“Estão esticando a corda. Faço qualquer coisa pelo meu povo. Esse qualquer coisa é o que está na nossa Constituição, na nossa democracia, no nosso direito de ir e vir”, disse ele durante aglomeração no domingo (21)
A resposta que Bolsonaro deu ao chamamento dos governadores por um pacto nacional para enfrentar a tragédia da pandemia foi radicalizar as suas críticas às medidas de contenção do vírus e fazer mais ameaças.
Ele usou uma reunião de apoiadores que foram ao Palácio da Alvorada neste domingo (21), para dar um ataque e xingar as medidas que foram tomadas pelos Estados após o agravamento da pandemia.
“Se alguém acha que algum dia abriremos mão de nossas liberdades, estão enganados”. “Alguns tiranetes tolhem a liberdade de muitos de vocês”. “Contem com as Forças Armadas pela democracia e pela liberdade” “Estão esticando a corda. Faço qualquer coisa pelo meu povo. Esse qualquer coisa é o que está na nossa Constituição, na nossa democracia, no nosso direito de ir e vir”, ameaçou.
Não só os governadores estão tomando medidas urgentes e pressionando o governo federal para também agir diante da tragédia sanitária que tirou a vida de quase 300 mil brasileiros e está matando mais de duas mil pessoas por dia. Agora, os grandes empresários de vários setores da economia, inclusive do mercado financeiro, economistas, ex-ministros e ex-diretores do Banco Central, acabam de lançar um manifesto, assinado por cerca de 500 personalidades, criticando o negacionismo de Bolsonr frente à tragédia.
O documento cobra de forma veemente medidas imediatas por parte do governo federal para conter o vírus. Os empresários apoiam as medidas tomadas pelos governadores e exigem rapidez na aquisição de vacinas.
Não por outro motivo, Bolsonaro usou a expressão de “esticar a corda”. Nitidamente, Bolsonaro é quem estica a corda da paciência da sociedade com o seu negacionismo. As últimas pesquisas de opinião mostram bem que a população brasileira não está nada satisfeita com a condução que o governo federal vem dando no combate à pandemia.
As principais capitais do país estão entrando em colapso por conta da explosão dos casos da doença. A falta de leitos de UTI na rede pública e privada já está levando as pessoas a morrerem sem conseguir atendimento médico. É a maior crise sanitária da história do país, segundo relatório da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Mesmo assim, Bolsonaro continua sabotando a compra de vacinas e aparelhando a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para atrasar na aprovação de novos imunizantes para uso emergencial, como está ocorrendo com a Sputnik V, a vacina russa que já está em uso com sucesso em mais de 40 países, e que pode ser fabricada por uma indústria nacional.
Uma atitude flagrantemente criminosa. A União Química, empresa brasileira que assinou parceria com o Instituto Gamaleia, da Rússia, já anunciou que poderia já ter entregue 10 milhões de doses da Sputnik V e produzir mais oito milhões de doses por mês. Os empresários que assinaram o manifesto lançado no fim de semana alertaram que, se for mantido o atual ritmo de vacinação, o país levará três anos para vacinar toda a população, o que é inaceitável.
Tão grave quanto o boicote às vacinas é o comportamento irresponsável de Bolsonaro ante às medidas de prevenção necessárias para interromper a transmissão do vírus. Ele afrontou todas as medidas de restrição de movimentação de pessoas. Fez aglomerações no domingo em Taguatinga, cidade-satélite de Brasília, e, no Palácio da Alvorada. Além disso, continua incentivando a abertura irrestrita do comércio e a suspensão das medidas restritivas de prevenção. Chegou a apelar ao Supremo para tentar derrubar medidas de proteção da população tomadas por alguns governadores.
Bolsonaro não só promoveu aglomerações como ameaçou os governadores e prefeitos que estão agindo corretamente para tentar evitar a circulação do vírus assassino. Ele chamou os gestores estaduais e municipais de “tiranetes”. Disse que as decisões tomadas por eles tolhem a liberdade e impedem as pessoas de ir e vir e de trabalhar. “O povo precisou, nós atendemos. Agora, o que o povo mais pede pra mim em todo lugar que eu vou é: ‘Eu quero trabalhar’. O trabalho [ele é interrompido por gritos de “queremos trabalhar”] dignifica o homem e a mulher”, disse ele.
Bolsonaro repete, agora, que todos devem voltar ao trabalho; que o transporte deve voltar a carregar milhões de pessoas; que as ruas devem voltar a ficar cheias de gente. É nesse sentido que ele está pressionando e ameaçando. Sobre as mortes, ele responde “e daí?” “Fazer o quê?” “Não pergunte para mim, eu não sou coveiro” “Quanto mais rápido as pessoas se infectarem, melhor”.
Como se isso não bastasse – e na contramão de quase todos os países do mundo, ele diminui a importância da ajuda emergencial para aqueles que perderam seu sustento durante a crise, debochando das pessoas que precisam dessa ajuda por viverem “de favor do Estado”. “Ninguém quer viver de favor do Estado. Quem vive de favor do Estado abre mão da sua liberdade”, acusou ele. Na verdade, por ele ajuda nenhuma seria concretizada.
“O povo precisou, nós atendemos”, disse Bolsonaro, no domingo, em uma demonstração de pura demagogia. O povo precisou e continua precisando de ajuda para fazer frente à pandemia. E o governo regateia e retarda o quanto pode. Diante da pressão da sociedade pelo retorno da ajuda emergencial, suspensa pelo governo desde o início do ano, Bolsonaro acabou propondo um valor bem menor, de R$ 150, e para um número bem menor de pessoas comparado ao de 2020, não sem antes chantagear, junto com seu ministro da Economia, Guedes, o Congresso Nacional para incluir na Constituição medidas de arrocho fiscal e perseguição aos servidores públicos.
Ao encerrar sua cantilena, Bolsonaro acusou os governadores e prefeitos de pretenderem implantar o socialismo no Brasil. “Nós vamos vencer essa batalha, pode ter certeza que nós estamos do lado certo. Do lado do bem. Nós não queremos que o Brasil mergulhe num socialismo. O caminho para mergulhar no socialismo é aquele onde o povo vai para a miséria, vai para a fome e vai para o tudo ou nada. Nós não trilharemos esse caminho”, disse Bolsonaro.
Ele só esqueceu de dizer que é exatamente um país socialista, a China, que está ajudando o Brasil a vacinar sua população com a CoronaVac, produzida, aliás, pelo Instituto Butantan, de São Paulo, em parceria com a empresa chinesa Sinovac, imunizante que responde atualmente por mais de 80% de todas as vacinas já aplicadas no Brasil.
Assista ao vídeo