Proposta partiu do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) vai se reunir com líderes da Casa para ver se concordam com a ideia de promulgar proposta ‘fatiadamente’
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), afirmou, quinta-feira (2), que a Câmara e o Senado farão “o máximo esforço” para promulgar o quanto antes as partes comuns da PEC dos Precatórios, a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 23/21, aprovadas pelas duas Casas.
Trata-se de, segundo Lira, “promulgação fatiada”, na qual a parte aprovada pelas duas Casas é publicada e entra em vigor, e a parte alterada por uma das Casas continua em análise na outra Casa, como proposta independente.
Caso isso ocorra, as partes alteradas pelo Senado ficarão para as “calendas gregas”. Isto é, não “caminharão” na Câmara dos Deputados, têm certeza os senadores.
O Senado aprovou o texto, em dois turnos, na quinta-feira (2), com várias alterações. Desse modo, o texto inteiro teria ou terá de voltar à Câmara dos Deputados para votações, novamente, em dois turnos, pois não foi esse o entendimento dos senadores.
A impressão que o presidente da Câmara passa é que quer dar um “passa moleque” no Senado Federal, que se esmerou para aprovar texto mais equilibrado que o da Câmara dos Deputados. Lira não quer promulgar as alterações feitas pelos senadores.
“Eu saio agora para uma outra reunião com o presidente Pacheco, onde vamos analisar os textos comuns. Qualquer alteração muito substancial nós não temos alternativa de trazer para o plenário. Então vamos ver o texto comum das duas casas, esse texto comum deve ser promulgado pelas duas mesas. O que sobrar do texto comum terá que ir para a CCJ, terá que ter admissibilidade, terá que ir para a Comissão Especial para voltar ao Plenário por duas votações”, declarou Lira.
“Todas as alterações que acabaram de ser votadas no Senado depois das votações dos destaques nós vamos estar tomando conhecimento com muita tranquilidade, com muita calma pela assessoria das duas casas para que possamos de uma maneira conjunta de Senado e Câmara para falar da promulgação do que for necessário e urgente”, continuou.
REAÇÃO DO SENADO
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), vai se reunir com líderes partidários na próxima segunda-feira (6) para avaliar se a PEC dos Precatórios poderá ser promulgada de forma fatiada, como defendeu o presidente da Câmara, logo depois de a proposta ser aprovada por senadores.
A fala de Lira irritou os senadores que participaram das negociações para construção de acordo para aprovar a medida, porque o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), havia dito que o presidente da Câmara estava ciente das negociações e teria assumido o compromisso de votar o texto na íntegra depois de aprovado no Senado.
Pior para os senadores que acreditaram no líder do governo e relator e aceitaram votar na PEC com as mudanças feitas.
A decisão de promulgar de forma fatiada a PEC é do presidente do Senado, mas ele disse a interlocutores que, antes, quer ouvir os líderes partidários e também senadores que participaram das negociações, como José Aníbal (PSDB-SP), Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e Alessandro Vieira (Cidadania-PB), para tomar a decisão.
Os três senadores apresentaram proposta alternativa e parte do texto dessa foi acatada pelo relator, senador Fernando Bezerra.
PROPOSTA DE ‘FATIAMENTO’ É DE LIRA
O compromisso era de que o texto integral voltaria para a Câmara dos Deputados para aprovar ainda neste ano. Todavia, na quinta-feira, Lira defendeu a promulgação dos trechos que não foram modificados pelo Senado, com o restante seguindo a tramitação normal na Câmara.
Ou seja, teria de passar, na Câmara pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e por comissão especial (mérito), o que inviabilizaria a aprovação dos pontos modificados ainda neste ano.
LIRA QUER ACOCHAMBRAR
A proposta aprovada pelo Senado, quinta-feira, segundo senadores, dificulta a promulgação fatiada, porque o texto foi redigido de forma que os deputados não tenham condições de mudar pontos alterados sem que a PEC volte ao Senado.
Ou seja, o presidente da Câmara quer “acochambrar” para manter o esquema do “orçamento secreto”, que permite ao relator do Orçamento, sob os auspícios de Lira, fazer distribuição de recursos públicos orçamentários nada republicanos.
DOIS PONTOS DA PROPOSTA APROVADA PELO SENADO
Caso prevaleça esse entendimento de promulgar a propostas fatiada, apenas dois pontos poderiam ser promulgados, o que mudou o cálculo do teto dos gastos públicos e a possibilidade de os municípios parcelarem em até 240 meses dívidas com a Previdência Social, que não foram alterados pelos senadores.
Só que os senadores defendem que até esses trechos não sejam promulgados. O receio dos senadores é que a Câmara acabe não votando pontos da PEC que, por exemplo, carimbaram todo o espaço fiscal aberto pela proposta para programas sociais, como o Auxílio Brasil, e despesas obrigatórias, para assim, evitar manipulação de recursos públicos, por meio do chamado “orçamento secreto”.
Até a promulgação fatiada seria problema para o governo. A mudança no teto dos gastos públicos abre espaço fiscal de cerca de R$ 60 bilhões, o que seria garantido imediatamente com promulgação deste trecho. Mas outros R$ 40 bilhões seriam abertos com o parcelamento de parte do pagamento de precatórios.
Como esse ponto foi alterado no Senado, não poderia ser promulgado e o governo não teria como contar com esse espaço até que seja aprovado no Congresso.
Entre líderes partidários, a avaliação é que essa disputa entre Câmara e Senado pode se transformar numa nova guerra entre as duas casas legislativas, porque o compromisso, segundo Pacheco, era que o texto não seria promulgado parcialmente.
ENTENDA O ASSUNTO
A PEC, aprovada com alterações no Senado, abre no Orçamento da União de 2022 espaço fiscal aproximado de R$ 50 bilhões para bancar R$ 400 mensais aos beneficiários do Auxílio Brasil.
O Auxílio Brasil é o novo programa de transferência de renda sucessor do Bolsa Família.
A PEC muda a fórmula de cálculo do teto de gastos imposto pela EC (Emenda à Constituição) 95, de 2016, e cria subteto para o pagamento de precatórios, as dívidas da União e dos entes federativos oriundas de sentenças judiciais definitivas, que serão pagas em parcelas.
ALTERAÇÕES
Na forma aprovada pelo Plenário do Senado, a proposta altera quatro artigos da Constituição, além do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias:
Artigos 6º e 203, que tratam, respectivamente, dos direitos sociais e da assistência social, passaram a ser modificados na versão da PEC aprovada pelos senadores. No artigo 6º foi incluído um parágrafo único garantindo a “todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social” o direito a “uma renda básica familiar, garantida pelo poder público em programa permanente de transferência de renda”. No artigo 203 foi incluída entre os objetivos da assistência social “a redução da vulnerabilidade socioeconômica de famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza”.
Embora a alteração não fosse essencial para o pagamento do Auxílio Brasil (ela não constava da versão da Câmara), a inclusão da renda básica entre os direitos constitucionais era uma antiga reivindicação de senadores do campo progressista. Na sessão de quinta-feira, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) saudou o acréscimo do dispositivo ao texto.
Artigo 100, que trata dos precatórios devidos por União, Estados, Distrito Federal e municípios. Esses dispositivos permitem diversos tipos de negociação para a redução do montante de precatórios. O credor de precatórios passa a poder, por exemplo, usá-los para abater dívidas com a União, comprar imóveis públicos, pagar outorga de serviços públicos ou adquirir participação societária em empresas públicas.
O Senado introduziu nesse artigo um parágrafo obrigando União e entes federativos a incluir no Orçamento a verba necessária ao pagamento dos precatórios apresentados até 2 de abril do exercício anterior, a fim de aumentar no futuro a previsibilidade dos gastos públicos.
Artigo 160, que trata dos repasses da União a Estados, Distrito Federal e municípios. Foi inserido na Câmara, e mantido no Senado, um parágrafo permitindo ao governo negociar com Estados, Distrito Federal e municípios uma espécie de “encontro de contas”, abatendo dos fundos de participação eventuais débitos desses entes federativos com a União.
O texto da Câmara inseria ainda dois parágrafos no artigo 167 da Constituição, que trata da responsabilidade na execução orçamentária. Esses parágrafos, retirados no Senado, criavam para os entes federativos a possibilidade de “securitizar” dívidas tributárias, ou seja, revendê-las no mercado, com desconto. O relator Fernando Bezerra reconheceu que “a medida, apesar de meritória, não encontrou consenso no Senado Federal”.
ADCT
Vários artigos do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (101, 107, 115 a 118) sofrerão alterações, caso a versão aprovada pelo Senado seja promulgada.
É introduzido um novo artigo no ADCT, o 107A. É ele que estabelece os critérios para definir o sub-teto dos precatórios. O dispositivo também explicita que o “espaço fiscal” criado será destinado ao Auxílio Brasil e à “seguridade social”, definida na Constituição (artigo 194) como “saúde, Previdência e assistência social”.
Outro artigo introduzido pelos senadores determina que o espaço fiscal criado em 2022 será destinado à “ampliação de programas sociais de combate à pobreza e à extrema pobreza” e à “saúde, Previdência e assistência social”. O objetivo era evitar que uma sobra no espaço fiscal fosse usada para outros fins, com objetivo de ganhar votos em ano eleitoral.
Com informações da Agência Senado
M. V.