A Polícia Federal pediu autorização ao Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar irregularidades no uso das emendas de relator, conhecidas como “orçamento secreto”.
A PF quer apurar denúncias de uso ilegal de dinheiro proveniente de emendas para compra de tratores.
No pedido de abertura de inquérito enviado ao Supremo, a PF informou que quer identificar os autores das emendas relacionadas a irregularidades.
“Orçamento secreto” é um esquema inconstitucional de manipulação de verbas públicas por parte do Planalto e do relator do Orçamento. O intento com o “orçamento secreto” é subornar deputados e obter apoio em votações de interesse do governo no Congresso Nacional
A denúncia da existência do “orçamento secreto” surgiu no início de maio, quando o jornal O Estado de S. Paulo teve acesso a documentos que revelavam que o governo federal, através do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), havia disponibilizado R$ 3 bilhões num “orçamento paralelo” para deputados e senadores destinarem a ações em suas bases, apesar dessa prática não ser especificada na Lei Orçamentária.
O relator do Orçamento podia fazer alterações técnicas no texto, em regra, para corrigir erros e omissões e recompor dotações canceladas. Como é para ajustes técnicos, a emenda do relator tinha, até 2020, um tamanho pequeno, se comparada ao restante do Orçamento.
Porém, a partir de 2020, com a chegada de Bolsonaro ao governo, isso foi alterado. O Orçamento de 2021 reserva R$ 16,8 bilhões para as emendas de relator e, para o ano que vem, Bolsonaro queria manipular R$ 20 bilhões.
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu no último dia 10, por 8 votos a 2, manter a suspensão das “emendas de relator”.
O plenário virtual da Corte confirmou, assim, a decisão da ministra Rosa Weber que suspendeu o pagamento dos recursos oriundos das emendas de relator.
Rosa Weber considerou a prática irregular porque esconde o nome do parlamentar que fez a indicação de gasto e favorece apenas aqueles que votam conforme manda o governo Bolsonaro.
Segundo ela, “o relator geral do orçamento figura apenas formalmente”, enquanto “quem detém, de fato, o poder de decidir” os gastos das emendas “são apenas os deputados federais e senadores autorizados, por meio de acordos informais, a realizarem indicações”.
“Causa perplexidade a descoberta de que parcela significativa do Orçamento da União esteja sendo ofertada a grupo de parlamentares, mediante distribuição arbitrária entabulada entre coalizões políticas, para que tais congressistas utilizem recursos públicos conforme seus interesses pessoais, sem a observância de critérios objetivos destinados à concretização das políticas públicas a que deveriam servir as despesas”, continuou ministra.
Sua colega, a ministra Cármen Lúcia, ao votar pela manutenção da suspensão dos pagamentos, corroborou com a opinião de Weber destacando que “a utilização de emendas orçamentárias como forma de cooptação de apoio político pelo Poder Executivo, além de afrontar o princípio da igualdade, na medida em que privilegia certos congressistas em detrimento de outros, põe em risco o sistema democrático”.
“Esse comportamento compromete a representação legítima, escorreita e digna, desvirtua os processos e os fins da escolha democrática dos eleitos, afasta do público o interesse buscado e cega ao olhar escrutinador do povo o gasto dos recursos que deveriam ser dirigidos ao atendimento das carências e aspirações legítimas da nação”, acrescentou.
A ministra disse, ainda, que os assuntos do Estado devem ser transparentes porque são de interesse direto da população. “O Estado põe-se a serviço dos cidadãos, e somente por isso se justifica, e como tal deve satisfação de seus atos”.
O vice-presidente, general Hamilton Mourão (PRTB), considerou que “foi oportuna” a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender os pagamentos do “orçamento secreto”.
“Acho que os princípios da administração pública, de legalidade, de impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência não estavam sendo respeitados nessa forma aí de execução orçamentária. Então, eu acho que a intervenção do STF foi oportuna”, avaliou Mourão.
Esta semana Mourão reafirmou que o “orçamento secreto” representa “manobras em benefício daqueles que apoiam o governo”. A declaração foi feita durante a entrevista para o portal UOL.
As verbas do “orçamento secreto” também são questionadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). O tribunal considerou irregular obras e a compra de tratores superfaturados com verbas do orçamento secreto.
Os senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Humberto Costa (PT-PE) enviaram ofício ao STF pedindo a punição de Jair Bolsonaro e do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), por descumprirem a decisão da ministra Rosa Weber que suspendeu o “orçamento secreto”.
Os parlamentares relacionaram no pedido 21 pagamentos que somam R$ 5 milhões e que foram efetuados por vários órgãos federais após a decisão da ministra.
Os parlamentares citaram que foram “realizados diversos eventos relacionados a empenho, liquidação e pagamento” após a decisão da ministra e pediram a ela a adoção das “medidas que entender pertinentes”, entre as quais, exemplificaram, aplicação de multa; apuração do suposto descumprimento da decisão; e responsabilização de agentes públicos, entre os quais Bolsonaro e Lira.
A maior parte dos pagamentos do “orçamento secreto” aconteceu nas semanas anteriores às votações decisivas para o governo.
Mais da metade dos R$ 19 bilhões reservados para as “emendas do relator” de 2020 foram efetivamente empenhados durante o período em que o governo Bolsonaro estava fazendo campanha para Arthur Lira (PP-AL) ser eleito presidente da Câmara.
As vésperas da votação da PEC dos Precatórios na Câmara o governo liberou R$ 1,4 bilhão.
A PEC passou por uma diferença de 4 votos do mínimo necessário (308 votos) para aprovar uma proposta de emenda à Constituição no primeiro turno. Foram 312 votos a favor e 144 votos contrários.
No segundo turno o governo ampliou um pouco mais a votação, por 323 a 172 e 1 abstenção.
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