Estudo da ANFIP sobre a Previdência chilena revela ainda que depois da implantação do modelo de capitalização no país, apenas metade dos trabalhadores conseguiu se aposentar
Durante os 37 anos da privatização da Previdência do Chile, apenas metade dos trabalhadores chilenos conseguiu se aposentar, denuncia a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (ANFIP), em estudo divulgado no final do mês passado. A ANFIP chama atenção ainda ao recorde de suicídios de idosos, em decorrência da penúria a que foram deixados após anos de contribuição.
A entidade explica que 1981, durante a ditadura militar de Augusto Pinochet (por inspiração do economista José Piñera – conhecido como um dos “Chicago Boy” que formularam a política econômica do ditador) e do ideário liberal de Milton Friedmann – mudou-se o regime de repartição (uma Previdência básica, pelo qual, arrecada-se a cada período, apenas o necessário e suficiente para cobrir as despesas desse mesmo período) para um regime de capitalização de financiamento obrigatório por parte dos trabalhadores formalizados (sem contribuição por parte dos empregadores), com previsão de um pagamento mínimo de aposentadoria para trabalhadores com pelo menos 20 anos de contribuição.
“Quando o Chile fez essa reforma estava em franco crescimento uma onda de políticas neoliberais num movimento capitaneado pelos Estados Unidos, que desaguou no Consenso de Washington. A partir de então, cada trabalhador ou trabalhadora passou a fazer a própria poupança, depositada em uma conta individual nas Administradoras de Fundos de Pensão (AFPs), que investiam os recursos no mercado financeiro. Além dos custos de transição e administração, foram verificados outros problemas como: a pouca cobertura do sistema de previdência, com enorme informalidade; baixos valores de benefícios; e o aumento de desigualdade sob vários aspectos”, aponta a entidade em seu estudo técnico – A reforma da Previdência no Contexto de Um Novo Governo.
A ANFIP expõe ainda que as administradoras de fundos de pensões não resistiram e foram sendo unificadas, restando no mercado, em 2017, apenas cinco delas, com elevado custo de administração, e por consequência pouca competição. “As empresas, como naturalmente lucrativas e comerciais, cobravam e cobram taxas altas, e o dinheiro pago mês a mês chega bem menor à época da aposentadoria, pois as taxas são descontadas das próprias aplicações do trabalhador”.
A Associação lembra que depois da implantação do modelo de capitalização no Chile, apenas metade dos trabalhadores conseguiu se aposentar. “A maioria desses trabalhadores ganhava salários baixos, ficou grandes períodos desempregada ou não conseguiu fazer uma poupança com recursos suficientes. Atualmente, fala-se que aproximadamente 91% dos aposentados chilenos recebem benefícios de cerca de meio salário mínimo do país, o equivalente, em média, a R$ 694, tendo em vista o piso nacional do Chile, que é de 288 pesos, ou cerca de R$ 1.575”, constatou a ANFIP.
Além disto, com base em dados do Instituto Nacional de Estatísticas (INE), organismo oficial chileno, entre 2010 e 2015, a Associação dos Auditores Fiscais chama a atenção ao extraordinário número de suicídios de idosos no Chile, em decorrência do desamparo a que foram deixados após adoção do modelo de capitalização. Entre 2010 e 2015, 936 adultos maiores de 70 anos tiraram sua própria vida no período. O levantamento aponta que os maiores de 80 anos apresentam as maiores taxas de suicídio – 17,7 para cada 100 mil habitantes – seguido pelos segmentos de 70 a 79 anos, com uma taxa de 15,4, contra uma taxa média nacional de 10,2. Conforme o Centro de Estudos de Velhice e Envelhecimento, do Instituto Vital Brazil, do Rio de Janeiro, são índices mórbidos, que crescem ano a ano, e refletem a “mais alta taxa de suicídios da América Latina”.
ANTONIO ROSA
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