“Mais uma vez, instamos os EUA a retirar imediatamente o mandado de prisão e o pedido formal de extradição para Meng Wanzhou”, afirmou o porta-voz da chancelaria chinesa”, Geng Shuang, após rechaçar as acusações da Justiça dos EUA contra a gigante das telecomunicações e líder do desenvolvimento das redes 5G. “Os EUA têm usado seu poder nacional para caluniar e pressionar empresas chinesas específicas, numa tentativa de estrangular suas operações legítimas, o que revela suas fortes intenções políticas e manipulações profundas”, denunciou. As acusações de Washington se referem a supostos atos ocorridos há mais de dez anos.
O porta-voz instou os EUA a cessarem “o fustigamento pouco razoável” contra a Huawei. Na segunda-feira (28), o Departamento de Justiça norte-americano acusou a Huawei e sua diretora financeira Meng de fraudes bancárias para violar sanções contra o Irã, roubo de segredos comerciais e obstrução da justiça, num total de 23 imputações. Geng voltou a dizer que “EUA e Canadá abusaram de seu acordo bilateral de extradição” contra Meng, que foi retirada de um voo de conexão no dia 1º de dezembro e agora está em prisão domiciliar em Vancouver.
Maior empresa do mundo em equipamentos para telecomunicações, a Huawei recentemente suplantou a Apple, se tornando a número dois global nos smartphones, e vem liderando a corrida pelas redes de altíssima velocidade 5G, das quais dependem a indústria 4.0 (digitalização dos processos produtivos) e a chamada ‘internet das coisas’. Também tem surpreendido no desenvolvimento de semicondutores de última geração, imprescindíveis para a 5G, Inteligência Artificial e Realidade Virtual. No ano passado, a Huawei vendeu 153 milhões de smartphones. A receita do grupo esperada para este ano é de US$ 102 bilhões.
Artigo do New York Times abriu o jogo sobre o que está em questão por trás da chicana contra a Huawei: “no ano passado, os EUA embarcaram furtivamente em uma campanha global” para impedir que Huawei e e outras empresas chinesas participem “da mais dramática reformulação” dos sistemas que controlam a internet, desde que surgiu há 35 anos.
Ainda conforme o NYT, na concepção do governo Trump “o mundo está engajado em uma nova corrida armamentista – que envolve tecnologia, em vez de armamento convencional” e com as armas mais poderosas, exceto as nucleares, controladas por computador, qualquer que seja o país que domine o 5G, ganhará uma vantagem econômica, de inteligência e militar durante grande parte deste século”.
Conclui o artigo: em entrevistas com altos funcionários do governo e da CIA, assim como com altos executivos de telecomunicações, “está claro que o potencial da 5G criou um cálculo de soma zero na Casa Branca de Trump – uma convicção de que deve haver um único vencedor nesta corrida armamentista, e o perdedor deve ser banido”.
A recente demissão do embaixador do Canadá na China, John Callun, após ele ter revelado que a peça acusatória do governo Trump conta a Huawei tem pés de barro, é expressão desse confronto. Em Toronto, ele afirmou que Meng “tem argumentos muito bons do lado dela”. “Um, é o envolvimento político de comentários de Donald Trump sobre o caso dela. Dois, há a extraterritorialidade aplicada ao caso dela. Três, há a questão de sanções ao Irã, e o Canadá não é signatário das sanções ao Irã”. Três dias depois estava sumariamente demitido.
Pelo tratado de extradição, ela não poderia ser entregue a Washington por alguma coisa que não seja crime pela lei canadense. O que fica cristalino com as declarações de Callun e deixando os juízes canadenses que deferirão, ou não, o pedido de extradição, sob holofotes intensos.
A acusação de ‘roubo de um robô’ é o requentamento de um caso, decidido por tribunal de Seattle, em que a Huawei pagou US$ 4,8 milhões a uma empresa dos EUA pelo que foi considerado quebra de contrato e não roubo industrial. Aliás, a começar pelas gigantes da tecnologia, todos os dias elas duelam nos tribunais do mundo inteiro, sobre abuso de patentes, uso não autorizado, cópia e por aí vai, o que faz a imputação de Washington particularmente cínica.
Também, até aqui Washington não apresentou qualquer prova, por mínima que fosse, de que os produtos chineses conteriam portas dos fundos para ciberataques – e, quanto aos EUA, é público e notório desde Edward Snowden, que são eles que grampeiam o mundo inteiro. A nova investida contra a Huawei e o avanço chinês na alta tecnologia ocorre apenas dois dias antes de Washington e Pequim iniciarem uma nova rodada de negociações tentando deter a guerra comercial entre as duas maiores economias do planeta.
Quanto a Ottawa, palco do confronto no momento, há a sábia conclamação do porta-voz Geng: “Que o Canadá leve a sério a solene posição da China, liberte imediatamente Meng e assegure seus legítimos direitos, e pare de arriscar seus próprios interesses em benefício dos EUA”.