A rede de atenção a pacientes com HIV no Brasil alertou que alguns dos principais remédios para o tratamento da doença estão com estoques baixos. Profissionais de saúde, pacientes e grupos de apoio também se preocupam com cortes na verba do Programa Nacional HIV e Aids. O governo Bolsonaro orienta os pacientes a racionarem o uso dos medicamentos.
No caso, a Lamivudina é um dos remédios que tratam o vírus é considerado menos tóxico para o corpo dos pacientes, sendo este o remédio que estava com o estoque baixo. No início do mês, o Governo Federal orientou autoridades estaduais e municipais de Saúde a fornecer a Lamivudina 150 miligramas por um período de 30 dias, até a normalização dos estoques federais.
Segundo o Ministério da Saúde, a partir de setembro do ano passado, notou-se um crescimento rápido do uso de novos esquemas de tratamento com o medicamento, acima do que foi previsto.
Antes da baixa nos estoques, os pacientes recebiam a medicação para até 90 dias de tratamento, segundo especialistas. O racionamento vem na hora em que o Programa Nacional de HIV e Aids sofre um corte milionário.
No próximo ano, o Ministério da Saúde vai ter R$ 407 milhões a menos para prevenir, controlar e tratar o HIV e outras infecções sexualmente transmissíveis. O corte está no orçamento do governo federal para 2023.
Para o ativista na luta pelos direitos das pessoas que vivem com HIV, o profissional de saúde Walter Sabino alerta para a falta de medicamentos em postos de saúde. “Eles não tinham o quantitativo no estoque e eu preciso voltar, por enquanto, a cada 30 dias. Até que eles consigam regularizar esse estoque”, contou.
Segundo o próprio Ministério da Saúde, cerca de 700 mil pessoas tratam o HIV no Brasil. De acordo com a professor da Faculdade de Medicina da USP Esper Kallás, que trata pacientes há 30 anos, essa mudança no orçamento pode ser uma ameaça.
“A falta de alguns desses remédios pode colocar em risco, principalmente, a vida das pessoas. Pode colocar o sofrimento que a doença que a gente testemunhou, a gente que tem mais tempo de prática no passado. Voltar a esse fantasma não é o que a gente quer. O tratamento é, hoje, cada vez mais acessível, barato e com menos efeitos colaterais”, disse.
O Grupo Pela Vidda, pioneiro no acolhimento a pessoas com o vírus no país, teme que os pacientes parem de tomar a medicação.
“Há uma sinalização para a comunidade: que há uma baixa de estoque de medicamento de primeira linha de tratamento e, com isso, criar um pânico e as pessoas ficarem com uma preocupação a mais. O que é o êxito no tratamento? É a adesão. E, nestes casos, provoca justamente o contrário: a falta de adesão”, disse o coordenador do grupo, Marcio Villard.
CONTRA OS CORTES NA SAÚDE
Rodrigo Pinheiro, presidente do Fórum das Ong/aids do estado de São Paulo (Foaesp), denuncia o corte do governo Bolsonaro de R$ 407 milhões na verba destinada às políticas de enfrentamento contra o HIV/aids. Ele destaca que é preciso lutar para barrar os cortes dos medicamentos para o tratamento do HIV.
“Os cortes prejudicam ações de prevenção, tratamento e distribuição de medicamentos. Recentemente, o Fórum das Ong/aids do estado de São Paulo (Foaesp), que completa 25 anos neste mês, questionou o Ministério da Saúde sobre o motivo da falta do medicamento lamivudina 150 mg. O questionamento é se a falta se dá por um problema por parte laboratório fabricante, ou se é questão orçamentária. Também indagamos sobre se há prazo para normalização da situação”, destaca.
“Devemos lembrar que o governo infringe a lei, já que o acesso gratuito a medicamentos antirretrovirais é garantido por lei desde 1996 (Lei 9313/96). Os medicamentos antirretrovirais proporcionam mais qualidade de vida às pessoas que vivem com HIV/aids (PVHA) e a adesão ao tratamento faz com que a carga viral fique indetectável. Com a carga viral indetectável, as PVHA não transmitem o vírus, daí o conceito I=I (Indetectável=Intransmissível)”.
Ele destaca que, “além dos problemas na distribuição de medicamentos, os cortes afetam ações de prevenção. Hoje, importantes ações com respostas significativas como a Profilaxia Pós-Exposição (PEP) e a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP), ficarão comprometidas. O país registrou, em 2020, mais de 10 mil mortes pela doença, dados do Boletim Epidemiológico em HIV/aids do MS”.
“Os cortes afetam também a compra de insumos, outras ações, e também o pagamento para recursos humanos do Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis do MS”, ressalta.
“No próximo dia 21, sexta-feira, o Foaesp, a AHF Brasil, o Movimento Paulistano de Luta Contra a Aids (Mopaids), a Agência de Notícias da Aids (Agência Aids) e o Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas (MNCP) realizam manifestação contra os cortes orçamentários promovidos pelo governo federal no Ministério da Saúde que afetam as políticas de enfrentamento ao HIV/aids no país. O ato público, com a participação de ONGs e representantes do movimento social, acontece às 10 horas nas escadarias do Teatro Municipal, no centro de São Paulo”, convoca.