O temporal que provocou deslizamentos e alagamentos, destruindo parcialmente Petrópolis, na Região Serrana do Rio de Janeiro, deixou pelo menos 117 mortos. Até o momento, 116 registros de desaparecimento foram feitos.
Com imóveis destruídos, postes caídos, carros virados e lama para todos os lados, o município está tomado por 400 Bombeiros que realizam buscas pelos desaparecidos e prestam socorro aos desalojados que tem dificuldades de sair de suas casas, os sentimentos da população petropolitana são de luto e tristeza.
“A situação é desoladora, estamos de luto pela cidade. Moro no bairro Samambaia, e da minha casa até o Nogueira, vi sujeira, lixo, carros virados, caminhões quebrados, poste caído, lama para tudo que é lado. A região mais problemática foi o Alto da Serra. A Rua Teresa, o conhecido polo de roupas, acabou. Por sorte aqui no meu bairro não tivemos grandes problemas”, descreveu a professora Luiza Tavares.
Dos 101 corpos que estão no Instituto Médico Legal (IML), 65 são de mulheres e 36 de homens. Desses, 13 são menores. Ao todo, 33 corpos foram identificados.
“A situação está calamitosa. É muito difícil passarmos por isso novamente, depois de 11 anos. A cidade chora seus mortos e lamenta demais o que aconteceu. São muitos jovens desaparecidos, vidas que podem ter sido interrompidos por essa fatalidade. Estava no hospital acompanhando meu pai e da janela pude ver uma barreira cair e atingir o veículo de um médico que estava no estacionamento”, lamentou Michel Grillo, que relembrou a forte tempestade que atingiu os municípios de Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo, em janeiro de 2011, e deixou mais de 900 mortos.
As chuvas deixaram diversas regiões da cidade sem energia, água e sinal de celular. Moradores contaram ainda que o serviço de transporte público também foi afetado.
“Fiquei preso aqui no hospital e ainda estou sem poder tomar banho, porque o hospital está sem água, ou me locomover, vou dormir aqui mais um dia porque não há meio de transporte para os bairros. O sinal de internet está péssimo por conta da tempestade e tem bairros totalmente sem energia. É muito triste a situação, mas agradeço por estar vivo”, desabafou Grillo.
A psicóloga Anna Nascimento descreveu a imagem que viu da cidade, na última quarta-feira (16), como um cenário de guerra, onde podia ser visto corpos na rua.
“É assustador, a cidade está bem abalada, um sentimento de total tristeza. Parece um cenário pós-guerra. Muitas pessoas ficaram em estado de choque porque tinham corpos na rua depois que a água abaixou. Tem muitas pessoas ainda desaparecidas. Está todo mundo muito aflito, é lama pura, comerciantes perderam seus estoques, entrou água em várias casas e lojas, as pessoas perderam muita coisa. É realmente uma situação desesperadora”, narrou.
Mas no meio de tanta tragédia, também há solidariedade. “Está tendo uma mobilização geral para ajudar, muitos pontos de doação e arrecadação, ajudas financeiras, acolhimento psicológico”, falou a psicóloga.
DESESPERO
Entre tantos relatos de vítimas dos desabamentos causados pelo forte temporal, uma imagem chamou a atenção de todos que acompanhavam a tragédia.
Dona Gizelia de Oliveira Carminante, moradora do Morro da Oficina, cavava desesperadamente os escombros, suja de lama, em busca do corpo da filha que ela afirmava que estava soterrada no local.
“Na casa estava minha filha, a tia dela, e uma nenenzinha, filha da minha filha, que morava embaixo”, afirmou Gizelia à TV Globo. Que angustiada por ajuda exclamava: “Tem que mexer, mas ninguém tá mexendo. É uma bebê de 1 ano sem respirar debaixo dessa lama”.
O desabafo que emocionou o Brasil teve a dor da perda confirmada pela própria D. Gizelia, na tarde da última terça (15), por meio de suas redes sociais, ao informar que após horas de buscas a sua filha Maria Eduarda, “Duda”, 17 anos, estava morta. Sendo mais uma das vítimas fatais da tragédia que deixou rastro de destruição em Petrópolis.
Em seu perfil no Facebook, ela informou: “Com meu coração despedaçado comunico o falecimento da minha filha”.
“Minha filha era a coisa mais linda que tem no mundo”, disse. Gizelia contou que Duda foi encontrada no sofá abraçada à madrinha dela, Tânia, e sua neta, a bebezinha Helena, de 1 ano.
Maria das Graças de Paiva Destro era integrante da diretoria do Projeto do Morro, que atende a cerca de 500 crianças em Petrópolis. Ela era conhecida na localidade como “Dona Fia”, morava ao lado da sede do projeto e, segundo a família, ficou soterrada.
O prédio do projeto ficava no bairro Alto da Serra, na região do Morro da Oficina, onde ocorreu um desmoronamento. A estrutura de quatro andares desapareceu completamente.
A adolescente Maria Clara Martins de Castro Souza, de 16 anos, moradora de Volta Redonda (RJ), tinha ido visitar a avó, que mora no bairro Castelânea, uma das localidades mais afetadas. Ela estava em casa sozinha quando o imóvel foi atingindo por um deslizamento de terra. Depois que a residência desabou, Maria foi levada pela enxurrada. Os colegas da escola onde ela estudava organizam uma homenagem para ela na semana que vem.
Dois ônibus do sistema de transporte da cidade foram arrastados pela força da água no temporal de terça (15). Não há informações de quantas pessoas estavam nos ônibus, de acordo com o Sindicato das Empresas de Transporte Rodoviário de Petrópolis.
Os ônibus foram arrastados e levados para dentro de um rio, segundo o Setranspetro. Quando a água baixou e as equipes de resgate chegaram ao local, não havia ninguém nos veículos.
Um morador de Petrópolis busca o corpo do irmão, que tem deficiência física e que, segundo ele, morreu dentro de um ônibus arrastado pela chuva na Rua Coronel Veiga. Felipe contou que Rafael, de 42 anos, mandou mensagem para a mulher pelo celular de uma passageira durante o temporal. No entanto, Rafael acabou perdendo contato.
“Mandou mensagem que o telefone dele tinha acabado a bateria, que o rio estava subindo, estava todo alagado. Mas, como ele mora nas imediações, ele já estava acostumado com isso. A água subiu de maneira muito forte e algumas pessoas conseguiram sair. Ele é deficiente físico e não conseguiu sair do ônibus”, disse Felipe.
SOLIDARIEDADE
As autoridades ainda não têm dimensão do tamanho do estrago, mas dezenas de famílias tiveram que abandonar suas casas ou perderam tudo na chuva. O governador Claudio Castro informou que a prioridade neste momento é oferecer suporte financeiro, moradia e assistência para as cerca de 400 pessoas que ficaram desabrigadas ou desalojadas após a forte chuva.
O Governo espera completar o cadastro das pessoas em situação vulnerável para que possam receber um cartão para a compra de imóveis e demais necessidades até semana que vem.
“Estamos fazendo um trabalho muito sério. Sabemos da dificuldade financeira do município, o governo vai entrar com o que for necessário aqui”, afirmou Castro.
A Prefeitura abriu todos os pontos de apoio para o acolhimento da população de área de risco.
“Em geral, essas estruturas funcionam em escolas e neste momento, há atendimentos nas localidades do Centro, São Sebastião, Vila Felipe, Alto Independência, Bingen, Dr. Thouzete e Chácara Flora. Ao todo, 184 pessoas estão recebendo suporte da prefeitura, que direcionou para as unidades profissionais da Saúde, Educação, Agentes Comunitários, além da Defesa Civil”, disse o município.