Nas cordas, está fazendo qualquer negócio
Caminhos são opostos. Zumbi da economia levou uma enrolada
A necessidade que Jair Bolsonaro teve de afirmar, peremptoriamente, na segunda-feira (27), em entrevista coletiva no Planalto, que “o homem que decide a economia no Brasil é um só: chama-se Paulo Guedes”, mostra apenas uma coisa: que Guedes está com espaço cada vez menor dentro do governo.
Significa que, depois que o general Braga Neto ocupou o espaço vazio deixado pela visão retrógrada e recessiva dos chicago-boys da Economia e lançou o seu programa desenvolvimentista “Pró-Brasil”, Paulo Guedes não está mais com essa bola toda.
A verdade é que Guedes e sua equipe estão mais perdidos que cego em tiroteio. Não sabem como enfrentar a crise e ameaçaram uma debandada geral, caso o plano do general Braga Neto continuasse sendo prestigiado e fortalecido pelo governo.
Aferrados ao passado ultraneoliberal, os membros da equipe de Guedes, e ele próprio, fingem não ver que a realidade mudou drasticamente. A crise exige novas políticas, e eles, acostumados ao rentismo, literalmente não sabem o que fazer.
O ministro deu mostras, inclusive, nos últimos dias que não conseguia nem decidir que sapato deveria calçar para ir a uma solenidade no Palácio do Planalto. Parecia um zumbi de máscara e sem sapatos ouvindo o discurso sem-pé-nem-cabeça de Bolsonaro.
Ironicamente, diante de toda essa situação, o presidente saiu da reunião da segunda-feira com o ministro ao lado e disse com ares de anúncio: “ele [Guedes] nos dá o norte, nos dá recomendações e o que nós realmente devemos seguir”.
Era o que Guedes e seu grupo de salteadores do patrimônio queriam ouvir como condição para permanecerem um tempo a mais em seus cargos. A única coisa que eles vinham fazendo até o início da pandemia era desmontar o Estado brasileiro, estrangular os serviços públicos, fechar hospitais públicos, leiloar as empresas brasileiras, perseguir servidores e transferir boa parte do dinheiro público para os bancos. Queriam o aval para seguir com esse desastre, mesmo durante a após a pandemia.
Essa politica de Guedes & Cia já vem há algum tempo provocando a desindustrialização do país, o desmonte do Estado e a elevação do desemprego. Diante da crise mundial do coronavírus e suas consequêcias no Brasil, essa política tem tudo para tornar-se uma hecatombe econômica.
Ela simplesmente foi confrontada de frente pelo plano desenvolvimentista do general Braga Neto. O plano do general vai no sentido oposto ao de Guedes. Bolsonaro, nas cordas pela sequência de denúncias contra ele, acabou sendo obrigado a se equilibrar entre as duas opções. Certamente para adiar por algum tempo a saída do desgastado Paulo Guedes.
Com o início da crise do coronavírus, toda essa destruição econômica, comandada por Guedes, ficou evidente para a população e cobrou o seu preço. Falta de leitos de UTI, falta de respiradores, falta de insumos para exames, falta de profissionais de saúde, tudo isso acrescido de uma violenta retração das atividades econômicas. Milhões de pessoas perderam seus empregos e suas rendas.
Qualquer um percebia que era necessária uma mudança rápida de rumos. Era urgente a tomada de medidas para a reversão dessa situação, sob pena de entrarmos na fase mais aguda da pandemia com o sistema de saúde colapsado e a economia em frangalhos.
Guedes, teimoso, mantinha a ideia fixa de seguir se desfazendo de empresas públicas, perseguindo servidores e cortando investimentos públicos. A única despesa aceita por ele é aquela que vai para o pagamento de juros aos bancos.
Foi necessária a ação enérgica do Congresso Nacional para empurrar o governo e tirar a equipe de Guedes da letargia e da insistência em manter a política desastrosa de ajustes fiscais e queima de patrimônio. Um orçamento de guerra foi aprovado. Quando o mundo inteiro está abrindo os cofres públicos para salvar suas economias, Guedes e sua equipe sentaram nos cofres e passaram a acusar a Câmara dos Deputados de aprovar “pautas bomba”. Para eles, essas “pautas bomba” eram as despesas emergenciais para garantir renda, para a contratação de médicos, de enfermeiros e os investimentos para a abertura de leitos de UTI por parte dos administradores de estados e municípios.
A insistência de Guedes em seguir sua cartilha recessiva e entreguista, com os graves riscos que isso representa para o futuro do país, levou o general Walter Braga Neto a tomar uma atitude mais lúcida e apontar um outro rumo para a economia do país com o lançamento, na semana passada, de seu programa de desenvolvimento batizado de “Pró-Brasil”.
O programa, que ainda não está totalmente estruturado, baseia seus objetivos e metas estratégicas de desenvolvimento – para o período pós pandemia – no aumento dos investimentos públicos. O plano incomodou os defensores do arrocho e do estado-mínimo por ser completamente incompatível com o programa econômico de Guedes.
A ausência do ministro e de sua “equipe econômica” na apresentação do Pró-Brasil foi um dos indícios de que a iniciativa andava à revelia de Guedes. O fato desgastou o ministro da Economia que começou a sentir o calor da fritura. Insatisfeito, ele levou a questão à Bolsonaro. Guedes saiu da reunião satisfeito com a declaração de apoio recebida. Aquelas típicas declarações dadas a quem está próximo de cair. “Tem todo o nosso apoio”.
“Queremos reafirmar a todos que acreditam na política econômica que ela segue, é a mesma política econômica”, disse Paulo Guedes na coletiva da manhã de hoje, tranquilizando o chamado “mercado”, ou seja, os monopólios financeiros. O fato é que Guedes precisou desse empurrão do presidente para seguir ministro, enquanto o general Braga Neto segue firme com seu programa Pró-Brasil.
Para o professor e economista Nilson Araújo de Souza, que concedeu entrevista ao HP para analisar o plano do general Braga Neto, só o fato de a proposta ter surgido já sinaliza que rumos diferentes “do que Guedes vem empurrando goela abaixo do país” são possíveis. E ainda: a crítica orquestrada ao plano por parte de porta-vozes do mercado e setores mais retrógrados do governo “indica claramente que a equipe de Guedes, e ele próprio, sentiram o golpe e estão reagindo à mudança”.
“O [plano] de Guedes, na verdade, é um descaminho. Em oposição ao programa de Guedes, que, no seu ultraneoliberalismo doentio, pretende entregar todo o patrimônio público ao capital estrangeiro e vem arrasando a economia, a proposta do general Braga Netto tem a intenção de retomar o desenvolvimento com base na ação do Estado na economia”, concluiu o professor.
S. C.