“Qual o papel da luta de classes numa realidade como a China?” é o tema desse Meia Noite em Pequim, da TV Grabois, com o pesquisador e economista Elias Jabbour abordando a questão sob o prisma histórico – a combatividade no DNA dos camponeses chineses, cujos netos, bisnetos e tataranetos constituem hoje a classe de trabalhadores urbanos, 130 milhões – e da realidade de um país que, de 2015 a 2019, teve 8.862 greves, mais de 2.000 por ano.
Em uma sociedade milenar que na base de sua trajetória tem um Estado que já nasce precocemente desenvolvimentista, já nasce para a consecução de grandes obras – como a contenção de enchentes no vale entre os rios Amarelo e o Yangtze.
Combatividade que tem como raiz o filósofo Lao Tse, sob cujos ensinamentos se repetiram as rebeliões camponesas, derrubando dinastias ineptas e corruptas, para exigir o atendimento de suas demandas.
A intensidade desse movimento grevista atual na China significa que muito dos ganhos salariais dos últimos dez anos é produto da capacidade de organização dos trabalhadores.
O que alcança o sentido maior de aumentar a participação dos salários na renda nacional. As leis do trabalho na China não são só para proteger os trabalhadores, como registra Jabbour, implicando ainda na crucial ampliação do mercado interno.
Ele também destaca a atualidade do conceito de prosperidade comum, que é a necessidade de bater de frente com as desigualdades do país.
E que exige a taxação de grandes fortunas e a colocação de limites ao poder econômico e aos monopólios privados.
Um conceito que não surge apenas da clarividência do presidente Xi Jinping, mas também da pressão de baixo para cima de parte dos trabalhadores, para que a sociedade caminhe à frente. Um verdadeiro frenesi, aponta Jabbour.
É assim que o trabalho precarizado foi sendo deixado para trás. Para um país que quer ter a razão como o primado principal de seu avanço social e econômico, essa combatividade dos netos e bisnetos de camponeses também ancora o indispensável planejamento para manter o desemprego como contingência restrita ao capitalismo.
É assim que as coisas se põem em marcha, com um salto de um ponto de desequilíbrio para outro, e novas ondas de avanços institucionais, no processo da nova economia de projetamento.
Elias Jabbour é professor dos Programas de Pós-Graduação em Ciências Econômicas e em Relações Internacionais da UERJ.