Em nota divulgada no dia 1º de abril, as centrais sindicais CTB, Força Sindical e CSB denunciam a manipulação dos dados de emprego que o ministro da Economia, Paulo Guedes, vem utilizando para inflar a criação de novos empregos com carteira assinada no país. Os números “destoam do elevado índice de desemprego, que ultrapassa os 14%, apontado pelo IBGE”, está no documento.
Na nota, João Carlos Juruna, secretário geral da Força Sindical; Wagner Gomes, secretário geral da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), e Álvaro Egea, secretário geral da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB) citam dados apontados pela imprensa, que mostram a mentira do anúncio feito pelo ministro, “que chegou a dizer que se trata de um recorde” de empregos no país, sem explicar, no entanto, que “a mudança de método na coleta dos dados que ocorreu em 2020, alterou os resultados com relação à série”.
“O novo Caged tornou obrigatório (antes era opcional) informar a admissão e demissão de empregados temporários, modalidade criada pela reforma trabalhista”, afirmam os sindicalistas.
“Pouco dias após anúncio do governo, o IBGE informou que o desemprego se manteve no mesmo patamar de 14%, sendo o maior desde 2012, início da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua). A conta não fecha”, afirmam.
Segundo as centrais, “a manobra do governo em divulgar um dado apurado segundo uma metodologia nova, que parece criada para esconder o desastre social que foi a reforma trabalhista, em comparação com dados apurados com a metodologia antiga, é uma forma de manipulação de resultados”.
“O anúncio do ministro da economia, que induz à conclusão de que o país criou um número recorde de empregos, relativiza as reivindicações pela geração de emprego, pela qualidade dos empregos e pelo auxílio emergencial em tempos de pandemia”. Para as centrais, “esse tipo de manipulação é uma artimanha típica de governos autoritários”.
“Não se sabe ainda qual o estrago e o alcance que terão os dados distorcidos apresentados pelo Ministério da Economia. Mas, conhecendo o perfil autoritário e simpático à ditadura militar do mandatário, esta distorção não parece casual”, afirma o documento, que enumera ainda os cortes de recursos federais no IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas, ameaças de punição no Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), caso pesquisadores divulguem estudos sem autorização, e a “asfixia do movimento sindical, que tem a legitimidade para averiguar as condições de trabalho, para promover a organização entre os trabalhadores para reivindicar direitos e melhorias e para lutar pela geração de empregos decentes”.
Leia abaixo a íntegra da nota:
Manipular resultados é artimanha de governos autoritários
Por João Carlos Juruna, Wagner Gomes e Alvaro Egea*
Em coletiva virtual de divulgação do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) o ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciou que o Brasil criou 401.639 empregos com carteira assinada em fevereiro.
Ele chegou a dizer que se trata de um recorde. Mas não disse que a mudança de método na coleta dos dados que ocorreu em 2020, alterou os resultados com relação à série. O novo Caged tornou obrigatório (antes era opcional) informar a admissão e demissão de empregados temporários, modalidade criada pela reforma trabalhista.
Segundo matéria do UOL (Governo comemora recordes de emprego com carteira, mas comparação é errada, de 29/3/2021), desde 2020 o levantamento passou a usar dados mais abrangentes, incluindo trabalhadores temporários. A matéria informou ainda que “Embora a mudança de metodologia seja informada nas notas técnicas do Ministério da Economia, ela é omitida em publicações oficiais e em discursos do alto escalão —levando a crer que há recordes e que são fruto apenas de medidas tomadas pelo atual governo”.
Os dados informados por Guedes destoam do elevado índice de desemprego, que ultrapassa os 14%, apontado pelo IBGE. Pouco dias após anúncio do governo, o IBGE informou que o desemprego se manteve no mesmo patamar de 14%, sendo o maior desde 2012, início da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua). A conta não fecha.
A precisão dos dados e a credibilidade na metodologia impactam diretamente em políticas públicas e em pautas que orientam o movimento social. A manobra do governo em divulgar um dado apurado segundo uma metodologia nova, que parece criada para esconder o desastre social que foi a reforma trabalhista, em comparação com dados apurados com a metodologia antiga, é uma forma de manipulação de resultados. O anúncio do ministro da economia, que induz à conclusão de que o país criou um número recorde de empregos, relativiza as reivindicações pela geração de emprego, pela qualidade dos empregos e pelo auxílio emergencial em tempos de pandemia.
Esse tipo de manipulação é uma artimanha típica de governos autoritários. Por exemplo, no início da década de 1950, embora já com Getúlio Vargas de volta ao poder, o Brasil, recém saído do governo repressor de Eurico Gaspar Dutra e dos oito anos do Estado Novo, viveu uma onda de greves e manifestações que, entre outras coisas, protestavam contra a falsificação de índices oficiais, como a greve dos bancários de 1951 e a Greve Geral contra a carestia, de 1953. Os dados oficiais não expressavam a realidade de desemprego e pobreza que assolava os brasileiros no período. E a pressão dos trabalhadores resultou em duas grandes conquistas.
A primeira delas foi o aumento do salário mínimo em 100%, articulado pelo então ministro do trabalho, João Goulart, e assinado por Vargas no Dia 1º de maio de 1954.
E a segunda foi a criação do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) no dia 22 de dezembro de 1955 pelo movimento sindical para suprir a necessidade de uma instituição confiável de dados econômicos.
Outro exemplo é a manipulação dos índices da inflação de 1973 denunciada pelo Dieese em 1977. Naquele ano a equipe técnica do Departamento, dirigida pelo economista Walter Barelli, havia descoberto uma expressiva defasagem: a inflação de 1973 foi de 23,5%, e não de 15,4%, como anunciou na época, o ministro da Fazenda Delfim Netto. Por conta própria o Dieese refez os cálculos salariais verificando as perdas que os trabalhadores sofreram no período. A denúncia foi o estopim para a deflagração das greves de 1978.
Não se sabe ainda qual o estrago e o alcance que terão os dados distorcidos apresentados pelo Ministério da Economia. Mas, conhecendo o perfil autoritário e simpático à ditadura militar do mandatário, esta distorção não parece casual. Ela se soma ao corte de recursos federais para o Censo de 2021, contra o qual a presidente do IBGE, Susana Cordeiro Guerra, e o diretor de Pesquisas, Eduardo Rios-Neto, publicaram carta aberta junto com oito ex-presidentes do Instituto. Soma-se à notícia sobre um incomum comunicado interno que circulou no Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) que afirmava que “pesquisadores que divulgarem estudos sem autorização poderão ser punidos”. Segundo informou o jornal Folha de São Paulo, o procedimento já era adotado, e os técnicos estranharam o comunicado do Instituto, que é vinculado ao Ministério da Economia.
Soma-se à extinção do Ministério do Trabalho e, principalmente, à asfixia do movimento sindical, que tem a legitimidade para averiguar as condições de trabalho, para promover a organização entre os trabalhadores para reivindicar direitos e melhorias e para lutar pela geração de empregos decentes.
* João Carlos Juruna é secretário geral da Força Sindical; Wagner Gomes é secretário geral da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB); Álvaro Egea é secretário geral da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB)