fez nos organismos de fiscalização do meio ambiente.
O Instituto Socioambiental, o Greempeace e a Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente entraram na Justiça em junho contra a decisão tomada por Eduardo Bim, que flexibilizou as normas para a exportação de madeira brasileira.
Na ação, as três entidades afirmam que o Ibama permitiu a extinção do mecanismo de fiscalização ambiental existente até então, relativo ao controle da exportação de cargas de madeira retirada das florestas do país para que fosse estabelecida uma nova dinâmica de fiscalização, a ser realizada quando a madeira já não estaria mais em solo brasileiro.
Não é à toa que dados do sistema Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), mostram que, entre agosto de 2019 e julho de 2020, houve um aumento de 34,5% nos alertas de desmatamento em relação ao mesmo período do ano anterior. Ao todo, foram 9.205 km² desmatados.
Mesmo ainda sem os dados completos de outubro, o desmatamento na Amazônia no mês foi recorde e apresenta um crescimento de 37% em relação a outubro de 2019.
Até o último dia 23, foram derrubados cerca 758 km² de floresta, mostram dados do Deter, programa do Inpe que visa ajudar órgãos governamentais no combate ao desmatamento. Tais dados podem também ser usados para observar tendências de aumento ou diminuição de desmate. O recorde anterior para um mês de outubro pertencia a 2016, com cerca de 750 km² de destruição.
Esta medida do governo para facilitar o contrabando de madeira está dentro do que defendeu o ministro de Bolsonaro, Ricardo Salles, na famosa reunião ministerial de 22 de abril. Ele disse com todas as letras que o governo tinha que aproveitar que só se falava em pandemia para “passar a boiada”, ou seja, para derrubar as regras de defesa do meio ambiente.
O argumento dos madeireiros para convencer o presidente do Ibama a derrubar as regras de exportação foi de que eles estavam deixando de fazer vendas porque compradores internacionais exigiam a autorização de exportação emitida pelo instituto, uma garantia de que a madeira não foi retirada de forma ilegal das florestas brasileiras.
O presidente do Ibama defendeu que a fiscalização tem que ser feita com “inteligência” e justificou a decisão de suspender a instrução normativa de controle de exportação.
“A fiscalização amostral era regra anterior e continua sendo regra agora. Nada mudou. Não existe uma diminuição do esforço de fiscalização. Ao contrário, como eu digo, hoje, uma ou duas vezes por semana, a Diretoria de Biodiversidade do Ibama aqui na sede manda os relatórios das contas para possibilitar uma fiscalização com inteligência”, declarou Bim. Os madeireiros ilegais aplaudiram.