Tribunal de Contas da União concluiu que o governo “não vem exercendo a contento” as atribuições de planejador central para elaborar ações de contenção da Covid-19. Assim, sugere ao Congresso iniciativas legislativas para mitigar crise sanitária e na saúde
Diante do que classifica como “omissão” e “hesitação” do governo do presidente Jair Bolsonaro, em assumir protagonismo no combate à pandemia da Covid-19, o TCU (Tribunal de Contas da União) sugeriu que o Congresso, por meio das comissões temáticas em funcionamento de ambas as casas do Parlamento — Câmara e Senado —, debata medidas legislativas que possam melhorar o planejamento para futuras crises.
Ao avaliar o trabalho de núcleos criados para planejar respostas e mitigar efeitos da pandemia, o tribunal concluiu que o governo “não vem exercendo a contento” as atribuições que lhes cabe de planejador central para elaborar cenários, identificar riscos e estabelecer ações.
As alegações estão em acórdão de 30 de junho, em processo relatado pelo ministro Vital do Rêgo. Trata-se de mais uma decisão da Corte de Contas que aponta para erros da gestão Bolsonaro no enfrentamento ao novo coronavírus.
A CPI no Senado, instalada em 27 de abril, e prorrogada para mais 90 dias de investigações, em 14 de julho, trabalha exatamente nesse contexto em que o governo, sob a liderança de Bolsonaro, se omitiu em agir contra a pandemia de Covid-19.
Parece estar claro, a partir do que a CPI conseguiu apurar e investigar até o momento, que o governo optou e escolheu caminhos absolutamente fora dos padrões do que orientou a OMS (Organização Mundial da Saúde), o que resultou, em números de hoje, em 551.578 mortes de brasileiras e brasileiros.
Segundo o epidemiologista Pedro Hallal, em depoimento à CPI, em 24 de junho, o “Brasil tem 2,7% da população mundial e concentra quase 13% das mortes no mundo” por Covid-19. Em 23 de junho, 33% das mortes mundiais por Covid-19 aconteceram no Brasil, ainda segundo Hallal, que é professor da UFPel (Universidade Federal de Pelotas).
“Quatro de cada cinco mortes teriam sido evitadas se o Brasil estivesse na média mundial de óbitos pela Covid-19, ou seja, 400 mil mortes não teriam ocorrido. No país, 2.345 pessoas morreram pelo coronavírus para cada 1 milhão de habitantes; média mundial é de 494 pessoas”, segundo Estudo Epicovid coordenado por Hallal.
“HESITAÇÃO DO GOVERNO CENTRAL EM ASSUMIR O PROTAGONISMO”
“O que se tem observado é uma certa hesitação do governo central em assumir o protagonismo que dele é esperado na condução das ações de combate a essa grave crise de saúde, de sorte a bem coordenar a adoção de ações nas diversas áreas de atuação estatal e em conjunto com os demais entes federados”, afirmou o ministro do TCU.
O relator destacou ainda que o fenômeno é novo e carece de informações anteriores que possam nortear os gestores. O argumento foi apresentado pelo governo ao admitir não haver diretrizes específicas para a segunda onda de contágio.
No entanto, Vital do Rêgo ressaltou que essa não pode ser justificativa para abrir mão do planejamento: “Não se está diante de uma situação que inviabilize o processo de planejamento, vez que, em temas ainda desconhecidos, como é o caso da pandemia de Covid-19 e de suas consequências, pode o gestor público servir-se da elaboração de cenários possíveis e da avaliação e gestão de riscos”.
GESTÃO DE CRISE DA COVID-19
O processo avaliou a governança do Comitê de Crise do Centro de Coordenação de Operações do Comitê de Crise para Supervisão e Monitoramento dos Impactos da Covid-19.
Os núcleos são ligados à Casa Civil. Foram criados no ano passado e ficaram sob a responsabilidade de Braga Netto, titular da pasta. Integrantes da CPI da Covid-19 no Senado planejam investigar a atuação de Netto após o recesso parlamentar.
Ao prestar informações ao TCU sobre monitoramento de leitos disponíveis nos estados, o Comitê de Crise alegou que se trata de atribuição do Ministério da Saúde. O tribunal concordou, mas alertou para a falta de articulação entre os órgãos.
INFORMAÇÕES PARA PERMITIR ATUAÇÃO DO GOVERNO
“Era de se esperar que tanto o Comitê, que dá suporte operacional ao Comitê de Crise, quanto o próprio Comitê, criado justamente para supervisão e monitoramento dos impactos da Covid-19, tivessem acesso e mantivessem registro dessas informações para permitir sua atuação”, destacou Vital do Rêgo.
Na votação, os ministros do TCU concordaram em enviar as conclusões à CPI e demais comissões do Congresso para “subsidiar eventual debate de medida legislativa acerca do planejamento governamental para o futuro enfrentamento de crises dessa natureza”.
Procurado para comentar o acórdão, o Planalto não se manifestou.
Com informações da Agência Estado