Congressistas do “Centrão” já discutem nomes que podem substituir Araújo. Grupo de deputados prefere um nome “técnico”, de um diplomata de carreira, para não impor duas derrotas a Bolsonaro
Acossado por aliados no Congresso Nacional, Bolsonaro está à procura de novo ministro das Relações Exteriores. O chanceler Ernesto Araújo já está identificado por líderes partidários no Legislativo federal e, pior, pelos presidentes das duas casas legislativas, Arthur Lira (PP-AL), Câmara, e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), Senado, como alguém que atrapalha, ao invés de ajudar, na construção de solução dos problemas relacionados ao combate à pandemia.
Em audiência pública no Senado, nesta quarta-feira (24), pelo menos cinco senadores fizeram menções explícitas à troca de comando no Itamaraty na sessão em que o próprio chancelar participou.
Assim, o chamado núcleo ideológico do governo vai se desmilinguindo. Na audiência, Araújo arrumou confusão com os senadores. E, pior, não os convenceu que o ministério, sob sua liderança, tem sido eficaz em encontrar soluções para superar o caos causado pela ausência de vacinação contra a pandemia.
Nesta quinta-feira (25), o ainda chanceler visitou pela manhã, na residência oficial o presidente da Câmara, Arthur Lira. Foi conversar e levou documentos das ações do ministério no sentido de convencer Lira, que está buscando caminhos em outros países para conseguir as vacinas, que eram para terem sido compradas no ano passado. Da mesma forma, não convenceu o presidente da Câmara.
RESISTÊNCIA DE BOLSONARO
Na percepção dos congressistas, depois de trocar o ministro da Saúde (saiu o general Eduardo Pazuello e entrou o médico Marcelo Queiroga), Bolsonaro agora precisa fazer ajuste no comando das Relações Exteriores, pois as posições brasileiras estariam prejudicando o País na tentativa de trazer vacinas para combater a Covid-19, entre outros vários problemas.
Bolsonaro foi consultado por ministros sobre essa troca e teria rechaçado a possibilidade. “Não me peçam para trocar o Ernesto”, teria respondido o presidente. Havia no Palácio do Planalto a sugestão para que o almirante Rocha, hoje titular da SAE (Secretaria de Assuntos Estratégicos) e interino na Secom (Secretaria Especial de Comunicação) da Presidência, fosse deslocado para o Itamaraty. Isso também poderia abrir espaço para acomodação do general Eduardo Pazuello na SAE. Mas o presidente foi contra a ideia e, pelo menos por ora, está descartada. Mas o chanceler segue descartado, ou como diria no linguajar político estadunidense — é um “pato manco”.
Araújo é um dos últimos representantes no governo em cargo relevante da corrente mais fiel ao pensamento defendido pelo astrólogo Olavo de Carvalho, que se pode dizer, é o ideólogo dessa ala do bolsonarismo. Esse grupo é contra o que chama de globalismo.
Já circula na imprensa, que Araújo não conta com apoio nem dentro do governo — apenas a ala ideológica, como o assessor Filipe Martins (aquele do gesto neonazista e supremacista branco em audiência no Senado) e o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho 03 do presidente, gostariam de sua permanência no cargo.
SITUAÇÃO INSUSTENTÁVEL E SAÍDAS
A jornalista Andréia Sadi, em seu blog no portal G1, escreve que a “situação de Ernesto está insustentável e atrapalha as negociações com outros países a respeito [da aquisição] das vacinas e dos insumos.”
Diante desse cenário, ainda segundo a jornalista, o “governo busca nomes para a vaga do chanceler — e o presidente já está ciente de que a troca de Ernesto é prioridade para os parlamentares e para a boa relação com o Congresso.”
O impasse agora, ainda segundo a jornalista, não é mais se Ernesto fica ou sai. O impasse, no Congresso, é se o substituto do chanceler vai ser um nome buscado dentre os quadros técnicos do mundo diplomático ou se esse nome vai ser encontrado dentre os congressistas, isto é, dentre os chamados “políticos”.
COLLOR, ANASTASIA OU UM TÉCNICO
Dentre os nomes cotados por senadores e integrantes do Planalto, por enquanto, estão os do ex-presidente da República e atual senador Fernando Collor (PRB-AL) e do também senador Antonio Anastasia (PSD-MG). Essa troca não deverá ser rápida. O chanceler é um dos preferidos de Bolsonaro. Bolsonaro costuma demorar a resolver esses problemas. E a demora faz com que o defenestrado sofra mais até definitivamente caminhar até o patíbulo.
Na Câmara, a seu turno, há um grupo que defende que o nome seja o de um diplomata, técnico, por acreditar que a chamada ala ideológica do governo não aceitará a dupla derrota: a saída de Araújo e entrada de um político no cargo.
De toda forma, a saída de Araújo é vista no Planalto como a senha para que as relações do Congresso com o presidente sigam sem tumultos, ou seja, sem as chamadas “medidas amargas e fatais”, como comissões parlamentares de inquérito e impeachment, anunciados pelo presidente da Câmara, em pronunciamento nesta quarta-feira, em plenário.
M. V.