O cineasta baiano Geraldo Sarno morreu na noite de terça-feira, aos 83 anos. Ele estava internado no Rio de Janeiro, há um mês em decorrência de complicações da Covid-19. Geraldo tinha tomado as 3 doses da vacina e preparava um retorno para sua cidade natal, Poções, no sul da Bahia.
Filho de imigrantes italianos, ficou conhecido por abordar o movimento migratório nordestino, as religiões e a cultura popular em sua obra. Era amigo de Glauber Rocha desde a infância, com quem fazia projeções de cinema em casa.
Sarno já era formado em Direito, mas em 1964 estudou cinema em Cuba, para onde foi por indicação da pela União Nacional dos Estudantes (UNE) devido à sua participação no Centro Popular de Cultura, o CPC.
Em 2008, ganhou o prêmio de melhor direção no Festival de Brasília com o filme “Tudo isto me parece um sonho”. A trama conta a história do general pernambucano Ignácio Abreu e Lima, que participou de batalhas que resultaram na libertação da Colômbia, Venezuela e Peru da Coroa Espanhola ao lado de Simon Bolívar no século 19.
Durante a divulgação de “Sertânia” em 2020, Sarno explicou porque sempre abordou temas como sertão, cangaço e a migração.
“Eu abordo o cangaço porque é um universo próximo do meu conhecimento, da minha sensibilidade. Isso vale não apenas para o cangaço, mas para o sertão. Como trabalhei durante muitos anos fazendo documentários sobre o sertão, e pelo fato de ter nascido no sertão da Bahia, tenho uma compreensão do homem sertanejo. Tenho uma visão, um conhecimento e uma familiaridade. Além disso, estudei muito este universo, incluindo o cangaço”, disse.
Geraldo Sarno faria 84 anos no próximo dia 6 de março. “Faço isso desde Viramundo, desde sempre, tendo o sertão como centro. O sertão é o meu centro”.
CINEMATOGRAFIA
Viramundo, primeiro filme de Geraldo, foi filmado em São Paulo e faz parte da história do cinema brasileiro. Ele está disponibilizado na íntegra no site do diretor. Viramundo foi pioneiro ao trazer a nova imagem da classe operária brasileira, a do camponês de origem nordestina corrido da seca e da fome, e do surgimento de um sistema religioso neopentecostal, hoje hegemônico no Brasil.
O filme tem imagens preciosas da cidade em 1964 e foi lançado semanas antes do Golpe que instaurou a Ditadura no Brasil.
Também como um marco, em 1977, lançou o filme “Coronel Delmiro Gouveia”, uma cinebiografia sobre um dos pioneiros da industrialização do país, que foi perseguido por se recusar a vender sua indústria têxtil às empresas inglesas na virada do século 19 para o século 20.
O personagem, interpretado por Rubens de Falco, é mostrado como um industrial ousado e humanista que enfrenta o poder dos coronéis e dos trustes internacionais.
O filme compreende uma fonte privilegiada para a reflexão sobre as representações em torno dos rumos da industrialização não apenas no âmbito regional. Era a história do homem que não vendeu o povo brasileiro.
Coronel Delmiro Gouveia venceu os prêmios de Melhor Roteiro e Melhor Trilha Sonora no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em 1978, e o Grande Prêmio Coral no Festival Internacional do Novo Cinema Latino-americano, em 1979, em Havana, Cuba.
O acervo de Geraldo Sarno pode ser visualizado no portal Linguagem do Cinema, que disponibiliza filmes, séries e programas de TV dirigidos por Sarno e de documentação reunida pelo cineasta ao longo de sua trajetória.