Nove ex-ministros do Meio Ambiente se reuniram com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), na quarta-feira, para apelar pelas pautas em defesa da preservação ambiental. Essa iniciativa foi motivada pela repercussão internacional do aumento das queimadas na Amazônia.
Os ex-ministros Marina Silva, Carlos Minc, Edson Duarte, Gustavo Krause, Izabella Teixeira, José Carlos Carvalho, José Goldemberg, José Sarney Filho e Rubens Ricupero. Os ex-titulares da pasta ocuparam o posto nos últimos seis governos, desde o do ex-presidente Fernando Collor de Mello.
Também participaram do encontro o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ildeu de Castro Moreira e Felipe Santa Cruz, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
O grupo entregou uma carta aos presidentes da Câmara Rodrigo Maia e também do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), em que pedem a suspensão da tramitação de propostas que possam ter impacto na preservação ambiental e denunciam o “desmonte” de instituições do setor no governo de Jair Bolsonaro.
Na carta entregue a Maia, o grupo afirma que tomaram a iniciativa “movidos pelo senso de responsabilidade que esta grave situação impõe” e para “evitar as graves consequências ambientais, sociais, econômicas, políticas e diplomáticas que poderão advir da continuidade desta situação”.
Eles afirmam ainda haver um desmonte das instituições federais, sendo elas, o Ministério do Meio Ambiente, Ibama e ICMBio, como também das políticas e programas de proteção ao meio ambiente e do Fundo Amazônia.
O ex-ministro Rubens Ricupero, que ocupou a pasta no governo Itamar Franco, afirmou que o trabalho de mais de 40 anos em defesa do meio ambiente está ameaçado por ações inconsequentes por parte do governo.
“Um discurso agressivo, gratuito, irresponsável que causará um dano irreparável não apenas ao meio ambiente, mas até mesmo ao setor produtivo exportador do Brasil que fique hoje com uma pecha mundial como uma espécie de pária de inimigo do meio ambiente”, disse Ricupero.
A ex-ministra do governo Lula, Marina Silva, defendeu que o País recupere a governança ambiental brasileira. Para ela, é preciso recuperar e fortalecer os órgãos de fiscalização e controle, de gestão ambiental e de monitoramento.
“Estão todos enfraquecidos. Que se faça a recomposição do orçamento do Ministério Meio Ambiente, que se restabeleçam as políticas de combate ao desmatamento, que já viam dando certo desde 2004 e que foram abandonadas e, em função disso, temos uma situação de descontrole”, argumentou.
Marina Silva reforçou que o objetivo da ação dos ex-ministros do Meio Ambiente é mostrar que não há conivência com as queimadas e com o desmatamento ilegal e, também, defender o direito dos povos indígenas, do meio ambiente, dos interesses econômicos e diplomáticos.
Ainda, no documento, eles pedem a suspensão imediata da tramitação de matérias legislativas que possam agravar a situação ambiental do país e a realização de audiências públicas com especialistas sobre o tema.
Essa carta vem em um momento em que o governo Bolsonaro sofre intensa pressão internacional por causa do significativo aumento dos incêndios florestais na Amazônia.
Veja na íntegra o documento:
Exmo Sr. RODRIGO MAIA
Presidente da Câmara dos Deputados,
Exmo Sr. DAVI ALCOLUMBRE
Presidente do Senado Federal,
O Brasil vive uma emergência ambiental. O desmatamento da Amazônia, que atingiu 7.536 km2 entre agosto de 2017 a julho de 2018, está em crescimento acelerado conforme demonstram as projeções do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, corroboradas por diversas instituições de pesquisa nacionais e internacionais. Os focos de incêndio até agosto aumentaram 83% em todo o país e 140% na Amazônia, principalmente devido aos retrocessos na política socioambiental brasileira e da campanha ostensiva de representantes do Poder Executivo federal em favor de um modelo de desenvolvimento totalmente ultrapassado para a Amazônia e demais biomas do país.
Nesse sentido, vimos, na qualidade de ex-ministros do Meio Ambiente, personalidades públicas e entidades nacionais representativas de diversos segmentos da sociedade, movidos pelo senso de responsabilidade que esta grave situação impõe a todos os democratas de nosso país, e também na busca por evitar as graves consequências ambientais, sociais, econômicas, políticas e diplomáticas que poderão advir da continuidade desta situação, propor aos senhores, representantes maiores do Poder Legislativo brasileiro, a adoção das seguintes medidas em caráter emergencial:
- 1. Suspensão imediata da tramitação de todas as matérias legislativas que possam, de forma direta ou indireta, agravar a situação ambiental no país;
- 2. Moratória ambiental para projetos de leis e outras iniciativas legislativas que ameacem a Amazônia, povos indígenas e biodiversidade.
- 3. Realização de audiências públicas em comissão especial do Congresso Nacional, com a participação de especialistas em proteção do meio ambiente, representantes das comunidades locais, do agronegócio e de agentes públicos federais e estaduais para tratar dos temas fundamentais da agenda socioambiental do país.
Neste momento, senhores Presidentes, consideramos necessário à realização de pelo menos três audiências públicas para tratar dos seguintes temas que nos parecem fundamentais:
- 1. Riscos e oportunidades socioambientais à proteção da Amazônia e dos demais biomas brasileiros decorrentes das matérias legislativas em tramitação;
- 2. Novos marcos legislativos necessários ao aperfeiçoamento das ações voltadas à proteção e ao desenvolvimento sustentável da Amazônia e dos demais biomas brasileiros;
- 3. Recomendações para a elaboração de um plano emergencial de ações para o enfrentamento da crise ambiental em curso, com a redução imediata do desmatamento e queimadas e proteção das populações tradicionais.
Solicitamos, senhores Presidentes, que essas medidas sejam tomadas em caráter de urgência. Para tanto, nos colocamos à disposição do Congresso Nacional para contribuir em todas as fases desse processo, seja indicando especialistas, participando das discussões ou de outras formas que os senhores considerarem adequadas.
O desmonte das instituições federais (Ministério do Meio Ambiente, IBAMA e ICMBio), como também das políticas e programas de proteção ao meio ambiente e do Fundo Amazônia que vem sendo promovido pelo governo federal, além de provocar inaceitável degradação do patrimônio natural e da qualidade ambiental do país, está colocando em risco a segurança de populações indígenas e comunidades tradicionais e afetando diretamente a saúde pública, fato tão bem evidenciado com a chuva negra que caiu sobre São Paulo recentemente. A comoção mundial é de tal ordem que ameaças de boicote às exportações brasileiras surgem em diversos países, pondo em risco a própria balança comercial do País.
Esses fatos, senhores Presidentes, exigem de nossas instituições respostas à altura. O Parlamento brasileiro tem o dever histórico de atuar como moderador e oferecer um canal de diálogo com a sociedade, única forma de reverter essa assustadora realidade.
Esta é a hora de nos unirmos pelo bem do Brasil. Urge mostrar ao mundo que nossa nação e nossas instituições são capazes de oferecer perspectivas reais para a solução dos gravíssimos problemas que enfrentamos e zelar pelo respeito aos compromissos firmados no âmbito do Acordo de Paris e na Convenção da Diversidade Biológica.
Aguardamos a convocação para que, sob a liderança de V. Exas. possamos ajudar a recolocar o Brasil no lugar de nação amiga das grandes causas do século 21: a proteção do meio ambiente e das comunidades menos favorecidas e o combate às mudanças climáticas e à exclusão social.
Respeitosamente,
Ex-Ministros do Meio Ambiente:
José Goldemberg
Rubens Ricupero
Gustavo Krause
Izabella Teixeira
José Sarney Filho
José Carlos Carvalho
Marina Silva
Carlos Minc
Edson Duarte
Felipe Santa Cruz – Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Ildeu de Castro Moreira – Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).