A medida infralegal atinge apenas o funcionalismo federal da União. “…mas pode servir de referência para outros poderes e para Estados e municípios”, escreve Nepomuceno
O Ministério da Economia, por meio da Secretária de Gestão e Desempenho de Pessoal da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, editou o Decreto 10.620, publicado no DOU (Diário Oficial da União), de 5 de fevereiro, que, segundo o assessor parlamentar Vladimir Nepomuceno, é o “primeiro passo para privatizar a Previdência dos servidores”, denuncia.
Em artigo publicado no portal do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria parlamentar), na terça-feira (16), Nepomuceno esclarece que o decreto “foi apresentado como um passo na direção de regulamentar os parágrafos 20 e 22 do artigo 40 da Constituição Federal, com redação dada pela Emenda Constitucional 103/19 (Reforma da Previdência). O decreto trata exclusivamente de servidores do Poder Executivo federal, mas pode servir de referência para outros poderes e para estados e municípios.”
No artigo, Nepomuceno desnuda a intenção do governo ao chamar a atenção para o “artigo 3º” do decreto, que segundo ele “vai no sentido oposto ao texto constitucional ao propor dividir os servidores do Executivo federal, que têm um único regime próprio e uma única gestão, no Ministério da Economia, em duas instituições gestoras diferentes, como se não fossem de um mesmo regime próprio.”
“Os da Administração direta ficam sob a responsabilidade do órgão central do Sipec (Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal), ligado à Secretaria de Gestão e Desempenho de Pessoal da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, como é hoje”, esclarece.
E continua: “Os servidores de autarquias e fundações públicas, a grande maioria, passariam a ficar sob a responsabilidade do INSS. Cabe observar que o INSS, em suas competências, determinadas por norma legal, não consta a gestão de regime próprio de previdência. Ou seja, o INSS não tem competência legal para gerir o regime de Previdência dos servidores públicos”.
A seu turno, o assessor técnico do Diap, Neuriberg Dias, ponderou que “o primeiro passo, que na minha opinião foi feito na Reforma da Previdência, [aconteceu] ao unificar as regras e impor novas regras sobre previdência complementar a todos os entes, em especial, estados e municípios.”
“Enfim, a Reforma Administrava vem para consumar a da Previdência, e depois voltar com a proposta de capitalização”, que o Congresso rejeitou em 2019 quando a reforma foi discutida e aprovada pelo Poder Legislativo.
FUTURA PRIVATIZAÇÃO
“Mas, afinal, qual seria o objetivo por trás desse decreto?”, indaga o assessor, especialista em Previdência Social.
E responde perguntando: “Talvez a futura privatização de pelo menos parte do atual RPPS federal, com o retorno dos servidores de autarquias e fundações (os de “segunda categoria”) ao Regime Geral de Previdência Social, como era antes da promulgação da Constituição?”
Segundo Nepomuceno, essa “hipótese não pode ser descartada. Se alinharmos o que consta do Decreto 10.620/21 com a PEC 32/20, não fica difícil vislumbrar o que acabo de dizer acima.”
MODUS OPERANDI DO GOVERNO
Perspicaz, o assessor chama a atenção para detalhe de como o governo opera nesse sentido — fazendo “aos poucos”, “sem alarde” —, que ainda segundo o assessor parlamentar é “para não chamar a atenção”, a fim de “não estimular resistência de servidores”.
“A alternativa seria uma sinalização, em que o governo estaria começando a preservar os cargos que serão transformados em típicos de Estado”, acrescenta.
ELO ENTRE O DECRETO E A REFORMA ADMINISTRATIVA
Pela Reforma Administrativa (PEC 32/20 — cujo texto já está na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) para exame da constitucionalidade e admissibilidade da proposta —, “seriam esses os únicos que continuariam estatutários, em Regime Próprio de Previdência, novo e apartado dos demais. Isso, além de terem mais proteção, garantias e segurança em relação aos demais trabalhadores do serviço público”, especula.
“Uma coisa é certa, não podemos nos fixar à PEC 32/20, como se fosse ‘a’ Reforma Administrativa, que, como já dito em outros artigos, está sendo feita por meio de diversos processos e proposições. Além, é claro, de estar casada com outras reformas”, finaliza.
MARCOS VERLAINE (colaborador)