O garimpeiro Rodrigo Martins de Mello, bolsonarista candidato a deputado federal por Roraima, declarou à Justiça Eleitoral ter R$ 4,5 milhões em espécie.
Mello, conhecido como Rodrigo “Cataratas”, é filiado ao PL, partido de Jair Bolsonaro, e lidera um movimento pró-garimpo em Roraima.
Dono de empresas de táxi aéreo, o candidato é investigado pela Polícia Federal sob suspeita de participar de esquema de exploração ilegal na Terra Índígena Yanomami.
À Justiça Eleitoral neste ano, o investigado declarou um total de R$ 33,5 milhões em bens. Em 2012, quando concorreu para vereador, Mello afirmou ter R$ 1,3 milhão em patrimônio.
Ao Globo, ele disse que usa os recursos em suas atividades comerciais. “Tenho esse capital de giro disponível por possuir uma PLG, que é a permissão de lavra garimpeira em nome de pessoa física, em que grande parte da operação é feita com movimento de recurso em espécie”, justificou.
A prática de manter dinheiro em espécie em casa ou na sede de uma empresa, por exemplo, não é considerada crime, segundo a legislação.
No entanto, com um sistema bancário sofisticado e acessível, – e em tempos de Pix é, no mínimo, arriscado.
Além do perigo de roubo, o dinheiro também pode ser corroído pela inflação, que diga-se, não anda baixa nos últimos meses.
Mas em tempos de bolsonarismo, virou moda para um “seleto” grupo fazer pagamentos em dinheiro vivo.
Assim, como os filhos do presidente que não usam o sistema bancário para fazer transações financeiras, os aliados, pelo visto, também parecem desconhecer os bancos.
Vale ressaltar que no caso do patrimônio dos candidatos, o TSE não verifica a veracidade das declarações enviadas.
Porém, os dados informados à Justiça Eleitoral, podem eventualmente, servir de base para investigações posteriores pelo Ministério Público, já que os documentos são públicos.
CRIMINOSO
Defensor do garimpo, Rodrigo Cataratas costuma usar suas redes sociais para questionar ações do Ministério Público Federal e Ibama contra as operações de fiscalização de terras indígenas.
Ele foi alvo de três processos por crime de organização criminosa e exploração ilegal de ouro no Território Yanomami, em Roraima.
Em 2019, nove aeronaves registradas em nome das empresas do investigado foram apreendidas durante a Operação Frankenstein da Polícia Federal em Goiânia e Anapólis (GO).
A operação visava coibir diversos crimes e irregularidades em oficinas de manutenção de aeronaves, onde são montados os helicópteros utilizados pelo garimpo.
A suspeita era de comercialização de partes e peças de aeronaves sem origem comprovada ou importadas ilegalmente.
Os bens foram devolvidos por decisão da desembargadora Maria do Carmo Cardoso, do Tribunal Regional da 1ª Região (TRF-1), em dezembro passado.
CATARATAS
O apelido “Cataratas” é em referência ao nome de uma de suas empresas do suspeito. Ele é líder do Movimento Garimpo Legal (MGL) no Estado. Além de empresas de aviação, Rodrigo Cataratas é dono de direitos minerários em áreas espalhadas pela região amazônica.
Em maio, ele liderou protestos contra uma delegação do Senado que foi a Roraima apurar denúncias de violência de garimpeiros contra indígenas da etnia yanomami.
Em meio à violência contra indígenas relacionadas ao garimpo ilegal que avança pela região amazônica, um movimento de filiação partidária acontece.
Indivíduos ligados ao garimpo e à mineração na região se filiaram a partidos políticos, para disputar cargos eletivos nas eleições deste ano.
Além de Catarata, outro pré-candidato a deputado federal ligado ao garimpo é José Altino Machado, diretor da Associação dos Mineradores do Alto Tapajós (Amot).
Machado é conhecido na garimpagem como uma das suas principais lideranças e um dos pioneiros na instalação de garimpos na área em que hoje existe a Terra Indígena Yanomami, entre os anos 1970 e 1980.
RELAÇÕES
Altino, como é conhecido, já fez várias incursões a Brasília. Em 2019 e 2021 ele manteve encontros com o vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos) e com seus assessores. Mourão preside o Conselho Nacional da Amazônia Legal (CNAL).
Se eleito, o garimpeiro disse que vai defender as atividades econômicas existentes na região, entre elas, o garimpo.
“Vamos defender o garimpeiro. É a maior atividade econômica da Amazônia em número de pessoas”, promete.
“Não tem nenhuma outra com a qual ela possa ser comparada. Atrás do garimpeiro, vem o comerciante, tem toda uma economia por trás. Por último, chega o fazendeiro que cria a cidade”, defende o candidato.
José Altino Machado também é filiado ao PL de Jair Bolsonaro e é um dos representantes dos garimpeiros do rio Tapajós, no Pará.
A ação do garimpo teve um avanço expressivo nessa região, especialmente em terras indígenas como a Munduruku e Kayapó.
Outro representante do garimpo no Pará, o candidato Gilson Fernandes preside a Federação Brasileira da Mineração (Febram), que reúne, segundo ele, pequenos mineradores, especialmente, da Amazônia.
Fernandes, também filiado ao PL, explica que, enquanto Altino Machado e Rodrigo “Cataratas” atuam no ramo do ouro, a entidade que ele presidente representa mineradores que atuam na exploração de outros minerais como cobre e manganês.
Uma das suas bandeiras de campanha é a defesa dos interesses do grupo. Ele promete que se eleito, vai atuar contra a destruição de maquinário localizado em operações contra a mineração ilegal.
“Essa destruição de maquinário é um crime. A Constituição diz que ninguém pode ser privado do seu patrimônio sem um processo transitado em julgado”, critica.
“O agente do Ibama ou da PF, ao mesmo tempo em que ele faz papel da polícia, faz o papel do juiz. O cara tem o equipamento destruído sem direito a defesa”, completa o minerador.
Atualmente, a destruição de equipamentos em operações contra crimes ambientais é respaldada por um decreto presidencial de 2008.
Segundo a norma, os agentes podem destruir equipamentos para evitar que eles sejam usados em novos crimes ambientais ou se o transporte deles para outros locais não for possível.
BANCADA DO CRIME
Para o secretário-executivo da organização não-governamental Observatório do Clima, Márcio Astrini, as candidaturas de representantes do garimpo na Amazônia é resultado do avanço da atividade na região.
“Os garimpos prosperaram durante os anos do governo Bolsonaro. É uma tendência que eles se organizem”, avalia.
“Se antes havia conflito e eles tinham medo do estado ou da polícia, agora eles se sentem amparados para quererem ser representantes dessa atividade ilegal no Congresso”, completa Astrini.
O ambientalista observa que essas candidaturas se diferenciam tanto na pauta quanto nas condições financeiras em relação às chapas montadas por lideranças indígenas na Amazônia.
“[…] Enquanto os indígenas querem aumentar a proteção ao meio ambiente, os líderes garimpeiros querem abrir as terras indígenas para a mineração e diminuir a fiscalização”.
“Além disso, os garimpeiros têm muito mais recursos financeiros para bancar essas campanhas”, conclui Astrini.
JOSI SOUSA