
A revista alemã Der Spiegel noticiou a descoberta de um documento de arquivo, que reforça a afirmação das autoridades russas de que quando a Alemanha foi unificada, foi prometido à União Soviética que a Otan não se expandiria para o leste, o que tem sido ressaltado pelo presidente russo Vladimir Putin, e que embasa a seriedade das propostas russas para a restauração da segurança coletiva indivisível na Europa e fim da expansão da Otan até às fronteiras russas.
Como observa Der Spiegel, fica claro no documento que os britânicos, norte-americanos, alemães e franceses concordaram que a adesão do Leste Europeu à Otan era “inaceitável”.
Textualmente está registrado que “não podemos oferecer à Polônia e aos demais a adesão à Otan”.
Há inclusive a declaração do representante norte-americano nessas negociações, Raymond Seitz, de que “a Otan não deve se expandir para o leste, nem formalmente nem informalmente”.
Mais uma comprovação do que vem sendo denunciado por Putin de que a Rússia foi “descaradamente enganada” pelos países ocidentais, que prometeram que a Otan não se expandiria “nem um centímetro para leste”.
O documento, ainda segundo Der Spiegel , foi descoberto nos Arquivos Nacionais Britânicos pelo cientista político norte-americano Joshua Shifrinson, professor da Universidade de Boston. Anteriormente, o documento era classificado como “Segredo”, mas depois foi desclassificado.
Pode-se considerar que o destaque dado pela Der Spiegel a um documento que prova que os russos estão certos na questão da “não expansão da Otan a leste” é um sintoma da enorme luta política nos altos escalões de Berlim sobre o que fazer – inclusive quanto ao gasoduto Nord Stream 2.
ATA SAI DA SOMBRA
Trata-se da ata da reunião dos diretores políticos dos Ministérios das Relações Exteriores dos Estados Unidos, Grã-Bretanha, França e Alemanha, realizada em Bonn em 6 de março de 1991, cujo tema era a segurança na Europa Central e Oriental.
Segundo o documento, o diretor político do Ministério das Relações Exteriores da Alemanha, Jurgen Hrobog, argumentou da seguinte forma: “Deixamos claro nas negociações 2 mais 4 (sobre a unificação da Alemanha, com a participação da RFA e da RDA, bem como os EUA, URSS, Grã-Bretanha e França) que não estamos expandindo a OTAN para além do Elba (o texto esclarece ainda que não estamos falando sobre o Elba, mas sobre o rio Oder). Portanto, não podemos oferecer à Polônia e aos demais a adesão à Otan”.
De acordo com Jurgen Hrobog, esta posição foi acordada com o chanceler federal Helmut Kohl e o ministro das Relações Exteriores Hans-Dietrich Genscher.

O representante dos EUA, Raymond Seitz, diz o documento, concordou: “Deixamos claro para a União Soviética – nas negociações de 2 mais 4, bem como em outras negociações – que não pretendemos nos beneficiar da retirada das tropas soviéticas do leste Europa … A Otan não deve se expandir para o leste, nem formalmente nem informalmente”.
Acrescenta o documento recém encontrado que os participantes da reunião concordaram em fortalecer a estabilidade e a segurança da Europa Central e Oriental por meio de acordos bilaterais com os países da região e no âmbito da Conferência sobre Segurança e Cooperação na Europa (CSCE).
“NEM UM CENTÍMETRO PARA LESTE”
Assim – e essa não é a única prova de que houve tal promessa de não expansão a leste da fronteira alemã – fica reafirmada o embasamento russo em sua exigência de que cesse a expansão da Otan até suas fronteiras, de que a crise na Ucrânia é no momento a ferida mais aberta.
Numa coletiva anual de imprensa em dezembro de 2021, Putin expôs toda a verdade que Washington e a Otan tentam abafar. “‘Nem um centímetro a leste’, nos disseram nos anos 90. E daí? Eles trapacearam. Eles apenas nos enganaram descaradamente: cinco ondas de expansão da OTAN e agora, agora sistemas de ataque estão aparecendo na Polônia e na Romênia”.
Como Putin assinalou, a Rússia se opôs repetidamente à expansão da Otan para leste, referindo-se às promessas relevantes dos países ocidentais. “E eles nos dizem: ‘Onde está escrito em um pedaço de papel? Não há? Bem, isso é tudo, vá embora, não nos importamos com suas preocupações.’ E assim de ano para ano. Cada vez que tentávamos impedir alguma coisa, expressávamos preocupações, ‘não, você que se vá com suas preocupações, faremos o que acharmos necessário”, acrescentou.
POODLE DA VEZ
Em entrevista ao Der Spiegel o secretário-geral da Otan, cargo que, na real, é apenas de porta-voz já que as decisões vêm prontas de Washington, Jens Stoltenberg, asseverou que “nunca houve tal promessa, nunca houve um acordo tão nos bastidores, simplesmente não é verdade”.
Em sua performance na Davos da Segurança, em Munique, deste fim de semana, Stoltenberg ainda ameaçou Moscou que, se quiser “menos Otan” nas suas fronteiras, vai acabar obtendo “mais Otan”. Declaração que, segundo atentos observadores da cena internacional, deve fazê-lo merecedor do troféu ‘poodle da década’, que já pertenceu a Sir Tony Blair.