Pistoleiro morto é Luiz Carlos Felipe Martins, que também recebeu medalha das mão de Flávio. Ele era sucessor de Adriano da Nóbrega na chefia da milícia
Duas notícias deste final de semana dão conta da dimensão do submundo de crimes onde foram gestados os projetos protofascistas da família Bolsonaro. A primeira, da Folha de S. Paulo deste domingo (21), aponta que os quatro filhos do capitão cloroquina estão sob alguma investigação.
LIGAÇÕES COM AS MILÍCIAS
E a segunda, da revista Veja, dá a notícia do assassinato, no sábado (20), de Luiz Carlos Felipe Martins, miliciano, pistoleiro profissional e sucessor de Adriano da Nóbrega na chefia da milícia de Rio das Pedras. Os dois foram homenageados por Flávio Bolsonaro e o segundo defendido enfaticamente por Jair Bolsonaro na tribuna da Câmara.
Martins e Adriano da Nóbrega foram comparsas no Escritório do Crime – espécie de central de assassinatos da milícia – e foram homenageados por Flávio Bolsonaro, quando este era deputado estadual. Eles receberam a Medalha Tiradentes, a mais alta honraria da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Adriano e Martins receberam a medalha de Flávio dentro da cadeia, onde se encontravam presos por assassinato.
O Ministério Público do Rio de Janeiro descobriu que a mãe e a mulher de Adriano, que foi morto numa operação policial na Bahia em fevereiro de 2020, eram funcionárias fantasmas no esquema de lavagem de dinheiro, comandado por Fabrício Queiroz, no gabinete de Flávio na Alerj.
Assim que começaram as investigações do escândalo da rachadinha, Fabrício Queiroz, ainda solto, afastou a mãe e a mulher de Adriano do gabinete. Ele se reuniu com a mãe de Adriano, Raimunda Veras Magalhães, que estava lotada no gabinete e repassava parte de seu salário para o deputado, através de Queiroz, e parte para seu filho, Adriano.
Na reunião, Queiroz orientou-a a fugir para o interior de Minas Gerais. O objetivo era que ela se escondesse das investigações do MP-RJ. Mais tarde, um pouco antes de ser preso, ele mandou sua mulher, Márcia Oliveira, e o advogado de Flávio, Luis Botto Maia, até o local onde a mãe do miliciano estava escondida com uma proposta a ser levada ao miliciano foragido. Adriano morreu antes de conhecer o conteúdo da proposta de Queiroz.
FAMÍLIA DE CRIMINOSO
A Folha mostra que, com o inquérito recém-aberto para apurar a conduta de Jair Renan, no caso suspeito de tráfico de influência, órgãos de investigação como a Polícia Federal e o Ministério Público têm agora quatro filhos de Bolsonaro no foco de apurações. Os filhos seguiram os rastros criminosos do pai, que, segundo Ciro Gomes, já dava golpes, tipo rachadinha e até em cotas de gasolina, quando era deputado federal.
Além de Renan, o vereador Carlos Bolsonaro, o deputado Eduardo Bolsonaro e o senador Flávio Bolsonaro são alvos em diferentes casos. As suspeitas incluem desvio de recursos públicos, contratação de funcionários fantasmas, compra de imóveis com pagamento em dinheiro vivo e envolvimento na organização de manifestações que pediram o fechamento de instituições como Congresso e Supremo Tribunal Federal.
Segundo a Veja, o 2º sargento da Polícia Militar do Rio de Janeiro, Luiz Carlos Felipe Martins, amigo de Flávio, foi assassinado a tiros na porta de casa na manhã deste sábado, 20, em Realengo, na Zona Oeste da cidade. Segundo testemunhas, um carro passou atirando e matou o PM – outro policial militar e uma mulher também foram atingidos pelos disparos, mas foram socorridos e encaminhados ao Hospital Estadual Albert Schweitzer, também na Zona Oeste.
A morte de Martins ocorreu após ser revelada uma série de escutas telefônicas que comprovam que ele era o gestor do espólio criminoso do ex-capitão da PM Adriano Magalhães da Nóbrega.
ESCRITÓRIO DO CRIME VIROU HOLDING
Citando reportagem do The Intercept Brasil, Veja mostra que “Adriano havia transformado o Escritório do Crime numa espécie de holding, investindo os lucros da milícia em propriedades rurais, gado, cavalos de raça, posto de gasolina, restaurantes, revenda de veículos, depósitos de bebidas, academia de ginástica, clínica veterinária, empresa de crédito, casas de material de construção, construtoras de pequeno e médio porte, além de duas empresas voltadas ao aluguel de imóveis próprios”.
Uma delas com capital social de R$ 11 milhões e endereço na Avenida das Américas, na Barra da Tijuca, no Rio. O espólio amealhado pelo ex-caveira conta com bens até em Miami, nos Estados Unidos”.
Uma venda de 85 cabeças de gado pertencentes a Adriano, feita 12 dias após a sua morte, rendeu ao grupo criminoso, segundo a reportagem, pouco mais de meio milhão de reais. Nas escutas telefônicas, Martins, tido como homem de confiança do ex-capitão da PM, é citado por supostamente não saber que o espólio de Adriano tinha 598 mil reais em dinheiro vivo.
Alguns dias após a morte de Adriano, escutas mostram Martins contando a um interlocutor que “Adriano dizia que se fodia por ser amigo do Presidente da República”, Jair Bolsonaro. De acordo com a documentação obtida pelo portal The Intercept Brasil, as escutas foram encerradas pelo Ministério Público do Rio após o episódio.
GUARNIÇÃO DO MAL
Tanto Martins quanto Adriano eram integrantes de um grupo conhecido por moradores da Zona Norte do Rio como “guarnição do mal” – todos eles foram homenageados com a Medalha Tiradentes em 2003 pelo então deputado estadual Flávio Bolsonaro no mesmo dia. Outro nome que também foi agraciado na mesma data, mas que não fazia parte da “guarnição do mal” foi o de Fabrício Queiroz, policial militar da reserva que se tornou assessor de Flávio e é apontado como o operador do esquema de corrupção conhecido como “rachadinhas” no gabinete do então deputado na Alerj.
Segundo Veja, num período de um mês após as moções, a temida “guarnição do mal”, liderada por Adriano e comparsas como Martins, aterrorizava a comunidade de Parada de Lucas, na Zona Norte do Rio. Oficialmente, o Grupamento de Ações Táticas comandado por Adriano se envolveu em torturas, extorsões e sequestros de três jovens da favela.
Em 27 de novembro daquele ano, eles foram apontados como executores de Leandro dos Santos da Silva, de 24 anos, guardador de veículos que foi morto com três tiros na porta de casa, um dia depois de formalizar uma denúncia contra o grupo na Corregedoria da PM.
GRUPO DE BANDIDOS
Adriano, Martins e o resto do grupo foram acusados pelo homicídio. O então sargento apontado como autor dos disparos foi o policial Ítalo Pereira Campos, o Ítalo Ciba (Avante), ex-vereador no Rio de Janeiro que não conseguiu se reeleger no ano passado para a Câmara do Rio.
Ao jornal O Globo, Ítalo Ciba relatou que Flávio Bolsonaro foi visitar ele e o ex-capitão Adriano na prisão. Mesmo com as prisões pelo homicídio do guardador de carros, Flávio não sustou as homenagens.
BOLSONARO DEFENDE ASSASSINO
No dia 24 de outubro de 2005, todos eles foram condenados em 1ª instância pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Três dias depois, o então deputado federal e hoje presidente da República, Jair Bolsonaro, subia no plenário da Câmara dos Deputados para defender o ex-capitão Adriano.
No discurso, Bolsonaro o descreveu como um “brilhante oficial”. O júri que condenou Adriano, Martins e o resto do grupo foi estranhamente anulado meses depois. Todos eles foram absolvidos – mesmo com todas as provas técnicas e periciais coletadas pelo Ministério Público do Rio.
Mais tarde, Adriano assumiria a chefia da milícia de Rio das Pedras e do Escritório do Crime, arapuca criminosa acusada de executar o assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes.
S. C.
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