Ronaldo Roth, Juiz da 1ª Auditoria Militar, responsável pela absolvição dos dois policiais militares acusados de estuprar uma jovem dentro da viatura em 2019 na Praia Grande, é amigo próximo do advogado de um dos réus.
Ele é amigo do advogado José Miguel, que defendeu um dos policiais militares acusados (e absolvidos por Roth) de estupro. Em 2019, uma jovem, então com 19 anos, procurou os agentes depois de uma tentativa de assalto. Ela disse que foi estuprada dentro da viatura após aceitar uma carona até a rodoviária, em Praia Grande,
De acordo com uma denúncia enviada ao Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP), juiz e advogado possuem uma relação íntima de amizade, o que, segundo advogados da seção de Ética da OAB e especialistas em direito militar, pode acarretar em suspeição do juiz no processo.
As informações foram divulgadas pelo portal G1 que publicou fotos onde os dois aparecem abraçados em redes sociais durante encontros em restaurantes. Nas imagens, publicadas ao longo de anos, mostram encontros em cafeterias, escritórios e até durante um desfile de escola de samba, no carnaval de 2017, na quadra da agremiação Vila Maria. Em muitas das publicações, José Miguel se refere ao juiz como “amigo”.
As postagens datam de, pelo menos, 2017 até este ano. Em uma delas, a legenda escrita pelo advogado diz: “Hoje não falamos de direito. Colocando o papo em dia com o mestre Ronaldo Roth”.
Eles também trabalham na Escola de Direito Militar (EPD) de São Paulo. O juiz Roth é coordenador do curso de pós-graduação em Direito Militar, enquanto o advogado José Miguel é um dos professores do mesmo curso.
Foi Roth quem decidiu pela absolvição dos policiais militares com relação ao crime sexual, e entendeu que houve sexo consensual. Ainda segundo ele, a vítima “nada fez para se ver livre da situação”, e “não resistiu ao sexo”.
Sêmen foi encontrado na viatura que estava em movimento e com giroflex ligado. O celular da jovem também foi achado no carro. Ela disse que foi obrigada a fazer sexo vaginal e oral. Apesar de José Miguel defender apenas um dos PMs, ambos foram absolvidos por Roth.
O Código de Processo Civil diz que o juiz tem que se declarar impedido se for amigo do advogado das partes. Já o Código de Processo Militar, apenas se for amigo de uma das partes.
O Código de Processo Civil: Art. 145 diz que “há suspeição do juiz: I – amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados”. E Código de Processo Penal Militar: Art. 38 diz que “o juiz dar-se-á por suspeito e, se o não fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes: a) se for amigo íntimo ou inimigo de qualquer delas”.
Para Júlio César Lellis, presidente da XIV Turma Disciplinar de Ética na OAB-SP. “O advogado tem que observar, dentro da profissão dele, uma série de preceitos morais e éticos que não podem ser deixados de lado”, observa. “Ele tem que proceder com lealdade e com boa-fé em todas as suas relações profissionais”.
Caso a relação íntima de amizade entre advogado e juiz seja comprovada, e haja um benefício ao longo do processo por conta desta relação, Lellis acredita que alguma sanção deverá ser imposta. “O advogado deveria saber que não deveria ferir a advocacia como um todo, por se beneficiar de pleitos administrativos que ele tenha por meio de amizades íntimas. Pode ser considerada como prática de crime infamante”, disse.
“Para preservar a imagem da advocacia como um todo perante a sociedade, ele deveria ter pedido a suspeição, quando viu que o processo tinha caído na vara do amigo”, diz Lellis, avaliando de forma geral.