Segundo o ministro Silvio de Almeida, a presença do garimpo no Território Yanomami tem causado a “uma deterioração das condições sociais”
O ministro dos Direitos Humanos, Sílvio Almeida, em entrevista ao UOL nesta sexta-feira (3), informou que vai a Roraima na próxima semana para apurar as denúncias de estupros praticados por garimpeiros contra meninas yanomamis. Em consequência dessa violência, ao menos 30 delas estariam grávidas, o que contribui para o agravamento da crise humanitária que se espalhou pela Terra Indígena Yanomami e que vem comovendo o Brasil e o mundo.
“Na semana que vem a minha equipe retorna a campo, vai ouvir mais autoridades, vamos até o território (Yanomami) – eu vou pela segunda vez –já estive lá com o presidente Lula, retorno agora, dessa vez, junto com o ministro da Defesa, os comandantes das Forças Armadas, mas a minha equipe já vai antes, ou seja, para fazer os relatos de campo”, explicou Almeida.
O secretário nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Ariel de Castro Alves afirmou que a comitiva do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania recebeu informações de que ao menos 30 meninas e adolescentes yanomamis estão grávidas de garimpeiros.
Segundo ele, também foi informado haver seis crianças em poder de famílias não yanomamis (com dois processos de adoção irregular em andamento).
Em entrevista à Rádio El Dorado, Castro declarou haver duas denúncias de exploração sexual infantil. “Recebemos informações de pelo menos 30 meninas e adolescentes que estariam grávidas de garimpeiros”, disse. E “temos informações também sobre acolhimentos de crianças yanomamis que seriam irregulares e até processos de adoções ilegais em curso”, completou.
As denúncias partiram do Conselho Indígena de Roraima (CIR) e os casos são acompanhados pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).
“Pedimos mais informações ao Conselho Indígena de Roraima para podermos ter os nomes das jovens e requisitarmos apurações dos possíveis estupros de vulneráveis para a Polícia Civil de Roraima, para a Polícia Federal e para o MPF (Ministério Público Federal)”, informou o secretário.
Com relação às “adoções irregulares”, segundo ele, tratam-se de seis crianças. “Duas situações já estariam em curso: processos de adoção de crianças yanomamis por famílias não yanomamis, em que, segundo as entidades Conselho Indígena de Roraima e Hutukara, estariam ocorrendo arbitrariedades e irregularidades”, afirmou. “Estamos aguardando que os advogados das entidades nos encaminhem maior detalhamento dos casos.”
De acordo com Castro, as denúncias de omissão e ações de estímulo ao garimpo ilegal por agentes públicos ligados à gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro – e o próprio presidente –serão investigadas.
“O governo federal anterior recebeu várias denúncias, mais de 20, tratando do garimpo ilegal e das violações de direitos humanos contra os povos indígenas, e não teve atitudes visando a evitar essa situação”, afirma Alves.
VIOLÊNCIA SISTEMÁTICA
Por sua vez, Almeida informou que, ao receber as denúncias, o ministério solicitou providências imediatas às autoridades. “[…] Nós requisitamos, tanto ao governo federal, como ao governo estadual, às autoridades do local, que tomassem providências no sentido de proteger a integridade física dessas meninas. Isso tudo precisa ser devidamente investigado”, ressaltou.
“[…] Precisamos ter a certeza de que esses fatos estão corretos, proteger às pessoas, mas o que temos por enquanto são esses relatos. Mas acho que são muito verossimilhantes porque diante da situação, não há que se duvidar de que isso esteja acontecendo”, analisa o ministro.
Os relatos, de acordo com o ministro, identificam que há uma violência sexual sistemática por conta da presença do garimpo no Território Yanomami, associado a “uma deterioração das condições sociais, que faz com que as pessoas fiquem submetidas a todo tipo de fragilidade, social e política, e, portanto, os abusos sexuais são constantes, o que levou a essa situação”, explica o titular dos Direitos Humanos.
“Eles estão recebendo armas de fogo, eles tão ficando dependentes da ‘caridade’ do garimpo para poder comer porque já não têm mais acesso aos recursos naturais daquele paraíso onde eles vivem – porque antes era um paraíso”, explicou a repórter da TV Globo Sonia Brid e suas declarações corrobora com a situação relatada pelo secretário dos Direitos da Criança e do Adolescente
Brid, que esteve na TIY há duas semanas para gravar uma reportagem para o Fantástico sobre a tragédia na terra indígena, se baseou em um relatório divulgado no ano passado, pela Associação Hutukara, de proteção aos indígenas, que denuncia a violência e outros males causados pelos garimpeiros aos povos indígenas, que os colocam em situação de total vulnerabilidade, resultando no aliciamento de muitos indígenas para sobreviver.
“Ele (relatório) detalha, dando nomes e endereços, datas de estupros, ataques com armas de fogo, aliciamento com bebidas alcóolicas”, pontua a jornalista. “Tem casos de duas crianças sugadas pela bomba do garimpo […] casos de meninas estupradas pelos garimpeiros, que engravidam, eles roubam as crianças. Tudo isso tá relatado. Esse documento foi para o Ministério Público, foi para foi para o Ministério da Justiça, foi para a Funai […], diz a jornalista.
“A violência sexual é parte de um processo que nós chamamos de genocídio. A violência sexual, o estupro, fazem parte de um processo de deterioração das condições morais de uma comunidade, que nós chamamos de genocídio, da destruição da vida comunitária”, diz. “Não é só a questão da fome, não é só a questão da saúde, mas é a questão da fragilização das condições de vida na região”, acredita.
INTENÇÃO DE EXTERMÍNIO
Questionando pela jornalista Fabíola Sidral, durante a entrevista, Sílvio Almeida respalda a avaliação do ministro do Desenvolvimento Social, Welligton Dias, de que havia, por parte do ex-governo Bolsonaro, a intenção de exterminar a população Yanomami.
Ele defende que precisa avaliar mais cuidadosamente a questão, “mas tudo levar a crer (que havia). E justifica: “Por notas técnicas, pareceres técnicos (obtidos quando a pasta era chamada de Ministério da Mulher), recusando um projeto de lei, dizendo que esse projeto não servia, um projeto que determinava auxílio emergencial ao povo Yanomami. E o que é que eu tô chamando? (em que consistia o projeto) vacina, leito de hospital, de UTI e comida”, explica.
Mesmo enfraquecendo a fiscalização com o aparelhamento político de órgãos como Ibama e Funai, além de lançar decretos e portarias para facilitar a ação do garimpo criminoso nas terras demarcadas, Bolsonaro alegou que a emergência na saúde yanomami é uma “farsa da esquerda”. Segundo ele, a saúde indígena foi uma das prioridades da sua gestão.
Em outubro, como último ato do governo, Jair Bolsonaro autorizou a exploração do garimpo em terras indígenas, medida revogada pelo seu sucessor, Luiz Inácio Lula da Silva.
Eu defendo que todo território indígena seja protegido por forças especiais de defesa armadas, contra todo e qualquer invasor e agressor dos latifúndios, mineradoras, madeireiras, missões cristãs etc. Uma força treinada especificamente para defender todos os territórios indígenas no Brasil.