Presidente do STF acolheu em parte recursos da defesa de diretora da Precisa e da CPI sobre alcance do direito de não se autoincriminar. Em depoimento, ela se negou a responder perguntas que não lhe autoincriminavam
O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luiz Fux, afirmou nesta terça-feira (13) que cabe à CPI da Covid-19 no Senado avaliar se depoente abusa do direito de permanecer em silêncio ao se recusar a responder perguntas para não produzir provas contra si.
Segundo o ministro, é competência da comissão decidir quais providências vai adotar diante dessa conduta se julgar irregular.
Assim, na prática, pelo entendimento do presidente do STF, cabe ao presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), avaliar se deve determinar prisão ou pedir abertura de investigação aos órgãos competentes.
O presidente do STF lembrou que a decisão em relação à Emanuela Medrades é baseada em entendimentos anteriores da própria Corte. Ele afirmou ainda que nenhum direito fundamental é absoluto e que as CPI têm poderes judiciais e a responsabilidade de analisar se houve algum abuso.
A diretora técnica da Precisa Medicamentos, Emanuela Medrades, compareceu, nesta terça-feira, à CPI protegida por habeas corpus que lhe deu o direito de ficar calada. Dessa forma, ela se recusou a responder perguntas feitas pelos senadores. Ela abriu mão até dos minutos iniciais que são concedidos pela comissão para que os convidados e convocados se apresentem.
A CPI foi instalada no Senado, em 27 de abril, com propósito de investigar as ações, omissões e inações do governo federal, sob a condução do presidente Jair Bolsonaro na gestão da pandemia do novo coronavírus, que até o momento levou a vida de 534.745 mil brasileiras e brasileiros.
DECISÃO DE FUX
“Às Comissões Parlamentares de Inquérito, como autoridades investidas de poderes judiciais, recai o poder-dever de analisar, à luz de cada caso concreto, a ocorrência de alegado abuso do exercício do direito de não-incriminação. Se assim entender configurada a hipótese, dispõe a CPI de autoridade para a adoção fundamentada das providências legais cabíveis”, escreveu Fux na decisão.
O ministro afirmou ainda que não cabe ao Supremo fazer o controle prévio de atos da comissão.
“Não compete ao Supremo Tribunal Federal se imiscuir no conteúdo do depoimento da Paciente, muito menos supervisionar previamente o exercício das atribuições jurisdicionais exclusivas da Comissão Parlamentar de Inquérito. Outrossim, compete à CPI fazer cumprir os regramentos legais e regimentais, estabelecendo, para tanto, as balizas necessárias para que investigados, vítimas e testemunhas possam exercer, nos limites próprios, seus direitos fundamentais, inclusive o direito da não autoincriminação”, acrescentou à decisão.
AVALIAÇÃO DO DEPOENTE E SUA DEFESA
Fux ressaltou, no entanto, que cabe ao depoente e à defesa avaliarem se pergunta feita por parlamentar atinge ou não direito de não se autoincriminar.
A determinação de Fux consta na decisão que acolheu, em parte, recursos da defesa de Emanuela Medrades, diretora técnica da Precisa Medicamentos, e da CPI da Covid-19, que questionavam o alcance do direito dela de não produzir provas contra si.
O caso da diretora voltou ao STF logo após a CPI da Covid-19 suspender a reunião no começo da tarde desta terça-feira (13), após as negativas de Emanuela Medrades em responder às perguntas feitas pelos senadores — inclusive a que questionava qual era a atribuição dela na Precisa Medicamentos.
FATOS SOBRE OS QUAIS É TESTEMUNHA
O contrato para a compra da vacina Covaxin foi firmado entre o Ministério da Saúde e a empresa, que atuou como intermediária entre o governo e o laboratório indiano que produz a vacina. Em razão de suspeitas de irregularidades, a CPI decidiu investigar o caso.
Medrades foi orientada pelos advogados a não responder às perguntas, sob argumento de que habeas corpus concedido pelo presidente do STF permitia o direito de permanecer em silêncio em relação a todas as questões que fossem indagadas pelo colegiado.
Ao conceder o direito ao silêncio, na segunda-feira (12), em relação a temas sobre os quais Emanuela Medrades é investigada, Fux deixou claro que a diretora da empresa deveria comparecer diante dos senadores e que ela tem o dever de dizer a verdade quanto a fatos sobre os quais é testemunha.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO
Após a suspensão dos trabalhos da comissão, a defesa de Medrades e a própria CPI, por meio de advogados do Senado, acionaram o Supremo na busca por esclarecimentos em relação à decisão do presidente da Corte, Luiz Fux, sobre o alcance do direito de a diretora técnica da Precisa Medicamentos a não produzir provas contra si.
Ao STF, os advogados pediram que ficasse explícito na decisão do STF que a análise sobre qual ou quais perguntas responder deve ser exercida pela diretora e a defesa dela, na medida em que entenda que tal ou qual fato em que esteja ela envolvida.
A CPI da Covid-19 acionou a Corte, por meio de advogados do Senado, pedindo que o presidente Luiz Fux deixe claro, na decisão dele, quais são as consequências jurídicas para Medrades se ela se recusar a depor sobre todo e qualquer fato. O recurso do colegiado segue na linha do que foi feito em ofício, mais cedo, pelo presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM)
DEMANDA DA CPI NO STF
“Considerando que a paciente se recusa a depor sobre todo e qualquer fato, requer o peticionante, em sede de embargos de declaração, que essa Exma. Presidência se digne de incluir na r. decisão as consequências de tal recusa em relação aos fatos que não a incriminem, uma vez que foi indeferido o pedido de não comparecimento e imposta a obrigação de depor à paciente quanto aos fatos, em tese, criminosos de que tenha conhecimento”, está escrito na petição do Senado.
A convocação de Emanuela Medrades foi aprovada a partir de requerimento dos senadores Otto Alencar (PSD-BA) e Alessandro Vieira (Cidadania-SE).
Para os senadores, ela é uma das responsáveis pela negociação, perante o Ministério da Saúde, do processo de importação da vacina Covaxin. A CPI também já autorizou a quebra dos sigilos telefônico e telemático (e-mail e mensagens) de Emanuela Medrades.
SUSPEITAS
Os advogados da diretora alegaram que ela já está sendo investigada e, inclusive, prestou depoimento na segunda-feira (12) à Polícia Federal.
A CPI aprovou nesta terça-feira (13) requerimento para que a PF compartilhe o depoimento com os senadores.
A Precisa entrou no radar da CPI por ter intermediado a negociação de doses da vacina indiana Covaxin entre o Ministério da Saúde e a farmacêutica Bharat Biotech.
O contrato, de R$ 1,6 bilhão, para compra de 20 milhões de doses está sob investigação da Polícia Federal. Duas testemunhas do Ministério da Saúde ouvidas pela CPI relataram que Emanuela esteve diretamente envolvida nas negociações e relataram troca de mensagens para tratar de detalhes do contrato.
M. V.