O ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, declarou na CPI da Covid-19 nesta terça-feira (4) que Bolsonaro foi alertado da gravidade da pandemia e ele não ouviu.
Segundo o ministro, Bolsonaro ignorou os alertas e contrariou as medidas de proteção recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo Ministério da Saúde.
“Se eu alertei o presidente? Alertei, falei”, reafirmou Mandetta.
“Quer dizer, tudo o que eu podia fazer em termos de orientar, ‘não vá nesse caminho, que esse caminho é extremamente perigoso’, foi feito. Agora, ele tinha provavelmente tinha outras pessoas que diziam: olha, isso que o ministro da Saúde está falando está errado. Vá por esse caminho”. “É uma decisão dele”, assinalou Mandetta.
O ex-ministro disse que alertou o presidente sobre o risco de não seguir as orientações da OMS. “A projeção era de 180 mil mortos até 31 de dezembro [de 2020]. Tivemos 191 mil”, contou Mandetta.
Mandetta foi o primeiro ministro da Saúde do governo Bolsonaro, que ficou pouco mais de um ano e meio no cargo, saindo após não aceitar os rumos que Bolsonaro queria impor no enfrentamento da pandemia.
O ex-ministro ainda contou que era constrangedor e prejudicial à população o Ministério da Saúde orientar um caminho e o Bolsonaro mandar ir por outro.
“Havia por parte do presidente um outro olhar [sobre isolamento vertical], uma outra decisão, um outro caminho que ele decidiu, do seu convencimento, não sei se através de outros assessores, de pessoas que não estavam no Ministério da Saúde. Mas do Ministério da Saúde nunca houve nenhum assessoramento naquele sentido [isolamento vertical] de embasar aquelas medidas. Pelo contrário, era muito constrangedor para o ministro da Saúde que estava indo por um caminho e o presidente por outro”.
Mandetta ainda disse que Bolsonaro tinha um “assessoramento paralelo”.
Em resposta às perguntas do senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator da comissão, Mandetta chegou a citar o vereador do Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro (Republicanos).
De acordo com a versão do ex-ministro, os aconselhamentos de grupos paralelos eram constantes na gestão de Bolsonaro.
“Várias vezes na reunião do Ministério [da Saúde], o filho do presidente, que é vereador no Rio de Janeiro, estava sentado atrás, tomando as notas na reunião. Eles tinham constantemente reuniões com esses grupos dentro da presidência”, citou.
Sobre o uso da cloroquina, o ex-ministro relatou que estava dentro do Palácio do Planalto quando foi informado, após uma reunião, que era para subir “para o terceiro andar porque tinha lá uma reunião com vários ministros e médicos que iam propor esse negócio de cloroquina, que eu nunca tinha conhecido. Quer dizer, ele tinha esse assessoramento paralelo”.
“Nesse dia, havia sobre a mesa, por exemplo, um papel não-timbrado de um decreto presidencial para que fosse sugerido daquela reunião que se mudasse a bula da cloroquina na Anvisa, colocando na bula a indicação da cloroquina para coronavírus”, continuou.
Mandetta disse que Bolsonaro era insistente no uso da cloroquina, ou seja, o tal “tratamento precoce”, ineficaz contra o tratamento da Covid-19.
“Me lembro do presidente sempre questionar a questão ligada a cloroquina como a válvula de tratamento precoce, embora sem evidência científica, eu me lembro do presidente algumas vezes falar que ele adotaria o chamado confinamento vertical, que era também algo que a gente não recomendava”,
Mandetta relatou que conheceu pessoas que se deixaram levar pelas notícias falsas sobre o uso de remédios comprovadamente sem eficácia no tratamento da Covid. Que usaram cloroquina e ivermectina e se arrependeram pois pegaram Covid.
Bolsonaro falava aos quatro cantos contra a quarentena recomendada pelos especialistas para conter o avanço da Covid-19. E falava do “confinamento vertical”, ou seja, isolamento só dos idosos ao contrário do distanciamento geral. Ele também dizia no início que o coronavírus não chegaria no Brasil e que seria apenas uma “gripezinha”.
“Eu acho que ele tinha uma outra, provavelmente, eu não saberia lhe dizer, mas provavelmente uma outra fonte que dava para ele, aí ele teria que dizer, que dava para ele, porque do Ministério da Saúde nunca houve a recomendação de coisas que não fossem da cartilha da Organização Mundial da Saúde, dessas estruturas todas, era o que a gente tinha, não por sermos donos da verdade, não, pelo contrário, nós éramos donos da dúvida, eu torcia muito para que aquelas teorias: ‘Aah, o vírus não vai chegar no Brasil’. Agora, se eu adotasse aquela teoria e [o vírus] chegasse, teria sido uma carnificina”, enfatizou o ex-ministro.