O depoimento do ministro Paulo Guedes, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, sobre o seu projeto de ataque à Previdência, dirimiu várias dúvidas que, talvez, ainda existissem.
Não em relação à sua “reforma” – mas em relação ao seu caráter.
Guedes estava foragido da CCJ desde o último dia 26 (v. Previdência: Paulo Guedes afronta o Legislativo e não comparece à CCJ).
Na quarta-feira (03/04), ele compareceu escoltado pelo presidente da Câmara dos Deputados, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), pelo ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, pelo ministro da Cidadania, Osmar Terra, e por uma claque que se agitava a cada esgar de Guedes.
Somente assim ele compareceu.
E mesmo assim foi um desastre.
No dia anterior, o presidente da Câmara declarara que a “capitalização”, ou seja, o fim da previdência pública, substituída pelo regime dos bancos privados sobre as aposentadorias – que é o centro da proposta de Guedes – não passaria na Câmara (cf. Maia avalia que capitalização individual na reforma da Previdência não será aprovada).
Na quarta-feira, é provável que o presidente da Câmara tenha percebido a perda de tempo e prestígio que é oferecer sombra para um escroque.
Pois Guedes não é um sujeito sério.
É, como disse um deputado, um “mentiroso”, um sujeito que diz qualquer coisa, sem nenhuma preocupação com aquilo que é verdade.
Alguns podem dizer que tal característica não é incomum, no Brasil, em ministros. Mas não estamos, mesmo em se tratando de mentira, nos referindo a algo que é comum.
Guedes não tem o menor pejo de mentir, mesmo em questões que todos sabem que está mentindo.
Como um ministro pode dizer, diante dos deputados, que o aumento da idade mínima “atinge a moça de classe média alta”, mas não os pobres?
Todo o seu projeto de liquidação da Previdência pública – inclusive o aumento da idade mínima – é uma pilhagem sobre os mais pobres (v. A criminosa tentativa de Guedes e Bolsonaro de liquidar a Previdência Social).
Os 400 reais a que ele quer reduzir os que nada têm – e hoje recebem um salário mínimo no Loas/BPC – são, não somente um símbolo dessa pilhagem, como a própria pilhagem em seu aspecto mais injusto, mais desumano, mais absurdo, mais criminoso.
Serão as “moças da classe média alta” que serão afetadas pelo aumento da idade mínima – e do tempo de contribuição – para a aposentadoria?
Se fossem elas, também seria injusto.
Mas não são essas moças que se aposentam com menos de dois salários mínimos – como é o caso de 95% das pessoas que se aposentam, 53% delas por idade, no Regime Geral da Previdência Social (RGPS).
O projeto de Guedes não apenas aumenta a idade mínima. Além disso, proíbe qualquer aposentadoria por tempo de contribuição – ao mesmo tempo que exige um tempo mínimo de 20 anos de contribuição para que alguém se aposente.
Sem isso, a idade mínima não tem qualquer valor para a aposentadoria no projeto de Guedes.
Mas isso se refere ao Regime Geral (RGPS), isto é, aos empregados em empresas privadas.
O projeto também aumenta a idade mínima para a aposentadoria rural – de 55 anos para 60 anos, no caso das mulheres, mais 20 anos de contribuição, mais um pedágio de R$ 600 anuais.
Serão as “moças da classe média alta” que, na agricultura, serão afetadas por essa mudança?
A mesma coisa pode ser dita em relação aos professores e outros funcionários públicos.
De onde tiramos esses dados?
Da própria exposição de motivos de Guedes e da apresentação preparada pelo seu Ministério.
Porém, isso não é tudo.
O aumento da idade mínima somente vale até que, segundo o projeto de Guedes, a Previdência seja retirada da Constituição – depois disso, por lei complementar ou por lei ordinária, o Inferno é o limite.
VENENO
Na sessão da CCJ, o deputado Subtenente Gonzaga (PDT-MG) declarou que “nossa prioridade é rejeitar essa proposta de reforma da Previdência” – e frisou que tirar da Constituição a Previdência “é um cheque em branco”.
Nada há, realmente, a fazer com essa revogação da Lei dos Sexagenários, senão rejeitá-la.
Sobretudo porque, além do conteúdo em si, seu patrono não inspira a menor confiança.
Dirão alguns leitores, provavelmente, que isso é óbvio – quem poderia confiar em Guedes?
Infelizmente, não é assim tão óbvio, porque não estamos nos referindo apenas à confiança em geral, àquela que deveria ser própria dos governantes (qualquer deles, mesmo quando apresentam propostas ruins).
Estamos nos referindo a algo qualitativamente distinto.
Muitas pessoas que conhecem Guedes se referiram à sua falta de escrúpulos – o que significa, obviamente, falta de caráter.
Por exemplo, antes de sua performance na CCJ, segundo membros da bancada do PSL, ele disse a deputados governistas que a “reforma da Previdência” iria “vitaminar” a sua votação.
Será que Guedes acha que a bancada governista é composta de otários?
Não se trata de um preconceito contra o PSL: Guedes, como qualquer vigarista vulgar, acha que todos são otários. Afinal, a humanidade, para esse tipo de sujeito, existe para ser enganada, trapaceada – e só para isso.
Dos 23 deputados que aprovaram, em 2018, a “reforma da Previdência” de Temer, na Comissão Especial da Câmara, 18 não se reelegeram. Segundo o então mais entusiasmado deles, o relator da Comissão, Arthur Maia (DEM-BA), ele próprio quase não se reelege:
“Quem tiver disposição de votar na reforma, tenha desapego ao mandato, porque corre o risco grande de perder o mandato, como eu corri e tantos outros perderam” (cf. ‘Quem votar a favor da Previdência, pode perder mandato’, diz ex-relator).
Isso foi o que aconteceu com os que votaram a favor da “reforma” do governo Temer. Pode-se imaginar o que acontecerá em relação a uma proposta muito mais selvagem, afrontosa, sem vergonha e sem limites, como a de Guedes e Bolsonaro.
Mas Guedes disse aos deputados que votar a favor da proposta – aprovar o fim da Previdência pública – iria “vitaminar” a sua votação.
Era mais ou menos assim que os nazistas conduziam suas vítimas para às câmaras de gás.
A diferença é que essas últimas não tinham outra alternativa, nem tinham como saber o que iria acontecer em seguida.
PERFIL
Guedes é um especulador, um vadio do “mercado” financeiro, incapaz de trabalhar ou empreender – em suma, um rentista, que amealha fortunas com os juros da dívida pública.
Mas, disse ele na CCJ, “o Brasil é o paraíso dos rentistas e o inferno dos empreendedores”.
E quando alguns deputados lembraram que ele é um rentista – um fato absolutamente notório – respondeu Guedes, indignado (ou, melhor, afetando indignação):
“Eu não classifico ninguém e não gostaria de ser classificado.”
Mas isso não depende da sua vontade. Até porque foi ele mesmo que começou a classificar outros de “rentistas”.
No momento, Guedes é investigado pelos golpes que perpetrou em cima dos fundos de pensão (ou seja, fundos de previdência) das estatais.
Roubar milhões e bilhões dos fundos de previdência, para ele, não é um problema.
Para ele o problema são aqueles que recebem um a dois salários mínimos de aposentadoria.
Por quê?
Porque quer roubar também esses – que são 30, 40 ou 50 milhões, se somarmos todos os regimes de previdência que existem no país.
O economista José Luís Oreiro, da Universidade de Brasília, disse algo interessante sobre Guedes:
“Paulo Guedes é a cara do governo Bolsonaro: a ignorância orgulhosa.”
Ou, em nossa tradução: estupidez e reacionarismo sem limites.
No mesmo artigo, conta Oreiro:
“Eu tive a oportunidade de ter algum contato com o Paulo Guedes no período em que fui professor na Faculdade de Economia e Administração do IBMEC-RJ entre 1996 e 2001.
“Nunca tive uma boa impressão do sujeito. Trata-se de uma pessoa que (…) não só se gaba de ser rico; como ainda acredita que isso o torna superior ao resto dos mortais.
“Lembro também de um almoço palestra que ele proferiu para os professores do IBMEC em 1999 – logo após o Professor Fernando de Holanda Barbosa pedir demissão do cargo de coordenador do curso de economia, devido a desentendimentos com o Guedes.
“Nesse evento Guedes resolveu apresentar a sua teoria a respeito das causas da desigualdade de renda entre os países ricos e os países pobres. Basicamente Guedes atribuía a diferença de renda entre os países às diferenças culturais e comportamentais (prefiro não reproduzir o linguajar, por assim dizer, inculto que ele usou na ocasião) que se refletiriam em diferenças na taxa de natalidade entre os países.
“Nunca vi uma pessoa com doutorado em economia apresentar uma explicação tão rasa para uma questão que ainda não é consensual entre os economistas; e continua sendo um dos maiores enigmas para as diferentes escolas de pensamento econômico. Não contente de ‘apenas’ proferir uma explicação rasa para um problema complexo, Guedes apresentou a mesma com o ar de certeza de um Papa que está proferindo sua posição ex-chatedra sobre um dogma de fé!” (cf. J.L. Oreiro, A ignorância de Paulo Guedes sobre o funcionamento da administração pública, 18/03/2019).
O professor Oreiro não é adversário da reforma da Previdência em geral; mas, aponta, a “reforma” de Guedes é absolutamente sem sentido, porque não tem fundamento algum:
“Guedes não tem interesse nenhum em discutir os detalhes da sua proposta de reforma da previdência porque sabe muito bem que a mesma não para em pé. Dessa forma, a única chance de aprovação é passar o ‘rolo compressor’ sobre o Congresso Nacional, usando de todos os artifícios possíveis, até o recurso ao ‘terrorismo econômico’ ao afirmar que se a reforma não for aprovada o governo irá deixar de pagar os salários dos funcionários públicos, os quais são DESPESA OBRIGATÓRIA.
“Já tive oportunidade em outro post (E se a Reforma da Previdência não for aprovada? É o fim do Brasil?) de mostrar que não existe possibilidade do governo ‘ficar sem dinheiro’ para pagar suas despesas, até porque essas despesas são denominadas na moeda que o próprio governo emite .
“Nesse contexto, é bom reafirmar que há uma diferença abissal entre o Brasil e a Grécia: a Grécia tem uma moeda cuja emissão é de responsabilidade do Banco Central Europeu, estando assim fora da jurisdição do governo da Grécia, o qual depende, portanto, da boa vontade dos mercados financeiros para financiar a rolagem de sua enorme dívida. Esse não é o caso do Brasil.
“Eu desafio publicamente ao ministro Paulo Guedes a apresentar os detalhes técnicos – não a embromação a la Rolando Lero que ele costuma fazer para os mais incautos que o escutam – da reforma da Previdência. A apresentação deve ser feita por ele, e não terceirizada para os seus assessores, afinal de conta ele é PhD em economia pela Universidade de Chicago. Afirmo de antemão que esses detalhes não existem ou não param de pé frente a qualquer análise mais cuidadosa. Se ele não foi capaz de atender a esse desafio então que peça imediatamente a exoneração do cargo de Ministro da Economia” (cf. E Paulo Guedes Amarelou … Por que?, 26/03/2019, grifo no original).
MAIS POBRES
O que aconteceu na quarta-feira, na CCJ, foi exatamente isso: Guedes tentando – e achando possível – passar o “rolo compressor” no Congresso.
E sozinho. O primeiro deputado bolsonarista falou quando Guedes apanhava, como boi ladrão, há nada menos que duas horas.
Oito deputados governistas e 16 deputados da oposição intervieram durante a sessão.
Apenas três deputados governistas defenderam a “reforma” do governo.
Fora isso, Guedes contou com a claque, chefiada pelo ex-deputado emedebista Darcísio Perondi, puxa-saco que não conseguiu se reeleger, depois de votar na “reforma da Previdência” de Temer, e agora é chefe de torcida de Bolsonaro. Mas a claque era pequena.
É compreensível a atitude dos governistas. Como defender um sujeito que fala coisas como: “… no ano passado nós gastamos R$ 700 bilhões com a Previdência, que é o passado, são os nossos idosos. E nós gastamos R$ 70 bilhões com a educação, que é o nosso futuro. Então nós gastamos dez vezes mais com a Previdência, do que com o futuro, a educação”?
A Previdência não é o passado. É o presente – por isso, o vínculo entre trabalhadores da ativa e aposentados do sistema atual.
A maior parte dos municípios brasileiros tem a renda dos aposentados como principal componente do seu mercado.
Como é possível chamar isso de “passado”?
Só é possível quando a proposta é enterrar os idosos – nas palavras do governador do Maranhão, Flávio Dino, perpetrar um genocídio no país.
Não é o que gastamos com a Previdência – que, inclusive, tem fontes próprias – que impede o aumento dos gastos com a Educação.
O que nos impede de aumentar o investimento em Educação são os gastos com juros.
Mas a política de Guedes é, exatamente, a de tirar dinheiro da Previdência para aumentar os gastos com juros – e não com a Educação ou com a Saúde.
Quanto ao suposto corte de privilégios, qual é o privilégio com que a reforma de Guedes acabaria?
Nenhum.
Como disse a líder da minoria na Câmara, deputada Jandira Feghali (PcdoB-RJ), “essa proposta não atinge privilégios. Essa proposta arrebenta com a Previdência dos trabalhadores mais pobres desse país”. Nota ela que a “reforma” de Guedes, se fosse aprovada, atingiria 83,4% dos trabalhadores que ganham até dois salários mínimos.
“O senhor está destruindo os pilares da Previdência Social brasileira”, disse, na CCJ, o líder da oposição na Câmara, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ).
Guedes, na CCJ, mostrou o perfil acima esboçado pelo professor Oreiro. Em suma, um sujeito que não tem respeito pelos demais.
O tumulto final, e o bate-boca com o deputado Zeca Dirceu – que parece o típico encenador petista, algo insignificante, mais jogando para a sua plateia do que interessado no combate efetivo pelos interesses do povo – não tem muita importância.
Mas a ofensa partiu de Guedes, como reconheceu, implicitamente, o presidente da Câmara: “Talvez o ministro possa ter reagido porque ele não está acostumado com esse ambiente, da política, de Brasília”.
Guedes, como Bolsonaro, não está acostumado com a democracia.
Assim, o presidente da CCJ, deputado Francischini, às 20h30min, resolveu encerrar a sessão.
C.L.
O final da sessão da CCJ:
Não importando quem disse. Paulo Guedes foi chamado de Tigrão e Tchutchuca.
Guedes, o Tigrão, cantando a música do Bonde do Tigrão, Cerol na mão, para os(as) futuros(as) aposentados (as) com a letra modificada:
Vai dançar, vai dançar
O tigrão vai te ferrar
Vai dançar, vai dançar
O tigrão vai te ferrar.
Guedes,agora tchutchuca, cantando para os bancos a música do Bonde do Tigrão – Tchutchuca vem Aqui pro seu Tigrão, com o nome mudado para Agora eu sou tchutchuca e vocês meus Tigrões:
Vem, vem
Agora eu sou Tchutchuca
Venham aqui , cada um é meu Tigrão
Vou lhes jogar muita grana
E lhes dar a capítalização
Paulo Guedes, o homem da Reforma da Previdência do Bolsonaro, é alvo de ao menos três investigações, uma delas instaurada em 26.10.2018, sobre suspeitas de gestão fraudulenta ou temerária envolvendo fundos de pensão. Ele nega irregularidades.
Disse ele na CCJ que não vai entregar a capitalização para os bancos.
Interessante: na capitalização no Chile os fundos são administrados por AFPs [Administradoras de Fundos de Pensão], sendo 6 seis, cinco delas estrangeiras, e entre estas uma é controlada pela seguradora brasileira BTG Pactual, que coincidentemente foi co-fundada por Paulo Guedes, que, ao que parece, não está mais na mesma. BTG Pactual é um banco, do qual ele foi um dos fundadores.
Estas Associações não tem ligação com bancos?
DESTACO: no Chile os fundos são administrados por AFPs [Administradoras de Fundos de Pensão].
Guedes é alvo de ao menos três investigações, uma delas instaurada em 26.10.2018, sobre suspeitas de gestão fraudulenta ou temerária envolvendo “fundos de pensão”.
Registre-se que os fundos de pensão são de estatais, que ele prega devam ser privatizadas. Ao longo de seis anos o economista captou ao menos 1 bilhão de reais (uma merreca, não é?), de entidades como Previ (Banco do Brasil), Petros (Petrobras), Funcef (Caixa), Postalis (Correios) e BNDESPar, braço de investimentos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
COINCIDÊNCIAS…??????
A MENTIRA FOI CLARÍSSIMA. O BRASIL NÃO GASTA SETECENTOS BILHÕES COM A PREVIDÊNCIA.
ELE SOMOU OS QUATROCENTOS BILHÕES QUE E O VALOR ARRECADADO. QUER DIZER TOMOU POSSE DOS QUATROCENTOS BILHÕES. ELE NÃO E CONFIÁVEL NEM ELE NEM O ROGÉRIO MARINHO.
TODOS ESTÃO MENTINDO.
A CAPITALIZAÇÃO SERÁ UM DESASTRE. COMO UM TRABALHADOR COM UM SALÁRIO DE R$1.000,00
VAI FAZER POUPANÇA. IMPOSSÍVEL