Esta foi a décima tentativa de Flávio Bolsonaro de paralisar as investigações do esquema de lavagem de dinheiro montado dentro de seu gabinete na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj)
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) decidiu nesta segunda-feira (29) entrar com um recurso no Supremo Tribunal Federal (STF) para derrubar a decisão da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ) que, por 2 votos a 1, deu foro privilegiado ao senador Flávio Bolsonaro. Com o resultado, as investigações saíram das mãos do juiz Flávio Itabaiana Leonel, da 27ª Vara Criminal do Rio, mas suas decisões foram mantidas. Isto é, Queiroz continua preso.
Na avaliação dos procuradores, constante no documento enviado ao ministro Dias Toffoli, a decisão da 3ª Câmara Criminal do TJRJ, é uma afronta às decisões do Supremo sobre o assunto. O TJRJ descumpriu decisões anteriores do STF, “usurpando, assim, a competência da Suprema Corte para definir os limites do foro por prerrogativa de função de senadores da república”, argumentam os promotores.
O STF definiu que o foro é só para crimes cometidos durante o mandato. Perdido o mandato, não há mais foro privilegiado. Se ele tivesse direito por ser senador, ele seria julgado no STF, que já se posicionou contra.
O procurador da República aposentado e ex-coordenador da força-tarefa da Lava Jato no Paraná, Carlos Fernando Dos Santos Lima, criticou a decisão em uma rede social. “Um completo absurdo”, escreveu. “A tese de continuidade do foro privilegiado mesmo quando já fora do cargo é contrária à decisão do STF.
Thiago Bottino, professor da FGV Direito Rio, também contestou o entendimento do TJ-RJ. “Ela não está de acordo com o precedente do Supremo. O Órgão Especial só seria competente se ele ainda fosse deputado. Como ele não tem mais o cargo, perdeu o foro. Nesse caso, o caso deveria continuar com o juiz de 1º grau”, argumentou.
Esta foi a décima tentativa de Flávio Bolsonaro de paralisar as investigações do esquema de lavagem de dinheiro montado dentro de seu gabinete na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), quando ele era deputado estadual.
E o mais desaforado de tudo isso é que Flávio, junto com pai, Jair Bolsonaro, diziam em alto e bom som no passado que o foro privilegiado era “um absurdo”, deveria acabar, que “só servia para proteger corruptos”, etc. Agora, se penduram de qualquer jeito nessa alternativa para tentar escapar das garras da Justiça.
Há especialistas que consideram a “vitória” de Flávio, obtida na 3ª Câmara Criminal do TJ-RJ como sendo uma “vitória de Pirro”, porque, segundo eles, o STF não tem como não derrubar essa decisão, se for acionado. E ele já foi acionado duas vezes, uma pela Rede Sustentabilidade, e, agora, pelo MP-RJ. Só para lembrar, Pirro era um general grego que venceu os romanos na Batalha de Ásculo (279 a.C). Ao ser cumprimentado pela vitória, ele disse: “mais uma vitória como esta, e estou perdido.” “Vitória de Pirro” passou a ser vista como derrota.
No início do ano passado, Flávio tentou levar o caso para o STF já que ele havia sido diplomado senador. Alegava também que seu sigilo bancário havia sido quebrado sem autorização da Justiça. Em janeiro de 2019, o ministro Luiz Fux, que estava no plantão durante o recesso judiciário, chegou a conceder liminar suspendendo as investigações. Duas semanas depois, assim que as atividades do STF foram retomadas, o relator do caso, ministro Marco Aurélio, revogou a liminar e determinou o arquivamento do caso. Em entrevista, dissera que costumava remeter para o lixo aquele tipo de reclamação.
Na decisão, o ministro afirmou que o fato de Flávio ter sido eleito senador não justificaria a ida do caso para o Supremo: “Frise-se que o fato de alcançar-se mandato diverso daquele no curso do qual supostamente praticado delito não enseja o chamado elevador processual, deslocando-se autos de inquérito, procedimento de investigação penal ou processo-crime em tramitação”, escreveu.
Segundo o MP, uma organização criminosa se estabeleceu dentro do gabinete do então deputado Flávio Bolsonaro e montou um esquema de lavagem de dinheiro através de funcionários fantasmas que não trabalhavam e devolviam parte dos salários para o deputado.
O Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) detectou na época uma movimentação milionária na conta de Fabrício Queiroz, que cumpria a função de assessor de Flávio. No período de um ano foram R$ 1,2 milhão e em três anos esse valor chegou a R$ 7 milhões na conta do assessor, sem que Queiroz tivesse rendimentos que justificassem esta volumosa movimentação financeira.
Apesar da mudança de foro, os desembargadores decidiram pela validade das decisões do juiz Itabaiana, e a defesa dos investigados entrou com um recurso para que o Órgão Especial anule toda a investigação – o que, na prática, poderia tirar Queiroz da cadeia.
Os investigadores estão na captura da mulher de Queiroz, Márcia Oliveira de Aguiar, que está foragida e deu sinais de que estaria disposta a fechar um acordo de colaboração premiada. O próprio Fabrício Queiroz também sinalizou com essa possibilidade em troca de garantia de segurança para a sua família.