Foram anuladas condenações por corrupção no total de 277 anos e 9 meses de cadeia
Os ataques de Bolsonaro à Operação Lava Jato, no domingo (12/12), mostram, outra vez, o que já estava exposto e a nu: o quanto a retórica anticorrupção desse fascista era falsa.
Tal constatação não depende da opinião que tenhamos das atividades da força-tarefa da Lava Jato ou de Sérgio Moro e outros juízes que emitiram sentenças nos processos, tanto em primeira instância, quanto em segunda (TRFs), quanto em terceira (STJ) ou quarta (STF) instâncias.
Bolsonaro ataca a Lava Jato não por qualquer restrição que tenha, em geral, à Operação, até porque nem sabe em que ela consistiu. Ele a ataca porque sua família e seus sequazes foram agarrados em procedimentos corruptos – e porque Moro tornou-se um fantasma, para ele, nas eleições.
Já voltaremos ao caso de Moro. Por agora, basta sublinhar que sua principal preocupação, em seu recente livro, não é justificar seus atos durante a Lava Jato, mas explicar porque saiu da magistratura para entrar no governo Bolsonaro, apesar de todas as advertências, inclusive nossas e da maior parte da força-tarefa da Lava Jato, de que estava entrando em um governo corrupto por sua própria origem (v. HP 01/11/2018, Bolsonaro quer usar Moro para dar respeitabilidade de fachada a um governo sem nenhuma).
Realmente, este foi o maior erro de sua vida – e por ele está pagando e ainda pagará por alguns anos.
Entretanto, vejamos qual o problema, na questão do combate à corrupção – o que também permitirá entender porque um candidato com um viés tão neoliberal quanto Moro (ele parece achar que figuras como Pastore, Campos Neto, e, inclusive, Guedes, são algo como gênios econômicos) está com um desempenho tão precocemente bom nas pesquisas, em um país que foi devastado pelo neoliberalismo.
Até agora, segundo levantamento realizado pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, publicado também no último domingo, das penas resultantes dos processos da Operação Lava Jato, e outras operações, foram anuladas sentenças no total de 277 anos e 9 meses de cadeia (cf. Luiz Vassallo, Tribunais revogam 277 anos de penas em processos de casos de corrupção, OESP 12/12/2021).
E não são apenas as sentenças da Operação Lava Jato que foram anuladas, mas sentenças que condenaram corruptos que nada têm a ver com a Lava Jato – em processos que nada tinham a ver com a alegada parcialidade do então juiz Moro, que estava longe deles.
Por exemplo:
“Desse total [de 277 anos e 9 meses], 78 anos e 8 meses eram penas aplicadas a agentes políticos. O levantamento mostra que 14 casos tiveram suas investigações e processos anulados em 2021 por tribunais superiores. Ao todo 221 anos e 11 meses de condenações diretamente ligadas à Lava Jato foram canceladas por irregularidades. As anulações afetaram ainda outras operações, como a Greenfield” (grifo nosso).
É inútil, aqui, localizar essa enxurrada de anulações de penas somente no ex-presidente Lula.
Na verdade, essas revogações de condenações beneficiaram, por exemplo, o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, o ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, o ex-presidente Michel Temer e o também ex-presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves.
Além dos casos acima, existe outro: “… o ministro do STF Gilmar Mendes decidiu trancar uma ação do MPF, em São Paulo, contra o senador José Serra (PSDB) por corrupção passiva e lavagem no valor de R$ 27,5 milhões oriundos da Odebrecht. Para o ministro, o caso deveria ter tramitado na Justiça Eleitoral, e não em uma vara criminal da Justiça Federal”.
Nenhum desses casos – nem a prescrição do processo do triplex de Guarujá – foi uma absolvição por razões de mérito. Ou seja, a Justiça não reconheceu a inocência de nenhum dos condenados que tiveram a pena anulada.
Aqui, é bom lembrar que apenas a Lava Jato redundou em uma devolução efetiva de R$ 4 bilhões – e uma devolução total, com os acordos de leniência, de R$ 14 bilhões ao longo dos próximos anos.
E ninguém está propondo que se devolva esse dinheiro aos condenados que tiveram suas penas anuladas…
Todas as razões das revogações de pena – 277 anos e 9 meses – foram processuais, ou seja, por razões de procedimento (ou, no caso de Lula, pela idade, que determinou a prescrição, no caso do triplex).
O motivo mais comum de anulação foi o envio sistemático de processos por corrupção à Justiça Eleitoral, por decisão do STF, pressupondo que o objetivo do roubo ao dinheiro público fosse o financiamento eleitoral – por isso, anularam-se processos já julgados, às vezes com condenações em mais de uma instância, mesmo em casos onde é duvidosa a motivação eleitoral, ou onde esta é, claramente, secundária.
Quando não é assim, há outras razões para o escape aos processos por corrupção. Arruma-se alguma coisa. Até mesmo antes do julgamento. Vejamos o caso do atual senador Flávio Bolsonaro, protegido do pai, que usa seu cargo e influência para livrá-lo do longo braço da Lei:
“Outro caso emblemático de anulações antes do julgamento do mérito foi o da rachadinha, que apurou desvios de R$ 6 milhões em salários de servidores do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) na Assembleia Legislativa do Rio. Os recursos teriam sido operados pelo então assessor Fabrício Queiroz. O STF anulou o relatório do Coaf que embasou as primeiras suspeitas contra Queiroz e Flávio.”
Em suma, para que Flávio Bolsonaro não fosse a julgamento, anulou-se a prova – ou parte dela: exatamente uma série de relatórios da unidade de inteligência financeira do próprio Estado brasileiro, o Coaf.
Assim, não é um milagre que Moro, apesar de seu reacionarismo, tenha estreado tão bem nas pesquisas.
C.L.
Moro tá bem nas Pesquisas!!! Pensei que esse Jornal foi contra uma Justiça com Justiçamento, parece que abraça a candidatura do Suspeito e Parcial Juiz de Curitiba!!!
Não abraçamos, evidentemente, a candidatura do Moro – que a matéria descreve como neoliberal, direitista, etc. Você é que lê apenas o que quer, e quando não encontra o que quer, deforma o que lê.