“Os comandantes são todos muito discretos. Não se envolvem com política. É uma gente séria”, apontou o general
O general Carlos Alberto dos Santos Cruz, um dos militares mais respeitados pelas tropas brasileiras, afirmou nesta segunda-feira (29), em entrevista à revista Piauí, que o governo tem de dar explicações à população sobre a mudança no Ministério da Defesa. Na tarde desta segunda, o general Fernando Azevedo e Silva foi afastado do cargo. “A partir do momento que não se tem tranquilidade, não se tem paz social, não se tem liderança e se vive em um ambiente de notícias falsas fica muito difícil traçar um diagnóstico do que representa a saída do ministro Fernando Azevedo e Silva”, afirmou Santos Cruz.
Questionado sobre a possibilidade de golpe, o general respondeu que “não há clima para um golpe de Estado”. “As Forças Armadas têm uma postura institucional muito forte. Não embarcam nessa onda. As Forças Armadas têm estruturas fortes de comando, de liderança, de hierarquia, de respeito à legalidade”, afirmou. “As Forças Armadas e seus comandantes têm consistência grande. Não se imagine que se possa lançar as Forças Armadas em uma aventura. Os militares não ficam embarcando em qualquer canoa. Não é fácil mexer com as Forças Armadas politicamente. Os comandantes são todos muito discretos. Não se envolvem com política. É uma gente séria.”
Ele disse ter sido pego de surpresa com a saída do general Azevedo. Por isso, para frear a especulação em torno do fato, considera fundamental o governo se manifestar imediatamente sobre o ocorrido. “O público tem o direito de saber o que está acontecendo. Os militares estão acostumados com mudanças. Mas esta é uma mudança política. Toda esta especulação em torno da saída do Fernando está se dando porque falta liderança ao país e vivemos neste ambiente de notícias falsas”, tornou a repetir. “Há dois anos o país está vivendo num ambiente muito confuso.”
Jair Bolsonaro vinha reclamando que as Forças Armadas deveriam dar demonstrações públicas de que apoiavam o seu governo, coisa que o ministro se recusou a fazer. Outro mal-estar entre eles ocorreu após a pressão de Bolsonaro sobre para que o ministro demitisse o comandante do Exército, general Edson Pujol, o que Azevedo e Silva também não acatou. Por isso, chamou a atenção o teor da carta de demissão de Azevedo e Silva, ao afirmar: “Nesse período, preservei as Forças Armadas como instituições de Estado.” A afirmação do ministro deixou implícito a tentativa de Bolsonaro influir sobre os militares para que agissem contra as reações da sociedade ao seu governo.
Santos Cruz ficou pouco tempo no governo. Ele foi demitido pelo presidente em junho de 2019, após se desentender com a milícia de Bolsonaro, comandada pelos filhos do presidente e pelo astrólogo Olavo de Carvalho. Assim como o ministro Azevedo e Silva, ele também se recusou a se sujeitar ao extremo radicalismo de Bolsonaro e seus seguidores mais fanáticos.
“Eu não estou preocupado porque quando as coisas são confusas elas vão acabar sendo resolvidas, porque não se pode viver na confusão permanente”, disse. Qual seria esta solução? “Temos eleição ano que vem. Além disso, temos outros mecanismos normais. O Congresso pode reagir a essa mudança do ministro.”
Ao final da entrevista, a revista quis saber se a saída do Congresso poderia ser o impeachment do presidente, ao que o general se limitou a dizer que o impedimento está previsto em lei, evitando afirmar que esta seria uma saída. E concluiu, dizendo: “Tempos difíceis.”