
Ministro do STF advertiu Câmara e a decisão sobre o caso. Ele propôs que ação contra Alexandre Ramagem seja dividida e instaurado novo processo tratando dos crimes cometidos após a diplomação
O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Flávio Dino, votou na sexta-feira (9) contra ação da Câmara dos Deputados que protegia o deputado bolsonarista Alexandre Ramagem (PL-RJ) no inquérito do golpe de Estado.
Ele seguiu o voto do relator Alexandre de Moraes e propôs o desmembramento da ação em 2 processos distintos — o primeiro se referiria aos 3 crimes que Ramagem cometeu antes de se tornar deputado; o segundo nasceria suspenso e diria respeito aos crimes que ocorreram após a diplomação do deputado bolsonarista.
“Somente em tiranias um ramo estatal pode concentrar em suas mãos o poder de aprovar leis, elaborar o Orçamento e executá-lo diretamente, efetuar julgamentos de índole criminal ou paralisá-los arbitrariamente”
Com o voto de Flávio Dino, a Primeira Turma do STF alcançou maioria para derrubar parcialmente a resolução da Câmara dos Deputados que blindaria Ramagem e outros réus no inquérito do golpe — o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) entre eles.
Moraes votou para manter a ação contra Ramagem por 3 crimes imputados a ele antes da diplomação como deputado federal. Os ministros Cristiano Zanin, Dino, Luiz Fux e Cármen Lúcia, que depositou o voto dela, neste sábado (10), o acompanharam no plenário virtual.
RECADO DE DINO À CÂMARA
Dino ainda criticou a Câmara dos Deputados no voto apresentado por ele. O ministro advertiu para os poderes concentrados no Legislativo sobre a elaboração de leis, a execução do Orçamento e a paralisação de ações.
“Somente em tiranias um ramo estatal pode concentrar em suas mãos o poder de aprovar leis, elaborar o Orçamento e executá-lo diretamente, efetuar julgamentos de índole criminal ou paralisá-los arbitrariamente”, escreveu o ministro em trecho destacado no voto.
“Maiorias ocasionais podem muito em um sistema democrático, mas certamente não podem dilacerar o coração do regime constitucional”, concluiu.
Flávio Dino mostrou que o legislativo tentou usurpar as funções do Judiciário. “A deliberação do Poder Legislativo não é imune ao controle jurisdicional, por força do princípio da inafastabilidade da jurisdição”, disse no voto.
TENTATIVA DE PROTEGER RAMAGEM
Na última quarta-feira (7), a Câmara dos Deputados votou para paralisar a ação penal que corre no STF contra Alexandre Ramagem. Ele é réu por integrar o núcleo central de associação criminosa que pretendia dar golpe de Estado para impedir a posse de Lula (PT) após a vitória na eleição presidencial, segundo denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) e investigação da PF (Polícia Federal).
O entendimento dos deputados que votaram para suspender a ação penal é que todo o processo deveria ser interrompido — o que beneficiaria, além de Ramagem, os outros réus. Seria a impunidade geral.
O relator Alexandre de Moraes discordou e repetiu a análise feita anteriormente pelo presidente da Primeira Turma, ministro Cristiano Zanin.
PRERROGATIVA DE RAMAGEM, SEGUNDO O STF
Para o STF, a prerrogativa de Ramagem como deputado só se aplica em relação a 2 dos crimes imputados a ele — são os 2 crimes que ele praticou após a diplomação: dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.
Assim, ele segue respondendo pelos outros 3 crimes: associação criminosa armada; golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
A Corte também entendeu que todos os outros réus continuarão a responder pelos 5 crimes, já que nenhum tem prerrogativas de imunidade.
AÇÃO PARA PROTEGER RAMAGEM E BOLSONARO PARTIU DO PL
O plenário da Câmara dos Deputados recebeu o pedido de suspensão ainda no início da noite da última quarta-feira (7), depois que a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) votou para proteger Alexandre Ramagem — réu no inquérito do golpe.
Com a posição da Câmara, a ação contra ele seria paralisada até que o mandato dele terminasse; ou seja, até, pelo menos, dezembro de 2026.
No plenário, 315 deputados votaram para interromper a ação penal e 143 votaram contra a paralisação do processo. Era necessária maioria absoluta para beneficiar Ramagem; ou seja, pelo menos 257 votos.
Após a aprovação, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), promulgou a resolução favorável ao deputado do PL e determinou que a decisão fosse imediatamente entregue ao STF.
STF INTERROMPE IMPUNIDADE
O problema da suspensão, segundo indicou a bancada do PT, é que abriria brecha para paralisar completamente a ação penal, e interromperia todo o trâmite no STF e beneficiaria os outros réus — entre eles o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Nesse cenário, o PT já pretendia apresentar mandado de segurança no Supremo contra o que a Câmara decidiu.
Ramagem é réu por participação na trama golpista identificada em investigação da PF e detalhada na denúncia da PGR. Em março, a Primeira Turma do STF aceitou a denúncia contra Ramagem e o tornou réu.
As investigações indicaram que ele atuou pró-golpe enquanto era diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) no governo Jair de Bolsonaro (PL).
As acusações que recaem sobre ele são de associação criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. A pena máxima pelos 5 crimes chega a 43 anos e 4 meses de prisão.
ARGUMENTOS DO PL
A ofensiva para proteger Ramagem começou com pedido do PL (Partido Liberal) apresentado à Câmara dos Deputados. A legenda recorreu ao artigo 53 da Constituição Federal para pedir a suspensão da ação no STF.
O referido artigo diz que o Congresso pode paralisar processos contra deputados e senadores que se refiram a crimes cometidos após a diplomação.
O PL entende que os crimes atribuídos a Ramagem pela PGR ocorreram depois que ele virou deputado. A data usada como parâmetro é o dia da diplomação dele: 19 de dezembro de 2022.
“Todos os supostos crimes imputados a ele teriam sido consumados após a diplomação do deputado federal Alexandre Ramagem, porquanto o crime de organização criminosa armada, que possui natureza permanente, teria se estendido até janeiro de 2023, e os demais crimes imputados teriam ocorrido no dia 8 de janeiro de 2023”, justificou o partido no ofício.
OBJETIVO DO PL
O objetivo central do partido de Bolsonaro — o PL — é “paralisar o mundo” para tentar evitar que o ex-presidente seja considerado culpado pelos 5 crimes que lhes é imputado pelo STF: associação criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado, cuja pena máxima chega a 43 anos e 4 meses de prisão
A bancada bolsonarista na Câmara dos Deputados não tem feito outra coisa senão tentar aprovar algum tipo de impunidade ao líder da extrema-direita no Brasil.
A este segmento político só interessa tentar livrar de qualquer responsabilidade, pela tentativa de golpe de Estado, que Bolsonaro liderou, a fim de tentar concorrer às eleições de 2026.
Mas pela disposição do Supremo e diante de provas consistentes e colhidas pela PF, os golpistas terão de enfrentar até o fim, o processo aberto na Corte.
Acesse a íntegra do voto de Dino: https://www.conjur.com.br/wp-content/uploads/2025/05/AP2668-Voto-Flavio-Dino.pdf