Movimentos sociais de toda a América Latina lançaram nesta segunda-feira (29) uma campanha internacional em que reivindicam “democracia, justiça e reparações” da Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (Minustah).
Em carta enviada aos secretários-gerais da ONU e da OEA, António Guterres e Luis Almagro, aos governos dos seus países membros, ao povo do Haiti e suas organizações, as entidades alertam que o país “atravesse uma crise muito profunda”, cujo elemento central “é a luta contra a ditadura imposta pelo ex-presidente Jovenel Moise”.
“Desde o ano passado este senhor, logo após decretar o fechamento do Parlamento, governa mediante decretos, violando de maneira permanente a Constituição do país, se recusando a abandonar o poder, apesar de seu mandato ter vencido no dia 7 de fevereiro passado”, esclarece o documento.
Diante dos reiterados atropelos, as principais instâncias jurídicas do país, como o Conselho Superior do Poder Judiciário (CSPJ) emitiram inúmeros pronunciamentos contra as medidas do governo, da mesma forma que a Federação que reúne as Associações de Advogados Haitianos, as Federações Religiosas e as entidades representativas da sociedade civil. Neste momento, os funcionários do Judiciário estão em greve, o que mantém o país mergulhado em profunda crise.
MASSACRES E PRISÕES ARBITRÁRIAS
“Ao mesmo tempo, esta crise institucional se enquadra dentro de uma insegurança que afeta a praticamente todos os setores da sociedade haitiana. Uma insegurança que se expressa através de selvagens repressões das mobilizações populares por parte da Polícia Nacional Haitiana (PHN), domesticada pelo Executivo, ataques a jornalistas, diversos massacres em bairros populares, assassinatos e detenções arbitrárias de opositores”, assinala o manifesto.
Conforme as entidades, houve a prisão de um juiz da Corte de Cassação sob o pretexto de fomentar um suposto complô contra a segurança do Estado e para assassinato, a revogação ilegal e arbitrária de três juízes desta Corte, “criação de centenas de grupos armados que semeiam o terror sobre todo o território nacional e que respondem ao poder, transformando o sequestro de pessoas em negócio bastante próspero para esses criminosos”.
Segundo os movimentos sociais, os 13 anos de ocupação militar pelas tropas da ONU através da MINUSTAH, “assim como as operações de prolongação de uma situação de tutela” tem agravado a crise haitiana, “apoiando os setores retrógrados, antidemocráticos e mafiosos”. Além disso, esclarecem, “cometeram graves crimes contra a população haitiana e seus direitos fundamentais (como a introdução do cólera) que merecem processos exemplares de justiça e reparação”.
30 MIL MORTOS DE CÓLERA
“O povo do Haiti pagou caro a intervenção da Minustah: 30 mil mortos pela cólera levada pelos soldados, milhares de mulheres estupradas, que agora têm filhos órfãos de pais vivos, os soldados que regressaram aos seus países. Nada mudou positivamente em 13 anos, mais desigualdade social, mais pobreza, mais dificuldades para o povo e ausência de democracia”, acrescentam as entidades e movimentos. E ressaltam que “as condições de vida dos setores populares se agravaram de maneira dramática como consequência de mais de 30 anos de políticas neoliberais impostas pelas instituições financeiras internacionais”.
“Somente o povo haitiano pode decidir sobre seu futuro, e nessa caminhada conta com nossa solidariedade e disposição”, enfatiza o documento, reiterando a solidariedade para que possam “eleger um governo popular de transição e uma Constituinte de forma democrática”.
Assinam a carta “Por um Haiti livre e soberano” a Federação Democrática Internacional de Mulheres (FDIM), a Via Camponesa. as Mães da Praça de Maio da Argentina, entre dezenas de outras entidades de todo o continente.