Tampa se soltou durante a decolagem em Denver e bateu na asa. Avião levava 135 passageiros e cinco tripulantes
Um voo da Southwest Airlines precisou fazer um pouso de emergência retornando ao Aeroporto Internacional de Denver no domingo (7), após a tampa do motor de um Boeing 737-800 cair durante a decolagem e atingir a asa, disse a Administração Federal de Aviação (FAA na sigla em inglês).
Desde janeiro, uma série de incidentes com aviões da Boeing reacendeu a crise na gigante norte-americana da aviação, em meio a denúncias sobre o controle de qualidade, levando à reabertura de investigação pela FAA e pelo Congresso dos EUA mais queda das ações na Bolsa, tendo como desdobramento a demissão imediata do chefe do setor de aeronaves civis da corporação, afastamento do executivo-chefe Dave Calhoun até o final do ano e novas juras de consertar os malfeitos.
O voo 3695 da Southwest Airlines tinha como destino Houston, mas retornou ao aeroporto de Denver por volta das 8 horas e 15 minutos, depois que a tripulação relatou que a capota do motor caiu.
O avião, que transportava 135 passageiros e cinco tripulantes, foi rebocado de volta ao portão. A FAA abriu uma investigação do caso.
Em comunicado, a Southwest Airlines disse que suas equipes de manutenção estavam revisando a aeronave. A empresa acrescentou que os passageiros embarcaram em outro avião e chegaram ao aeroporto William P. Hobby, em Houston, com aproximadamente 3 horas de atraso.
Um vídeo feito de uma janela perto da asa do avião, postado nas redes sociais, mostrou uma capota azul soltando do motor e girando com o vento enquanto o avião se movia pela pista antes que grande parte dela finalmente caísse.
“Vamos declarar uma emergência para Southwest 3695 e gostaríamos de um retorno imediato. Temos um pedaço da capota do motor pendurado”, avisou a tripulação ao controlador de tráfego aéreo.
Vídeo filmado por um passageiro mostra a cobertura se soltando e parecendo uma folha de papel:
DE NOVO E DE NOVO
O incidente deste domingo foi precedido por outros episódios, iniciados pela emergência no dia 5 de janeiro no voo 1282 da Alaska Airlines, quando um Boeing 737 Max 9, perdeu parte de sua fuselagem (estrutura que abriga a cabine de passageiros), uma porta, quando voava a 4.900 metros de altura.
“Deixou um buraco no avião do tamanho de uma geladeira”, segundo um passageiro. “Foi realmente brutal. Mal alcançamos a altitude e o painel da janela se soltou”, testemunhou o passageiro.
Inspeções de emergência realizadas pela Alaska Airlines e pela United encontraram peças soltas em várias aeronaves. A United Airlines revelou que múltiplos parafusos soltos foram encontrados em várias aeronaves 737 Max 9.
Os incidentes expuseram que a decadência da Boeing, que ficara patente em 2018 com a queda de dois Boeing 737 Max 8 em seis meses por erro de projeto, que causaram 346 mortos, e levaram à suspensão da operação do modelo no mundo inteiro por 20 meses.
Agora estão no centro dos debates os problemas com o controle de qualidade, em especial com a fornecedora de fuselagem Spirit AeroSystens, aliás, um braço da própria Boeing que foi vendido para terceiros.
A queda da porta do 737 Max 9 da Alaska Airlines levou à suspensão, por três semanas, dos voos de 171 jatos que têm o mesmo “plugue de porta” que se soltou. Na verdade, uma terceira porta que é desativada na configuração mais espaçosa de poltronas. O aparelho estava em serviço há apenas oito semanas.
REPUTAÇÃO ARRUINADA
Tamanho foi o escândalo, que Calhoun reconheceu que houve um “escape de qualidade” que fez com que o Max 9 que estava no ar tivesse parte da fuselagem solta.
Em suma, a reputação da Boeing está em ruína. Relatório do Congresso dos EUA de setembro de 2020 atribuiu o colapso dos 737 Max 8 “à pressão competitiva, às falhas de design e uma cultura de encobrimento” por parte do fabricante de aviões e uma regulação da FAA “fundamentalmente falha” – a Boeing, na prática, ‘fiscalizava’ a si mesma.
Para manter a fundamentalmente a mesma estrutura do avião, com um motor maior, a Boeing instalou um software que deveria corrigir o problema, mas que em determinadas circunstâncias impelia o avião a mergulhar de cabeça, à revelia do piloto.
Analistas acusam a Boeing de estar mais interessada nos lucros, do que na engenharia – e segurança – propriamente dita.
Em abril do ano passado, já na evolução do modelo para o 737 Max 9, novo problema de software chamou a atenção. Um relatório divulgado pelos portais especializados em aviação Airfinance Journal e Leeham News revelou que o processo de configuração dos computadores da aeronave apresentou defeitos, especialmente a operação conhecida como Option Selection Software (OSS).
Um mês antes, a FAA havia determinado às companhias aéreas que inspecionassem seus modelos Max para investigar um possível parafuso solto nos sistemas de controle do leme. De acordo com a Boeing, sua fornecedora Spirit AeroSystems havia utilizado um processo “não convencional” ao montar parte da fuselagem dos aviões, gerando a possibilidade dos modelos “não cumprirem certas especificações” dos reguladores do setor.
Segundo o Wall Street Journal, o Departamento de Justiça deu início a uma investigação criminal sobre o incidente com o avião da Alaska Airlines, após a Boeing informar ao Congresso que não conseguiu encontrar um registro relevante detalhando seu trabalho no painel que se soltou da aeronave.
Como desgraça pouca é bobagem, outros modelos de aeronaves civis da Boeing também apresentaram problemas. Em janeiro, um Boeing 737-800 operado pela companhia aérea japonesa All Nippon Airways teve que retornar à pista de decolagem no Japão após uma rachadura ser descoberta na janela da cabine do piloto em pleno voo. Depois, foi a vez de um Boeing 787 da Latam a perder altitude abruptamente durante um voo entre Sidney, na Austrália, e Auckland, na Nova Zelândia.
REPROVADA EM 1 DE CADA 3 AUDITORIAS
Em março, o The New York Times revelou que das 89 auditorias feitas pela FAA no processo de produção do Boeing 737 MAX, houve 33 reprovações, sendo que no caso da Spirit AeroSystems, de 13 auditorias, 7 foram reprovadas.
Na crise de 2019, a Boeing teve sua participação de 50%-50% com a Airbus europeia no mercado de jatos de passageiros corroída. Em 2023, a Boeing terminou o ano em segundo lugar em entregas de aeronaves, o que ocorre pelo quinto ano consecutivo.
A Airbus registrou quase 2.100 novos pedidos líquidos em 2023 (61%), enquanto a Boeing registrou 1.314 (39%) novos pedidos líquidos. Em 2022, o prejuízo da Boeing totalizou 5,1 bilhões de dólares — foi o quarto ano consecutivo em que a empresa fechou o balanço no vermelho.