Multidão participou do adeus ao secretário-geral da Organização pela Libertação da Palestina (OLP) na milenar Jericó
Além da multidão que participou do adeus a Saeb Erekat, secretário-geral da Organização de Libertação da Palestina (OLP) e negociador-chefe palestino desde os acordos de Oslo firmados pelo líder histórico palestino, Yasser Arafat e o primeiro-ministro israelense – assassinado em Tel Aviv pouco depois do início da retirada israelense dos territórios palestinos ocupados – Itzhaq Rabin, líderes políticos dos mais diversos países incluindo o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres e o ministro do Exterior do Vaticano, arcebispo Paul Gallagher, dirigentes da Rússia, Turquia, Inglaterra, Alemanha, bloco socialista-democrata do Parlamento Europeu, do Egito, da Jordânia e do Líbano, além do presidente da Palestina Mahmud Abbas.
“Hoje nós lamentamos a perda de um colega querido e um patriota palestino; alguém que amou a vida e lutou duro para assegurar uma vida de liberdade para si e seu povo. Pessoalmente, eu choro a perda de um amigo e um colega com quem eu trabalhei desde os anos 1980 na busca do inegociável direito a uma vida com dignidade, justiça, liberdade, livre da brutalidade da dominação israelense e da ocupação militar”, afirmou a líder da delegação palestina aos primeiros encontros com a delegação israelense em Madri, diplomata e deputada Hanan Ashrawi, logo após o falecimento de Erekat por complicações devido a ter contraído o Covid-19.
“O Dr. Saeb dedicou a vida a serviço da causa do povo palestino. Ele tomou parte em muitos marcos históricos ao longo da luta de nosso povo povo por libertação. Dr. Erekat será lembrado por sua infatigável dedicação e compromisso em alcançar a paz e a liberdade para o povo palestino. Seus colegas, o povo palestino e muitos em todo o mundo sentirão sua falta”, acrescentou a líder palestina.
Conforme destacou o secretário-geral da ONU, foi uma grande perda para os amantes da paz e os que almejam uma justa solução do conflito que flagela a região há anos através da justiça e do reconhecimento dos justos direitos do povo palestino: “Estou profundamente entristecido com a morte do Dr. Saeb Erekat…Sou grato por ter conhecido o Dr. Erekat por ter podido chamá-lo de meu amigo. Ele era dedicado à busca da paz, da justiça, da dignidade e dos direitos legítimos dos palestinos à autodeterminação, soberania e Estado. Agora é hora de continuarmos seu trabalho crucial e pôr fim ao conflito que afetou tragicamente a vida de tantos. Eu reitero meu próprio compromisso assim como o da ONU em apoiar todos os esforços para trazer as partes a se encontrarem para que se alcance a esperada há tão longo tempo, Solução dos Dois Estados com Israel e Palestina vivendo lado a lado em paz e segurança”.
Da nossa parte, consideramos a melhor e mais justa homenagem a Saeb Erekat dar a palavra a ele. Por isso traduzimos e publicamos uma de suas últimas colunas, entre as mais esclarecedoras sob o desastre dos governos Trump e Netanyahu já publicadas pelo jornal israelense Haaretz, de quem era colaborador.
Vamos a sua coluna datada de 11 de fevereiro de 2020 intitulada
Hoje a palestina lança um processo de paz verdadeiro, não a vergonha ignorante e arrogante de Trump
SAEB EREKAT*
Hoje, na ONU, o presidente palestino Mahmud Abbas dirá: ‘Deem à paz, não ao apartheid, uma chance. E oferecerá uma proposta séria para que se alcance uma paz justa e duradoura no Oriente Médio
Uma visão de paz nunca pode significar a legitimação de violações da lei internacional. O plano de Donald Trump para o Oriente Médio denominado ”Paz para Prosperidade” revelado na Casa Branca, fez exatamente isso.
Uma visão de paz nunca pode significar a legitimação de violações da lei internacional. O plano de Donald Trump para o Oriente Médio denominado ”Paz para Prosperidade” revelado na Casa Branca, fez exatamente isso
É um plano anexacionista que define muito bem a cegueira política, arrogância e ignorância deste governo. Enquanto, tanto Israel quanto o governo Trump, tentam confundir o mundo com promessas de um ‘futuro melhor’ o fato que permanece é a sinergia ideológica entre os dois direitistas que compartilham uma única visão: apartheid.
O plano de anexação é uma coleção de posições israelenses, muitas das quais apresentadas por escrito pelos israelenses em negociações anteriores. É um plano negociado entre os colonos israelenses e os representantes norte-americanos que são infames apoiadores da empresa ilegal de colonização israelense. Dá uma trilha ao apartheid encarnado no mapa por eles apresentado, nada a ver com ‘dois Estados’.
Aaron David Miller, um dos mais experientes e antes envolvido no processo de paz, declarou ter dito a Jared Kushner [genro que Trump indicou para comandar o processo] a não agir como ‘advogado de Israel’ se quisesse ter sucesso. Evidentemente, Kushner foi além disso – tornou-se advogado das políticas israelenses de anexação e colonização.
Argumentando que anexação e colonização, manifestamente ilegais sob a lei internacional, deveriam se normalizadas como resultado de seu plano, traz perigosos precedentes, dando a qualquer potência o direito de impor qualquer realidade que julgar necessária, mesmo violando a lei internacional. Quem quer que assine o plano de Trump, ou dos poucos que sugerem que este documento deve ser considerado como base para qualquer engajamento em negociações, estão simplesmente dizendo ao povo palestino que aceitem crimes de guerra como base para qualquer negociação.
Deixamos claro, não se trata aqui de rejeitar uma proposta de paz. Trata-se de dizer não a uma tentativa de legitimar o roubo, para se dizer o mínimo, como instrumento para as relações internacionais.
A lógica distorcida da equipe de Trump sugere que alcançar a paz significa a acomodação de todos os desejos dos extremistas israelenses. O plano endossa inteiramente a perpetuação da ocupação colonial da Palestina por Israel e a fragmentação de suas terras. Garante o controle total de Israel sobre Jerusalém e ‘legitima’ seus assentamentos, a transferência de população para território palestino ocupado e nega os direitos dos refugiados palestinos.
Deixamos claro, não se trata aqui de rejeitar uma proposta de paz. Trata-se de dizer não a uma tentativa de legitimar o roubo, para se dizer o mínimo, como instrumento para as relações internacionais
Além disso tudo, a equipe de Trump espera que o povo da Palestina aprecie isso, esse presente sem precedentes. Em mais de uma ocasião, Mr. Kushner declarou que estava certo de que os palestinos estariam, na verdade, ‘surpresos’ em como o plano era bom para eles. O que isso mostra? Uma combinação de ignorância, cumplicidade e desrespeito.
Hoje, o presidente Mahmud Abbas estará se dirigindo ao Conselho de Segurança da ONU, o corpo designado à preservação da paz e segurança mundiais, com uma mensagem urgente: “Deem à paz, não ao apartheid uma chance”.
Nossa visão de paz é baseada no fim da ocupação israelense em direção ao atingimento de um Estado da Palestina independente e soberano. Esta é uma concessão histórica para a paz que fizemos em 1988, ao aceitarmos o controle de Israel sobre 78% da Palestina histórica.
Chamamos a uma Palestina livre que coexista em paz, segurança e prosperidade com o restante da região. Todas as questões permanentes devem ser resolvidas de maneira justa que honre a lei internacional e as relevantes resoluções da ONU.
A iniciativa árabe será o ponto de partida para posteriores relações diplomáticas e de comércio entre todas as partes.
Vamos garantir que a comunidade internacional está consciente de o que, tanto o que o governo de Israel, como o de Trump estão fazendo não é suficiente.
Salvar as perspectivas de paz exigem engajamento em negociações substanciais baseadas nos termos acordados internacionalmente como referência para o Processo de Paz no Oriente Médio.
Nossa proposta inclui o estabelecimento de um grupo de apoio constituído por países amantes da paz para facilitar um processo de paz significativo. Um grupo que trabalhe para a implementação da lei internacional, ao invés de facilitarem um processo de anexação criado para sabotar a sua implementação.
Enquanto endossa as negociações diretas baseadas na lei internacional e nas resoluções da ONU, a Liga Árabe e a Organização para a Cooperação Islâmica já disseram não a um plano que nem apoia um Estado da Palestina soberano, com Jerusalém Leste como sua capital, nem respeita o status quo do acordo histórico preservando nos sítios sagrados na cidade. A União Africana e a União Europeia já declararam que o plano de Trump contradita a lei internacional.
Hoje, a Palestina oferece ao mundo uma proposta séria para que se alcance uma paz justa e duradora. Conclamamos a comunidade internacional a garantir que uma ordem mundial baseada no respeito aos demais seja o único caminho para todos seguirem adiante. Quando o mundo implementar os princípios fundamentais da lei e da justiça, a Palestina não será a única exceção.
*Dr. Saeb Erekat era secretário-geral da OLP e negociador chefe da Palestina