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“Palco vazio,/ janela fechada/ Cenário sem brilho…”, a letra da canção “Luz da Noite”, uma das poucas composições de Maria Bethânia, feita em parceria com o irmão Caetano, ilustra o dia de hoje: esta quinta-feira, 6 de julho, em que o Teatro perdeu um dos seus grandes nomes, o dramaturgo José Celso Martinez Corrêa, ou, simplesmente, Zé Celso.
Força criativa, provocativo, verdadeira resistência na arte, na cultura, na luta contra a ditadura, a falsa moral, e, mais recentemente, ao mar de imbecilidades que inundou o Brasil e quase o sufoca, o diretor, autor e ator Zé Celso foi, nas palavras de Fernanda Montenegro, uma “força sagrada” do Teatro e da vida.
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Profundo conhecedor do fazer teatral, de seus signos, de luminares como Bertolt Brecht, criado e criador do mais significativo momento do teatro político brasileiro, quando fundou, com colegas do Centro Acadêmico da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da USP, o Teatro Oficina, no mesmo período que surgiam, na década de 60, o Arena, também em SP, e o Opinião, no Rio de Janeiro, Zé Celso instigava as plateias, levava os atores ao limite das experimentações e produzia espetáculos de onde ninguém saía impune.
Muitas vezes, a cena, carregada de críticas ao sistema, de denúncias e resistência política ao atraso e sempre em defesa da democracia e da liberdade, chegava quase ao limite da loucura, diluindo assim, embora com extrema força e beleza, as próprias mensagens que queria passar, como se tudo se transformasse em uma enorme anarquia e alegoria.
Mas foram seis décadas de palco, seis décadas à frente do mesmo Teatro Oficina e da mesma companhia, cuja história, marcada desde sua criação pela resistência ao que há de podre na sociedade e em louvor à criatividade, à beleza e à profundidade da arte, ao Humano e ao povo brasileiro, os transformaram, palco e artista, criador e criatura, em uns dos mais importantes patrimônios culturais do país, como é considerado pela classe artística, pelo público e até mesmo pelo Estado.
Zé Celso escreveu seu primeiro texto teatral em 1958 e, desde então, decidiu se dedicar ao teatro.
Em 64, com a peça “Andorra”, a influência de Brecht já era visível em seu trabalho. Foi quando resolveu viajar à Europa para se aprofundar no dramaturgo alemão. Ao voltar, encenou com o Oficina o texto de Brecht “Galileu Galilei”, entre outros do autor.
O grupo teve sua sede incendiada em 1966. Após uma campanha popular para a reconstrução do teatro, o Oficina ressurgiu, em 1967, com “O Rei da Vela”, escrita em 1933 por Oswald de Andrade, mas com uma montagem inovadora, com referências no tropicalismo, no modernismo e no engajamento político, que marcou a história do teatro no Brasil.
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Outra montagem de Zé Celso que marcaria a dramaturgia brasileira foi “Roda Viva”. Escrita por Chico Buarque, a peça foi exibida no Rio de Janeiro em 1968, um dos períodos de maior acirramento da censura no país.
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Assim como os outros integrantes do Oficina, Zé Celso foi perseguido pela ditadura, e foi preso e torturado por 20 dias. Ao deixar a prisão, se exilou em Portugal e retornou em 1978. A partir daí, foram muitas pesquisas e montagens, entre elas a peça “Ham-let”, com a qual venceu o prêmio Shell de melhor diretor. Ao longo da carreira ganhou vários outros prêmios, como o Troféu APCA, o Troféu APCT e no Festival de Gramado.
Como disse a ministra da Cultura, Margareth Menezes, a cultura perdeu hoje “grande parte de seu brilho e irreverência”.
ANA LÚCIA