Na última quinta-feira (30), o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, encontrou entidades do movimento social, estudantil e negro em São Paulo. O ministro dialogou sobre a pauta do acesso à justiça e segurança pública e recebeu um manifesto de estudantes pedindo paz e segurança nas escolas.
A carta foi entregue por representantes da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), União Paulista dos Estudantes Secundaristas e da União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São Paulo (UMES-SP). O documento foi escrito após a ocorrência do ataque contra a escola estadual Thomazia de Medeiros, realizado por um aluno de 13 anos, que matou uma professora e deixou outras cinco pessoas feridas.
O ministro Flávio Dino salientou o protagonismo juvenil presente no ato. “Acho que é fundamental para a gente celebrar a esperança, não só no futuro, mas no presente. A juventude protagonista é tudo de bom que o Brasil tem”, disse. Pontos como fortalecimento da segurança pública e eixos do Pronasci também foram debatidos.
“O presidente Lula lançou a nova fase do Pronasci e esse programa é o que me trouxe aqui. Para ouvir as entidades e ver como, através dos cinco eixos, podemos estar bem próximos dos territórios mais invisibilizados e vulneráveis. É um programa realmente voltado a essa concepção de que segurança pública não é só polícia, segurança pública é algo muito maior que envolve, sobretudo justiça social”, frisou o ministro.
O presidente da União Municipal dos Estudantes Secundaristas (Umes) Lucca Gidra, em sua fala, afirmou que é inadmissível que os estudantes não se sintam seguros em suas escolas.
“Eu queria fazer coro com que foi falado por aqui, pois o que aconteceu aqui em São Paulo na segunda-feira (30) é inadmissível, porque infelizmente o que está acontecendo com as escolas aqui do nosso país, as escolas da nossa cidade é que elas tão refletindo, não o que há melhor na sociedade, mas o que há de pior na sociedade, ela tem refletido o ódio, elas tem refletindo a violência, elas tão refletindo assédio sexual, elas tão refletindo o racismo, elas tão refletindo ambientes onde que os estudantes, onde que os professores não se sentem seguros e a gente precisa que as pessoas se sintam seguras dentro da escola, porque muitas vezes a juventude não está segura na rua, agora a escola é inadmissível que o jovem chegue lá e não se sinta seguro, é inadmissível que um professor chegue lá e não se sinta seguro’, disse.
Lucca afirmou que as ações do governo de Tarcísio de Freitas para lidar com o problema vão contra a própria ideia da escola de ser um ambiente inclusivo e acolhedor. “Precisamos urgentemente que as escolas sejam ambientes de escuta e de acolhimento e não um ambiente hostil como é que o governo do estado tem planejado, onde a primeira reação, a primeira brecha que surge, eles já querem colocar a polícia na escola. Isso é inadmissível”, continuou.
“A gente quer uma escola segura para todos, queremos uma educação pública, gratuita e de qualidade e isso se passa por um pensamento crítico, se passa por uma educação universal e a gente conseguir aprender e viver em sociedade e usar a potência da juventude nesse momento para chegarmos a escola que queremos”, afirmou Lucca.
A presidenta da União Paulista de Estudantes Secundaristas (Upes), Luísa Martins, em seu discurso, demonstrou preocupação com a segurança das escolas de São Paulo.
“O que a gente quer é acompanhamento psicológico, assistentes sociais e principalmente que a gente consiga tornar a escola um espaço cada vez mais acolhedor”, disse a jovem sobre o que almeja para o futuro dos educandários.
PAZ NAS ESCOLAS
O manifesto ocorre por conta do atentado que ocorreu na última segunda, quatro professoras e um aluno foram esfaqueados dentro da Escola Estadual Thomazia Montoro, na Vila Sônia, Zona Oeste da capital paulista, na hora da chamada. Uma das professoras, Elisabete Tenreiro, de 71 anos, teve uma parada cardíaca e morreu no Hospital Universitário da USP.
O agressor, um aluno de 13 anos do oitavo ano na escola, foi desarmado por professoras, apreendido por policiais e levado para o 34° DP, onde o caso foi registrado.
Inicialmente, a polícia havia informado que dois alunos tinham sido atingidos. Um deles, porém, foi socorrido em estado de choque, mas sem ferimentos. A outra criança ferida sofreu um corte no braço e foi levada a um hospital da região. Segundo a mãe de outro aluno, ele tentou salvar uma das professoras e ficou ferido superficialmente.
“Nossas escolas precisam ser um lugar de paz e acolhimento, de celebração das diversidades e promoção do respeito. Essa onda de violência escolar que vimos na última semana não pode ser tolerada”, disse Jade Beatriz, presidenta da Ubes.
“Nós, da Ubes, lançamos um manifesto pela Paz Nas Escolas. Pedimos a atenção total do poder público para o combate das ameaças violentas e para a promoção do espaço saudável que devem ser as escolas”, continuou.
Veja o manifesto na íntegra:
Paz nas Escolas!
No mundo todo presenciamos a ascensão do discurso de ódio, do racismo, da lgbtfobia, misoginia, xenofobia e intolerância.
Esse pensamento tem sido ampliado em fóruns supremacistas na internet e alcançado crianças e adolescentes. Infelizmente, estamos vendo o reflexo dessas redes criminosas do mundo virtual chegarem aos corredores e salas das nossas instituições de ensino em todo o Brasil.
Acreditamos na Escola que tenha paz, que seja um espaço de prática do verbo “esperançar”, propagado por Paulo Freire: um espaço de amplificação do respeito, da segurança e um abrigo para nossa pluralidade e construção de sonhos.
Queremos Paz nas Escolas, em memória das vítimas: para que nunca esqueça e nunca mais aconteça!
O direito à educação não pode limitar-se à visão positivista da aplicação de conteúdos e nem a escola apenas a um local de encontro.
Acreditamos e lutamos por uma Escola que esteja a serviço do povo e do nosso país, sendo um espaço de valorização das nossas potências e de segurança, que permita a identificação da violação dos nossos direitos. Queremos uma Educação emancipadora e antifascista para emancipar nossa juventude.
É urgente a necessidade de acompanhar o crescente adoecimento mental dos estudantes, assim como todos os fatores que implicam em condutas prejudiciais à comunidade escolar. É preciso vencer as armadilhas projetadas.
A escola deve ser um espaço de acolhimento e de entendimento das diferenças, e por meio de um acompanhamento poderá livrar-se da crescente violência e dos discursos de ódio.
A falta de uma rede de apoio psicológico e social nas escolas, junto a ausência e responsabilidade do Estado em ouvir denúncias e demandas urgentes que ocorrem dentro dos muros de instituições por todo Brasil, desencadeou uma desenfreada onda de perpetuação e reprodução de violência por estudantes que já haviam sido expostos à ela.
Vimos isso com o recente atentado na E.E Thomazia Montoro, em São Paulo, onde a equipe pedagógica já havia denunciado o comportamento do estudante e infelizmente só houve uma resposta quando a tragédia que todos vimos, aconteceu.
Essa não é a Escola que queremos e sonhamos! O futuro dos nossos jovens não pode ser roubado pela constante e frustrada busca por respostas, “Quem sou? O que quero? Como vou fazer?”.
O espaço escolar precisa fomentar o desejo do esporte, da arte e cultura, fatores fundamentais para o desenvolvimento integral e bem-estar dos estudantes, além de ajudar a combater as chamadas “doenças do século”, como ansiedade e depressão.
Deve ser um ambiente de inspiração, criatividade e de identificação. É possível se sentir pertencente e acolhido dentro dos muros que serão a base inicial para nos encorajar a alavancar voos maiores. Sendo assim, defendemos urgentemente a criação de circuitos de arte, cultura e esporte.
Queremos o cumprimento da Lei 13.935/19 que garante o acompanhamento do serviço social e psicológico nas escolas. Defendemos também a revogação do Novo Ensino Médio e do esfacelado itinerário do Projeto de Vida, é fundamental que esse seja (re) construído a partir da nossa realidade enquanto estudantes, filhos e filhas da classe trabalhadora. Não nos cabe uma escola que não nos permite ser quem somos.
A rede de ódio e fake news propagada na internet não pode ser o fator mobilizador dos jovens que estão em vulnerabilidade sócio-emocional, queremos a consolidação da Coordenadoria de Direitos Digitais e da Diretoria de Crimes Cibernéticos da Polícia Federal. Não nos contentamos com o mínimo, queremos o máximo de atenção, investigação e combate aos “chans” e grupos supremacistas que se organizam na internet. E assim, que os problemas digitais não respinguem nas nossas escolas e no nosso futuro.
Não podemos cair na armadilha do discurso que a regulamentação do ensino domiciliar, o “homeschooling”, a expansão das Escolas Cívico-Militares, o aumento da presença da polícia militar ou a redução da maioridade penal seja a solução para os problemas sensíveis dos estudantes e das nossas escolas.
É papel do Estado dar suporte, acompanhamento e respostas às inúmeras demandas que encontramos em nossas escolas e isso só acontecerá com a liberdade e a execução de uma escola pública, gratuita e com qualidade.
A Escola não há de ser um espaço de controle e opressão sobre nossos corpos e nossas ideias, mas sim de emancipação da nossa individualidade e do nosso povo, plural e diverso.
É inquestionável que o racismo e a discriminação estrutural existente em nossa sociedade se reflete nas escolas. A presença da população negra e indígena, assim como da população LGBTQIA+, tanto não é estimada, quanto é alvo de injúrias e preconceito.
O nosso gênero, a nossa cor e a nossa classe social não pode mais influenciar a nossa história acadêmica e assim entrar em um efeito dominó na nossa vida. A escola deve servir para fortalecer os valores da tolerância, do respeito e da justiça social. Esse trabalho deve ser feito justamente na formação de pessoas que respeitem as diversidades.
Mais uma vez, nós, estudantes brasileiros, nos solidarizamos com os amigos e familiares das vítimas dos ataques às escolas brasileiras e reafirmamos o nosso repúdio aos atos de ódio e violência.
Queremos uma educação antifascista, em que caiba todos os sonhos, que seja de qualidade e que tenha uma rede de profissionais qualificados para acompanhar a saúde mental dos estudantes.
Os ataques precisam cessar: QUEREMOS SEGURANÇA E PAZ NAS ESCOLAS!