A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) publicou na terça-feira (21) um estudo que reforça a importância de vacinar as crianças de 5 a 11 anos contra a Covid-19, como estratégia para ampliar a cobertura vacinal no país.
Indo na contramão do que tem defendido Bolsonaro, a pesquisa mostra que sem a inclusão das crianças na campanha, só seria possível proteger, na melhor das hipóteses, 85% da população brasileira.
De acordo com o pesquisador Raphael Guimarães, integrante do Observatório Covid-19 e um dos autores do estudo da Fiocruz, seria praticamente impossível atingir o percentual mínimo necessário para o relaxamento seguro das medidas de contenção da pandemia.
“Se olharmos para o Brasil como um todo, 15% da nossa população é composta por pessoas de zero a 11 anos. De forma que, mesmo que se consiga vacinar todas as pessoas com 12 anos ou mais, só seria possível chegar a 85% da população total imunizada. É um patamar ruim se for pensar que no mínimo aceitável para fazer qualquer forma de flexibilização mais contundente”, afirma o pesquisador.
“A ideia é essa, a gente só vai conseguir alcançar uma cobertura vacinal ótima para população brasileira se a gente incluir as crianças, só dessa forma que a gente vai ter para população total uma cobertura vacinal que seja suficiente pra bloquear a circulação do vírus”, explicou Raphael Guimarães.
Os responsáveis pelo trabalho salientaram, ainda, que há eficácia comprovada das vacinas em crianças de 5 a 11 anos e que estudos de segurança indicam que é possível sua utilização.
“Temos estudos publicados falando sobre a eficácia das vacinas nas crianças. O imunizante passou por adaptações justamente para imunizá-las sem oferecer risco. Não tem por que as pessoas terem medo ou receio de aplicar as vacinas. Agora precisamos imunizar as crianças mais do que nunca”, diz.
Segundo o pesquisador, a combinação da introdução da variante Ômicron com o período das férias escolares faz deste o momento ideal para início da vacinação infantil.
A vacinação para esse público foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) na última quinta-feira (16), com o imunizante da Pfizer. No dia seguinte, a Câmara Técnica de Assessoramento em Imunizações da Covid-19 (CTAI Covid-19), do Ministério da Saúde, também aprovou a medida, por unanimidade.
Mesmo com as aprovações, contudo, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, tem defendido que a pasta faça uma análise minuciosa para decidir se aprova ou não a imunização deste público. Em declarações recentes, o presidente Jair Bolsonaro (PL) defendeu que a medida ocorra com a assinatura de um termo de compromisso por parte dos pais ou responsáveis.
A Fiocruz ainda destacou que observa, desde setembro, uma tendência de estagnação da imunização no país, o que aponta para uma necessidade de ampliar a faixa etária vacinal, para ampliar a cobertura. Segundo a fundação, é preciso reforçar a vacinação nas regiões que até o momento a adesão a vacina foi mais baixa.
No Norte, os números estão bem abaixo dos apresentados no Sul e no Sudeste. O Amapá, com 36,7% da população com duas doses, tem a menor cobertura. O índice representa menos da metade do indicador de São Paulo (74,8%), onde está a maior proporção de população vacinada.
Para a Fiocruz, é necessária uma intervenção mais ativa por parte dos estados e principalmente dos municípios.
Rafael Guimarães explica que “é preciso garantir a criação de postos volantes para que seja possível acessar os lugares onde a população não consegue ir. Mas ao criar essa estratégia é preciso garantir que ela se repita para aplicação da segunda dose também”, diz o pesquisador. “O SUS tem experiência com isso, pois assim fazemos desde a publicação da política nacional de atenção básica, em 2011, com relação às equipes fluviais, principalmente no Norte, onde utilizamos barcos para acessar a população ribeirinha de lugares mais remotos do país”, completa.
Ainda de acordo com o estudo, o risco para locais onde há baixa cobertura vacinal, não é só da disseminação mais veloz da Ômicron, mas também, esses lugares, podem se tornar berço do surgimento de novas variantes e, eventualmente, alguma que seja resistente à vacina.
“A cada vez que o vírus consegue se adaptar bem ao ambiente e criar alguma forma de mutação, o que faz surgir essas novas variantes, estamos sob risco de encontrar uma variante que tenha maior resistência à vacina e seja mais agressiva ao corpo humano.
CoronaVac aguarda aprovação da Anvisa
A imunização de crianças brasileiras pode avançar também por meio do imunizante produzido pelo Instituto Butantan, a CoronaVac, que já é utilizado em diversos países neste público. Como é o caso da China, onde milhões de crianças estão sendo vacinadas.
Entretanto, a Anvisa ainda cria barreiras contra o imunizante desenvolvido pelo laboratório Sinovac. Ontem, após uma reunião com entidades da sociedade civil, a agência solicitou novos dados do Instituto Butantan sobre a CoronaVac.
Nesta quarta-feira (22) o Butantan afirmou que foi “mais uma vez surpreendido” sobre a decisão da agência. Segundo o instituto, na semana passada “foram enviados dois dossiês com cinco novos estudos, além de dados de farmacovigilância e de segurança vindos da Sinovac, biofarmecêutica chinesa produtora da CoronaVac, e do governo chileno”, para que a Anvisa pudesse estudar o novo pedido de liberação da vacina para essa faixa etária.
O Butantan também diz que enviou, separadamente, outro dossiê com análise dos dados de imunogenicidade das amostras coletadas dos participantes da fase 3, conforme acordado com técnicos da própria Anvisa.
“Especialistas do Butantan participaram de reunião como órgão sanitário brasileiro, além de especialistas das principais sociedades médicas pediátricas do Brasil, para tirar as dúvidas dos estudos e ratificar a estratégia de que a CoronaVac é a vacina mais recomendada para a faixa etária de 3 a 17 anos. Entretanto, o órgão regulatório não fez questionamentos durante a reunião. É preciso que haja mais clareza na comunicação”, disse o instituto através de nota.