Isolado no DEM, Rodrigo Maia (RJ) se vê cada vez mais sem espaço na sigla, depois da derrota de Baleia Rossi (MDB-SP), que disputou e perdeu a presidência da Câmara para Arthur Lira (PP-AL). “As portas estão abertas para você”, disse Baleia, que é presidente nacional do MDB
A derrota sofrida, principalmente, pelo ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), na disputa em que o deputado Arthur Lira (PP-AL) venceu a corrida à presidência da Câmara, em 1º de fevereiro, por 302 a 145, contra Baleira Rossi (MDB-SP), abriu crise entre Maia e o DEM. Ele foi o principal fiador da candidatura de Baleia.
Consta que o presidente nacional do DEM, o ex-prefeito de Salvador, ACM Neto articulou com o presidente Bolsonaro e fez com que, pelo menos 2/3 da bancada votasse em Lira. Maia ficou sabendo do movimento da bancada às vésperas da eleição e acionou ACM Meto, que é presidente nacional da legenda. Neto reuniu a executiva nacional e decidiu pela neutralidade do partido. Na prática, liberou os deputados federais para votar em Lira.
Diante dessa situação, o ex-presidente da Câmara deverá desembarcar do partido e sinalizou, em princípio, que pode migrar para o PSL, ex-sigla de Bolsonaro, ou Cidadania. Recebeu também convite para migrar para o MDB.
“AS PORTAS ESTÃO ABERTAS PARA VOCÊ”
Na berlinda no DEM, Maia se movimenta. “As portas estão abertas para você”, disse Baleia horas antes da votação que sagrou Arthur Lira o novo presidente da Casa. Segundo pessoas próximas a Baleia Rossi, ele não pretende impor nenhuma decisão “de cima para baixo” se o MDB do Rio se opuser à filiação.
No começo da semana, Maia, que comandou a Câmara por quase cinco anos, desabafou com o emedebista sobre a dissidência em seu próprio partido. Depois de ouvir o desabafo de Maia, que se disse insatisfeito na legenda, Baleia lhe fez o convite.
LEALDADE E CUMPLICIDADE MIRANDO 2022
Maia e Baleia têm relação próxima. Há cerca de um ano, Baleia foi assediado por interlocutores do Planalto para se aproximar do governo, fazer seus pleitos e adotar postura simpática a Bolsonaro.
O deputado, no entanto, manteve o vínculo com Maia, que com frequência faz críticas ao presidente. Além disso, ambos têm interesse em comum: articular candidatura de centro para disputar a Presidência da República em 2022.
PARA QUE PARTIDO IR
A mudança de sigla, todavia, não é algo simples, pois outras peças do tabuleiro deverão ser mexidas. No PSL, há resistências à Maia, sobretudo da ala bolsonarista do partido. O MDB fluminense “tem muitos problemas”, disse o analista político do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), Antônio Augusto de Queiroz, para quem Maia no Cidadania “cairia muito bem”.
O Cidadania articula, com apoio de FHC, o nome de Luciano Huck à Presidência da República, “mas a saída nessa direção para Rodrigo Maia seria mais que ‘razoável’”, ponderou Queiroz. Porque talvez com a desembarque de Fausto Silva, da Rede Globo, pode fazer com que Huck o substitua no programa de domingo “pilotando” o “Domingão do Faustão”. Se isso acontecer, Queiroz avalia que Huck desista da candidatura.
“Rodrigo Maia, Cidadania, MDB que é de centro, tudo se encaixa num projeto à Presidência incursionado pelo centro”, enumerou.
DEM PRAGMÁTICO
Ao agir como agiu, o DEM certamente já estava preparado para a reação de Rodrigo Maia. Conta feita, colocou em prática as tratativas com o governo, cujo resultado é por todos conhecido. Entre um ex-presidente da Câmara sem poder e cargos no governo federal, ACM Neto preferiu a 2ª opção.
O líder do DEM na Câmara, Efraim Filho divulgou, na tarde desta segunda-feira (8), nota na qual diz que a eventual saída de Rodrigo Maia “ajudará a pacificar” o partido. O deputado afirma também que “o Democratas é um partido plural e não tem dono”.
O texto assinado pelo líder do DEM deixa Maia ainda mais isolado internamente. Com o DEM sendo acusado de pular no colo de Jair Bolsonaro, Efraim escreve que “eleições serão discutidas em 2022” e que ACM Neto “preserva a independência”.
“Passada a eleição da Câmara, a bancada Democrata já se reorganizou, elegeu o líder e o membro para compor a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. Foco no trabalho em 2021. Serão prioridades saúde e vacinação, crescimento econômico e geração de empregos. Eleições serão discutidas em 2022. O Democratas é o partido que mais cresceu nas eleições municipais de 2020, venceu as eleições no Senado Federal, comandará uma das Casas do Congresso e permanecerá protagonista da agenda do Brasil para os próximos dois anos. Rodrigo Maia e o Democratas entraram juntos para a história do país, [o deputado] tem nosso respeito por esses momentos marcantes dessa parceria. Porém, com o anúncio de sua saída, deixa claro que chegou ao fim de um ciclo no partido, e essa decisão ajudará a pacificar o Democratas”, diz trecho da nota.
EM DEFESA DO PRESIDENTE NACIONAL DA SIGLA
“Somos testemunhas de que o presidente ACM Neto buscou convencer deputados a se alinharem com Rodrigo, fez apelos à bancada, mas, diante da decisão adversa da maioria, buscou a neutralidade em um gesto de respeito a Rodrigo Maia. Na entrevista [ao Valor Econômico], Rodrigo tenta, injustamente, terceirizar a responsabilidade pela ruína do bloco, não faz sua autocrítica, nem assume a sua mea-culpa. É injusto colocar em nossa conta a derrota do seu candidato à sucessão. Insistimos que o Democratas não tem dono e ainda preserva um de seus maiores patrimônios: a capacidade de decidir pela vontade da maioria, e não por imposição de cúpula partidária. Isso, sim, seria ato antidemocrático. O presidente ACM Neto foi correto ao respeitar a decisão da bancada, seguir o caminho da neutralidade quanto ao governo. Preserva a independência do partido e tem a nossa solidariedade e confiança.”
Efraim também aponta Rodrigo Maia como o culpado pelo fracasso da candidatura de Baleia Rossi, escolhido pelo então presidente da Câmara, para ser seu sucessor, ignorando que a desestabilização da bancada em favor de Lira se deu por conta da intervenção de Bolsonaro no partido, com seus aliados internos.
“O Democratas é um partido plural e não tem dono. A bancada da Câmara não tem dono. O líder é eleito pela vontade expressa da maioria. Essa mesma maioria, que torna a decisão legítima, faltou a Rodrigo Maia para compor o bloco de centro-esquerda na disputa pela presidência. Na verdade, ao tentar levar o partido para essa posição, sem consultar a bancada sobre o que desejava, Rodrigo se viu isolado e perdeu o comando do processo, e muitas vezes o alertamos sobre essa dificuldade. Era a sua sucessão, cabia a ele construir os consensos e conduzir o processo. Na democracia, maioria não se impõe, maioria se conquista.”
MARCOS VERLAINE (colaborador)