O ministro da Saúde do governo Bolsonaro, Marcelo Queiroga, se eximiu da responsabilidade pela escassez de testes para a detecção do coronavírus no país e a atribuiu aos Estados e municípios. As declarações ocorreram após a Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed) emitiu nota técnica na quarta-feira (12), com recomendações aos laboratórios privados para que testem somente pacientes em estado grave, diante da possibilidade de desabastecimento dos estoques.
A pasta comandada por Queiroga informou estar atenta à situação de testes para Covid-19 e disse realizar “rotineiramente” o monitoramento da disponibilidade dos insumos necessários para a realização dos exames no Sistema Único de Saúde (SUS), porém o Ministério destacou que cabe aos Estados e municípios adquirir os recursos para os diagnósticos.
Anunciado pelo Ministério da Saúde, em 17 de setembro do ano passado, o Plano Nacional de Expansão da Testagem para Covid-19 (PNE-Teste) não chegou nem à metade dos municípios do País, segundo pesquisa da Confederação Nacional dos Municípios (CNM).
No levantamento, a entidade questionou as prefeituras se o Ministério da Saúde havia dado “algum apoio” – com insumos ou financeiro – no plano nacional de testagem e 51,8% afirmaram que não. Outros 40,6% disseram ter recebido ajuda da pasta e 7,6% não responderam. O levantamento, realizado de forma amostral, consultou 1.871 municípios entre os dias 10 e 13 de janeiro.
O presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Carlos Lula, afirmou, em entrevista ao Jornal Estado de S. Paulo, que o ministério subestimou a pandemia ao adquirir essa quantidade de exames, considerada baixa por ele. “O máximo que o ministério fez foi distribuir testes episodicamente, como está fazendo de novo. Não há uma política de testagem. A gente testa, não para ter número, mas para acompanhar o desenvolvimento da doença. Isso nunca houve enquanto política pública no país”, disse Carlos Lula, que é secretário de Saúde do Maranhão.
REDE PRIVADA
Na nota emitida pela Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed), em que a entidade recomenda que os laboratórios priorizem a testagem de pacientes graves, trabalhadores da saúde e outros profissionais essenciais, a organização afirma: “Não é possível mensurar nesse momento até quando poderemos atender, mas há um risco real de desabastecimento”.
A procura por testes aumentou com o avanço da variante ômicron, que é mais transmissível. A alta demanda faz com que a produção de insumos e reagentes esteja sobrecarregada. A associação afirmou que está produzindo uma nota técnica sobre o tema.
A falta de insumos já faz hospitais e clínicas pelo Brasil começarem a suspender a realização de testes para detectar a covid-19 no país. Depois do alerta da Abramed, a Drogaria Raia, Drogasil e a Rede D’Or anunciaram que suspenderam testagens.
De acordo com o presidente do Sindicato dos Laboratórios de Pesquisa e Análises Clínicas (Sindilab), Alexandre Bitencourt, a rede privada possui capacidade de atender à demanda crescente por testes e o problema é a falta de insumos no mercado. “A gente não tem mais o fornecimento do AG [para o teste rápido] e os reagentes para o PCR não estamos conseguindo mais importar, só temos o que já está no Brasil, que não vai durar muito”, diz. Ele explica ainda que não existe uma indústria nacional que forneça os materiais para a realização dos testes. “Existem distribuidores, eles fazem a importação em 99% dos casos e a gente compra direto deles. Não temos uma produção nacional, o que poderia ajudar em momentos como esse”.
Além dos problemas na rede privada com a falta de insumo, na rede pública já são mais de 2.100 municípios afetados com a falta de testes. Essas cidades apresentaram na semana passada um ofício ao Ministério da Saúde, solicitando apoio para que as cidades tivessem melhores estruturas para testagem.
Foi quando Queiroga atribuiu aos municípios a redução de testes de covid. “Como a pandemia caminhava para um controle, houve uma diminuição de solicitação dos municípios”, afirmou Queiroga em entrevista à CNN Brasil na terça-feira e agora voltou atrás falando em responsabilidade compartilhada.
A variante ômicron já está presente em 58,5% dos casos de Covid-19 analisados no mundo, tendo, portanto, ultrapassado a delta e se tornado dominante em nível global, apontou a Organização Mundial da Saúde (OMS). O relatório epidemiológico semanal divulgado na terça-feira pela OMS afirma que, dos mais de 357 mil casos sequenciados reportados à iniciativa global para o compartilhamento de dados sobre influenza e covid-19 (Gisaid, na sigla em inglês) nos últimos 30 dias, mais de 208 mil foram causados pela variante ômicron.