A operação policial na Vila Cruzeiro, que agora deixou pelo menos 23 mortos confirmados, tem indícios de tortura e execução. É o que diz o procurador da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), Rodrigo Mondego.
“Existe indícios de execuções, em algumas regiões. Indícios de que pelo menos uma pessoa foi torturada antes de ser morta, ontem. E existe indícios de mortos a facadas. Então, a gente está aguardando o desenrolar da perícia do IML para ver em que condições essas pessoas foram mortas”, disse Mondego.
Representantes da OAB e da Defensoria Pública estiveram na comunidade na manhã de quarta-feira (25), e moradores e lideranças do bairro foram ouvidos. A operação em conjunto entre BOPE, Polícia Militar e Polícia Rodoviária Federal aconteceu na terça-feira (24), e tinha como objetivo prender chefes do Comando Vermelho.
Segundo relatos de moradores, os tiroteios começaram às 4h, e de acordo com informações oficiais, foram mais de 12 horas de trocas de tiros no total.
O ouvidor-geral da Defensoria Pública, Guilherme Pimentel, foi à favela ouvir moradores.
“A gente veio aqui com moradores, lideranças. A gente está escutando o que eles têm a dizer. Eles vieram aqui nos mostrar a área onde tudo aconteceu e isso faz parte da nossa apuração para que a gente consiga prestar o melhor serviço pra população, principalmente para as famílias afetadas”, disse Pimentel.
Entre as mortes está a manicure Gabrielle Ferreira da Cunha, atingida por uma bala perdida enquanto estava em frente a porta da sua casa, na favela da Chatuba, vizinha à Vila Cruzeiro.
Por enquanto, os números de vítimas indicam que essa é a segunda operação mais letal da história da polícia do Rio de Janeiro, ficando atrás somente da ação deflagrada em Jacarezinho, em maio do ano passado. Na ocasião, 28 pessoas morreram.
LETALIDADE GOVERNO CASTRO
Desde que Cláudio Castro (PL) assumiu como governador interino do Rio de Janeiro, em agosto de 2020, após Witzel ser tirado do cargo, as forças de segurança do estado já realizaram 74 operações com pelo menos três mortes.
Essas 74 operações deixaram 330 civis mortos, segundo levantamento produzido pelo Geni (Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos) da Universidade Federal Fluminense (UFF).
As operações policiais que terminaram com três ou mais pessoas mortas são classificadas como chacina.
O estudo foi realizado a partir da base de dados do Geni, alimentada com notícias da imprensa, e abrange a região metropolitana do Rio de Janeiro.
Wilson Witzel assumiu o governo do Rio em 2018 com a promessa de dar “tiro na cabecinha” de criminosos que portassem fuzil. Em sua gestão, da qual Castro era vice, foram contabilizadas 104 operações como essas, com 392 mortes de civis.
Castro assumiu o estado com o afastamento de Witzel, em abril de 2021 após denúncias de corrupção e até o momento, pouco mais de um ano depois, houve menos chacinas, mas a letalidade em cada uma foi maior na gestão Castro. Enquanto com Witzel, foram registradas 3,8 mortes por ação, com Castro foi 4,5.
Em 2018, foram contabilizadas 63 operações com três ou mais mortes. O número salta para 75 em 2019, no primeiro ano da gestão Witzel, e cai para 43 em 2020, com a determinação do STF (Supremo Tribunal Federal) que restringiu as operações policiais nas favelas durante a pandemia da Covid-19.