
Para sair do impasse, os propósitos de Haddad devem mudar de “equilíbrio fiscal a todo custo” para “crescimento econômico a todo custo”
As pressões e chantagens dos setores rentistas e parasitários para forçar o governo a desviar mais recursos do Orçamento em direção aos seus cofres estão aumentando cada vez mais. Eles não estão satisfeitos em receber cerca de um trilhão de reais todos os anos, desviados do Orçamento para o pagamento de juros aos detentores de títulos públicos. Acham pouco. Por isso avançam sobre as despesas públicas como Previdência Social, Saúde, Educação, Segurança, etc. Taxar os mais ricos, nem pensar.
“MERCADO” E JUROS
A manutenção das taxas de juros brasileiras, a Selic, entre as mais altas do mundo é outra exigência feita pelo chamado “mercado” – leia-se, meia dúzia de monopólios bancários – para garantir que esse ganho escandaloso seja mantido e ampliado, sem que absolutamente nada seja produzido. O fato é que a despesa financeira do governo é que é a grande “gastança” de recursos públicos.
Mas é contra as despesas com a sociedade – que já estão reprimidas – que eles tocam as trombetas. BPC, Previdência, salário mínimo, Fundeb, Bolsa Família e os investimentos públicos estão, segundo eles, consumindo “recursos demais”. Chegam até a projetar o BPC para daqui a 60 anos. É muito ridículo.
Essa sinuca de bico em que o governo se encontra atualmente no Congresso, de ter que optar entre aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) ou cortar os gastos sociais, como BPC, Fundeb, etc, só existe por conta da falta de cintura do Ministério da Fazenda. Ele impôs ao governo uma meta irreal e desnecessária de zerar as contas públicas em 2025 e 2026.
Como diz o economista André Lara Resende, a chamada “crise fiscal brasileira”, alardeada pela Faria Lima e seus porta-vozes, e que impressiona muito o ministro da Fazenda, é falsa. Não existe. A relação dívida/PIB do Brasil é muito mais folgada do que em muitos países. Isso é apenas um pretexto criado para avançar sobre os recursos da sociedade e alimentar o insaciável apetite do parasitismo financeiro.
EQUILÍBRIO DE VERDADE
E, mesmo que a intenção dessa gente fosse mesmo equilibrar as contas públicas, é evidente que o melhor caminho seria outro. Seria aumentar os investimentos, fazer crescer o país, a produção e o emprego e, com isso, fazer crescer a arrecadação. Cortar gastos e investimentos não conduz a nenhum equilíbrio fiscal. Pelo contrário, conduz, isso sim, à estagnação e a mais crise. Esses anos todos ouvindo essa ladainha neoliberal já nos deixou calejados sobre essa farsa de cortes sociais, repetida como mantra.
Elevar o IOF indiscriminadamente, num momento em que o setor produtivo já está asfixiado pelos juros lunáticos do Banco Central, como quis o governo, não parece ser também um bom caminho. Até porque a taxação dos fundos que “investem” recursos no exterior, imediatamente após o lançamento do pacote pelo ministro Fernando Haddad, fez com que o governo recuasse de pronto. Por outro lado, os cidadãos e as empresas, inclusive as produtivas, foram mantidos no pacote e afetados pela alta do IOF. Esses setores naturalmente iriam se mobilizar para tentar impedir a alta do imposto sobre operações financeiras.
O que o Congresso Nacional fez foi aproveitar a resistência ao aumento de impostos para impor mais uma derrota política ao governo. Efetivamente impediu a elevação da arrecadação e ao mesmo tempo não abriu mão das emendas e nem de outros gastos. O fato, efetivamente, abre a possibilidade de que a decisão seja questionada no Supremo Tribunal Federal, como parece ser a intenção do governo.
BOLSONARISMO SÓ QUER ARROCHO
A oposição bolsonarista, por sua vez, como é sabido, não demonstrou compromisso nenhum com o país. Demagógica como sempre, aproveitou-se de tudo isso para pressionar por mais cortes sociais e mais arrocho sobre a população. É só isso o que eles sabem fazer. São ventríloquos dos banqueiros e multinacionais.
O caminho aparentemente mais adequado para sair dessa situação seria flexibilizar a meta fiscal, reduzir drasticamente os juros e elevar os investimentos públicos e os salários. De fato, a polêmica não pode ser entre cortar gastos sociais e investimentos ou aumentar impostos.
A verdadeira polêmica que o governo deve entrar, e com firmeza, é a defesa da alteração das metas fiscais – para níveis mais realistas -, a redução dos juros – para níveis mais decentes -, se esforçar para aumentar os investimentos públicos e privados e aquecer o mercado interno. Assim, o país volta a crescer aceleradamente, arrumando a economia e equilibrando de verdade as contas públicas.
ALTERAR METAS
O passo a passo para deixar a crise para trás e atingir estes objetivos começaria com a mudança, pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), onde o governo tem maioria, da meta de inflação. Todos sabem que a meta de 3%, estabelecida por Fernando Haddad, não é realista e nem exequível num país como o Brasil. Nos últimos dez anos, apenas duas vezes essa meta foi atingida. Ela só serve para dar argumento aos financistas – de que a meta não estaria sendo cumprida – para sua cruzada pelos juros cada vez mais altos. Com metas mais realistas, o pretexto para juros altos deixaria de existir.
Reduzindo os juros, a economia reagiria com mais investimentos e mais produção. O emprego e o consumo seriam ativados e arrecadação aumentaria. As despesas financeiras desabariam e deixariam de pressionar a dívida e as contas públicas. As metas fiscais poderiam ser alteradas e a política fiscal deixaria de ser contracionista para ser expansionista. O governo Lula, que tinha lançado na campanha o objetivo de realizar um governo de “40 anos em 4”, em termos de realizações, agradeceria e a população voltaria a confiar integralmente no presidente. Isso certamente se refletiria nas pesquisas de opinião.
RECONSTRUIR O BRASIL
Insistir em manter rígida a meta de zerar o déficit é se submeter à ditadura fiscalista, que é hoje o principal instrumento do capital financeiro para chantagear e aprisionar o governo. Esse caminho, da submissão aos bancos, é suicida. É este o ponto central a ser vencido para que o governo possa atrair de volta o forte apoio da população e do setor produtivo ao projeto de reconstrução do Brasil. Isso deve ser feito com a mudança nos propósitos de Fernando Haddad. Ele disse recentemente que seu propósito sempre foi equilibrar as contas. Seu propósito tem que ser outro. A meta prioritária é reconstruir o Brasil.
SÉRGIO CRUZ