A Polícia Civil apreendeu mais de R$ 405 mil em moedas nacionais e estrangeiras e seis armas em uma das casas de João Teixeira de Faria, o João de Deus, na terça-feira (18), em Abadiânia (GO). O material estava escondido em várias partes do quarto do médium, entre elas o fundo falso de um guarda-roupa, segundo a corporação.
João de Deus está preso por suspeita de abuso sexual contra centenas de mulheres, que acusam o médium de ter se aproveitado do estado de vulnerabilidade que elas se encontravam, por conta de doenças ou traumas, para realizar estupros e abusos sexuais durante sessões de tratamento espiritual que eram realizados na Casa Dom Inácio de Loyola, em Abadiânia, no entorno do Distrito Federal. Algumas das vítimas relatam que os abusos ocorreram quando elas eram crianças e adolescentes. A defesa dele nega todas as acusações.
De acordo com o delegado-geral da Polícia Civil, André Fernandes, as notas estavam distribuídas em malas e no esconderijo do armário. Havia cédulas de várias moedas, incluindo reais, dólares americanos e canadenses, pesos argentinos, euros e francos suíços.
Todas as armas estavam sem registro. Em um baú, numa gaveta e em uma caixa foram encontrados revólveres, uma pistola 380 e uma garrucha, esta última com numeração raspada. Também foram encontrados diversos tipos de munições, entre elas algumas de uso exclusivo do Exército, e uma arma de brinquedo.
Os mandados de busca e apreensão foram cumpridos na Casa Dom Inácio, na residência de João de Deus, e na Casa da Sopa, todos em Abadiânia. “Em uma residência do investigado foram achadas seis armas, todo o montante em dinheiro, em fundo falso no fundo de um guarda-roupa. Não sabemos o motivo pelo qual ele mantinha o armamento e essa quantia elevada de dinheiro. Ainda nesta semana vamos concluir um dos inquéritos”, explicou o delegado.
O Ministério Público (MP) e a Polícia Civil informaram no inicio da segunda-feira (17), que receberam 506 relatos de mulheres que afirmam terem sido abusadas por João de Deus. O médium, que sempre negou as acusações, foi preso no domingo (16).
Após o depoimento de João de Deus, no domingo, o delegado-geral afirmou que o médium espiritual utilizava a fé da vítimas para cometer abusos sexuais contra elas. Neste sentido, o líder religioso poderá ser enquadrado, entre outros tipos de crimes, o de “violência sexual mediante fraude”.
“Com certeza, ele não admite [os crimes]. Apresenta a versão dele sobre o ocorrido. Ele utilizava a questão da fé, [há] vários argumentos para poder enquadrá-lo nesse tipo [violência sexual mediante fraude]”, complementou Fernandes.
Além destes crimes, os órgãos também apuram se houve conivência de outras pessoas e denúncias de lavagem de dinheiro.
“Há notícias de lavagem de dinheiro, que também, como os crimes sexuais, deve ser investigada. Mas é bom frisar que o momento é de investigar os crimes contra a dignidade sexual. Num segundo momento, os crimes que rodeiam a figura do acusado serão investigados”, explica o promotor Luciano Meirelles.
A Polícia Civil informou que, das 15 mulheres que já prestaram denúncias de abuso sexual ao órgão contra o médium João de Deus, até esta terça-feira (18), apenas um dos casos vai virar inquérito policial. Segundo a delegada Karla Fernandes, o motivo é que os demais casos ocorreram há anos, quando a legislação brasileira previa que a denúncia só seria investigada se o registro fosse feito até seis meses depois do abuso. Em setembro deste ano, a legislação mudou e não há mais prazo para que as denúncias de abuso sexual sejam registradas.
Mesmo assim, é fundamental que as vítimas continuem denunciando os crimes. A polícia e o MP reforça que mesmo que a denúncias não resultem em inquéritos, as vítimas devem denunciar, por que é importante deixar claro, e que os depoimentos delas podem ajudar nas investigações.
“Em crimes de natureza sexual, nós temos que observar que a palavra da vítima tem um sobrevalor. Eles geralmente não são acompanhados de testemunhas, não são praticados a céu aberto. A semelhança entre esses relatos também pode ser utilizado como material probatório”, afirma o promotor de Justiça Luciano Miranda Meireles.
Nova linha de investigação apura pedras falsas
O Ministério Público e a Polícia Civil abriram uma nova linha de investigação contra João de Deus. Os órgãos investigam o médium por, supostamente, vender pedras preciosas falsas como se fossem verdadeiras. A acusação foi feita através de uma denúncia de um negociador de João, cujo nome é mantido em sigilo, e gerou um inquérito de estelionato na Delegacia de Investigações Criminais de Goiânia.
João Teixeira de Faria já teve garimpos nas regiões de Santa Terezinha e Crixás, em Goiás. E atualmente o guia espiritual faz essa atividade em sua propriedade rural em Pilar, também em Goiás.
O centro de atendimento de João, em Abadiânia, era um dos espaços em que esses cristais eram vendidos. Em depoimento prestado no último domingo, o líder espiritual foi questionado sobre esta irregularidade e afirmou que não emitia certificados para estas vendas.
João de Deus fez fortuna no início da década de 80 garimpando ouro em Serra Pelada, o “eldorado” do Pará o maior garimpo a céu aberto do mundo. Ele repetiu em várias entrevistas ao longo dos anos que foi “um dos primeiros a chegar” no garimpo.
ANTONIO ROSA