O prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto, acredita que o estado do Amazonas “fracassou” nas medidas de combate ao Covid-19. Em entrevista ao Valor, publicada nesta segunda-feira (4), o político lamentou a baixa adesão da população ao isolamento social e criticou a postura do presidente Jair Bolsonaro. Segundo ele, o líder do Executivo “rema contra” a quarentena, tendo em vista que Manaus está com uma média de apenas 40% de isolamento social.
“Admito o fracasso. Fracassamos aqui, o governador e eu. No Amazonas não acataram nossas recomendações, os decretos não foram obedecidos, o povo está nas ruas. Dia de sábado é dia de festa”, disse. “Ainda não caiu a ficha das pessoas. O que garante essa tranquilidade de que não vai pegar o Covid-19 se está vendo na televisão, nos jornais a crise no sepultamento, nos hospitais, se está vendo o vizinho pegar a doença? Uma das razões é que muitos acham que Covid-19 é doença de rico, que não dá em pobre”.
“Tem mais uma razão, que é o exemplo do presidente. Atribuo muito ao fato de Bolsonaro não ter entrado no comando da mobilização nacional. A pregação dele é: ‘vá para a rua’, ‘é uma gripezinha chinesa'”, criticou. “Todos os dias faço o apelo ‘fique em casa’, falo que o distanciamento social é o nosso único plano. Peço para quem mora na periferia ficar no barraco, porque são os mais suscetíveis. Mas quando o presidente rema contra, fica mais complicado”.
O prefeito afirma que vai intensificar o pedido para que as pessoas fiquem em casa. A ideia é evitar um cenário parecido com o de Guayaquil, no Equador, que teve pessoas enterradas em caixões de papelão.
“Vamos jogar o mais duro possível até dia 15 de maio, com comerciais de televisão, de preferência até em conjunto com o governo do Estado, para mostrarmos que se as pessoas querem viver o que Guayaquil viveu ou coisa pior, que fiquem nas ruas. Precisamos nos preparar para o pico, senão será uma desgraça, uma barbárie realmente. Temos duas semanas que serão decisivas para nos prepararmos para o confronto”, afirmou
Mortes em casas
A capital da Amazônia já vem vivendo um grande drama por causa do coronavírus. Com cerca de dois milhões de habitantes, a cidade foi a primeira do país a entrar em colapso por conta do novo coronavírus. Hospitais estão lotados, não há mais leitos de UTI, e um número crescente de pessoas está morrendo em suas casas por falta de atendimento.
Apenas no mês de abril, mais de 2 mil pessoas morreram em Manaus, um aumento de mais de 300% sobre os números históricos de morte na cidade em tempos de normalidade. A expectativa do governo local é que neste mês o número cresça ainda mais e possa ultrapassar 4 mil mortes. Mais de 30% desses óbitos acontecem em casa, porque as pessoas não conseguem atendimentos nos hospitais ou têm medo de ir até eles e se contaminarem.
O ministro da Saúde, Nelson Teich, viajou ontem a Manaus e anunciou a contratação de 267 profissionais de saúde para atuar no Amazonas. O estado tem 6.683 casos confirmados e 548 óbitos reconhecidos por Covid-19 segundo o último balanço do ministério, divulgado ontem.
Segundo a Fundação de Vigilância em Saúde (FVS-AM), 60,93% dos casos de coronavírus confirmados no estado ocorreram em Manaus. Mesmo diante do cenário calamitoso, grande parte da população tem descumprido o decreto de isolamento social e não usa máscaras ao sair de casa.