MAMEDE SAID (*)
Março de 2020, dia 31: 56 anos do golpe de 1964. Contra um governo democrático que desenvolvia um projeto nacionalista, bem sintetizado no famoso discurso de João Goulart na Central do Brasil, em 13 de março de 1964, no qual defendeu as chamadas “reformas de base e de estrutura”. Um governo que foi vítima de uma conspiração civil-militar porque verdadeiramente propunha mexer nas estruturas viciadas do poder.
Jango falava em impor limites à remessa de lucros para o exterior; falava em reforma agrária autêntica, reforma tributária, reforma universitária, reforma eleitoral ampla e revisão constitucional. Como demonstrava vigor e determinação para pôr em prática as medidas anunciadas, foi apeado do poder pelas forças reacionárias que se opunham à emancipação do país.
Em 31 de março de 2020, temos na Presidência um homem que não apenas nega a existência da ditadura, como enaltece o que houve de pior no regime instaurado em 1964: a tortura, a censura, o fechamento do Congresso Nacional, a afronta às instituições e às práticas democráticas.
A registrar, o isolamento cada vez maior a que Jair Bolsonaro se submete, com a veemente condenação – que parte dos mais variados setores da vida nacional – à torpeza com que trata a grave crise da pandemia que ocupa a atenção de toda a comunidade internacional.
Com suas atitudes irresponsáveis no enfrentamento do Covid-19, Bolsonaro é, hoje, uma ameaça não apenas à proteção aos brasileiros, mas também aos esforços que a OMS, a ONU e os líderes mundiais fazem para conter a pandemia. Se um país com 200 milhões de habitantes se mostrar incapaz de enfrentar o Covid-19 e se tornar um foco disseminador da doença, isso, evidentemente, passará a ser um problema de magnitude mundial.
A quarentena a que a maior parte da população mundial se submete só renderá frutos se um país continental como o nosso (em tamanho e em população) agir alinhado com as orientações emanadas dos cientistas e dos especialistas em saúde que se dedicam a derrotar o vírus desafiador.
INTERDIÇÃO
Para alívio do país, torna-se cada vez mais crescente o isolamento de Jair Bolsonaro por conta de seu menosprezo no enfrentamento da pandemia do Covid-19. As reações partem do Legislativo, do Judiciário, dos governadores, dos prefeitos, da imprensa e mesmo de ministros influentes do Governo, como revelam os jornais de hoje.
Ao isolamento no país soma-se o descrédito que Bolsonaro angaria na comunidade internacional, cujos líderes veem nele uma ameaça ao esforço que os países travam para frear a disseminação do vírus. A notícia mais curiosa veio do Twitter, do Facebook e do Instagram, que decidiram excluir vídeos de Bolsonaro por considerar que violam os “padrões de comunidade, que não permitem desinformação que possa causar reais às pessoas”.
Seria cômico se não fosse trágico: postagens de um chefe de Estado são apagadas das redes sociais por propagar mentiras e falsidades.
Vai ver têm razão aqueles que pedem a “interdição” de Bolsonaro. Afinal, mais que a renúncia ou o impeachment, o presidente merece ser analisado por seu destempero, sua insensatez e falta de discernimento. À luz da psicopatologia, aquele campo de pesquisa ao qual se dedicam os psicanalistas, os psiquiatras e os psicólogos clínicos.
(*) Diretor da Faculdade de Direito da UnB