No dia da abertura, um jornalista do The Guardian sumiu na floresta brasileira. Apoiadores de Bolsonaro estavam fazendo ameaças de morte por conta de suas denúncias de desmatamento
Não se sabe quem é mais cínico e mente mais na chamada Cúpula das Américas, aberta nesta segunda-feira (6), em Los Angeles, na Califórnia, EUA. Se o patrocinador do golpe nazista na Ucrânia, Joe Biden, que determinou unilateralmente que só entra na reunião quem respeita o que ele chama de democracia, ou Jair Bolsonaro, financiado por desmatadores, latifundiários e garimpeiros ilegais e que jura de pés juntos que vai proteger a Amazônia.
É melancólica a situação do encontro patrocinado por Biden. Em queda vertiginosa nas pesquisas de opinião da população americana, ele não faz outra coisa a não ser gastar dinheiro do contribuinte com armas e bombas para abastecer os “batalhões azovs” ucranianos. Já foram mais de US$ 40 bilhões. Com inflação de 8,3%, não há programas de melhorias salariais, verbas para a saúde pública e nem obras de infraestrutura para reparar estradas e pontes decadentes, que demandam US$ 41,8 bilhões, a mesma quantia entregue em armas à Ucrânia.
Tanto Joe Biden quanto Jair Bolsonaro estão por baixo na opinião pública de seus países e estão perto de derrotas eleitorais. Lá, na eleição parlamentar de meio de mandato e aqui, nas eleições presidenciais deste ano.
A promessa de Bolsonaro de assinar o comunicado conjunto garantindo que seu governo vai cuidar da Amazônia e defender o meio ambiente deve ganhar como a maior mentira do encontro. Ele disse que vai defender as aldeias indígenas e ser transparente. A fala foi feita no mesmo dia em que desapareceu na região da floresta, um jornalista britânico, Dom Phillips, colaborador do jornal The Guardian, e o indigenista Bruno Pereira. Os dois estavam recebendo ameaças de morte de grileiros, apoiadores de Bolsonaro, e desmatadores que vinham sendo denunciados pelo jornalista.
Alguns dias antes de embarcar para a Califórnia, Bolsonaro já tinha sinalizado sua “grande” preocupação com a Amazônia, tanto que prometeu pomposamente entregar a sua guarda e proteção ao bilionário americano Elon Musk, um aventureiro que ganha dinheiro fazendo grandes negóciatas mundo afora. Disse que a Amazônia estaria em melhores mãos com Musk do que sendo vigiada pelos equipamentos do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), órgão elogiado em todo o mundo pelo avanço tecnológico e capacidade de seu técnicos e engenheiros.
Não satisfeito, Bolsonaro resolveu também agradar a Casa Branca oferecendo às empresas americanas – ou europeias, quem sabe – a venda da Eletrobrás, maior empresa de energia da América Latina, que possui uma das maiores redes de hidrelétricas do mundo e nos últimos três anos teve um lucro de R$ 23 bilhões. E não é qualquer venda. Bolsonaro está oferecendo uma pechincha. Uma empresa inglesa, a National Grid, que só tem transmissão e não tem nenhuma usina, vale US$ 44 bilhões, enquanto a companhia brasileira é avaliada, segundo Roberto D´Araújo, do Instituto Ilumina, em R$ 400 bilhões, mas o “mito” está oferecendo a Eletrobrás por módicos R$ 46 bilhões.
A outra oferta também entrou recentemente no radar de Bolsonaro, apesar dele saber que o país vai pegar fogo se ele tentar vender a empresa símbolo do país. Ele quer oferecer a Petrobrás aos americanos. Por isso, também alguns dias antes da “cúpula”, afirmou que está disposto a vender a petroleira brasileira, responsável pela descoberta do Pré-sal, uma das maiores províncias de petróleo do mundo, com 100 bilhões de barris já estimados, podendo chegar, segundo alguns especialistas, a 300 bilhões de barris.
O plano de Bolsonaro é conseguir uma foto abraçado com Biden – alguns dizem que é o abraço dos afogados – para tentar diminuir a rejeição da população brasileira ao seu nome. É que o pária, defensor do fascismo, das milícias, da violência, do ódio, do racismo e de outras excrescências, não tem conseguido aparecer ultimamente com nenhuma autoridade estrangeira, até porque ninguém quer se prestar a isso. Então, a condição para não afundar de vez a Cúpula, que já tinha a ausência do México, foi Biden concordar com a foto, que Bolsonaro pretende usar na campanha.
O presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, disse que só participaria da reunião se todos os países do hemisfério ocidental fossem convidados. Ele não concordou com a discriminação cínica de Biden a Cuba, Venezuela e Nicarágua. Biden acha que pode se intrometer nos assuntos internos de outros países, como se fosse o xerife do mundo. Na opinião de Obrador, Biden, patrocinador de golpes, não tem autoridade moral para definir que país é ou não é democrático.
Mesmo não fazendo parte do evento, um nome tem papel central na estratégia de dominação norte-americana sobre a América Latina: a China, que os EUA não querem ver por nada. Se na década de 1990 praticamente todos os países do continente tinham os Estados Unidos como principal parceiro comercial, o cenário é bem diferente nos dias atuais. Quase todos os países da região têm intensa troca comercial com o gigante asiático. O Brasil tem como principal parceiro comercial exatamente a China e os EUA têm muito pouco a oferecer a esses países.
SÉRGIO CRUZ