Mario Benedetti
a trini
Defender a alegria como uma trincheira
defendê-la do escândalo e da rotina
da miséria e dos infames
das ausências transitórias
e definitivas
defender a alegria como a um princípio
defendê-la do pasmo e dos pesadelos
dos neutros e dos nêutrons
das doces infâmias
e dos graves diagnósticos
defender a alegria como uma bandeira
defendê-la do raio e da melancolia
dos ingênuos e dos canalhas
da retórica e da parada cardíaca
das endemias e academias
defender a alegria como um destino
defendê-la do fogo e dos bombeiros
dos suicidas e homicidas
das férias e do cansaço
da obrigação de estar alegre
defender a alegria como uma certeza
defendê-la da oxidação e da sarna
da famosa pátina do tempo
da frescura e do oportunismo
dos proxenetas do riso
defender a alegria como um direito
defendê-la de deus e do inverno
das maiúsculas e da morte
dos sobrenomes e das lástimas
do azar
e também da alegria
Tradução Sidnei Schneider
M. Benedetti (Uruguai, 1920-2009), Cotidianas, 1979.