Segundo o embaixador, por ter a condição de refugiado, Moïse estava sob proteção do governo do Brasil. Em seis anos, cinco congoleses foram mortos no país e diplomacia congolesa nunca recebeu respostas do governo brasileiro
A embaixada da República Democrática do Congo informou que mantém contato com familiares do estudante congolês Moïse Kabagambe, brutalmente assassinado no Rio de Janeiro, e que vai cobrar um pronunciamento do Itamaraty sobre o brutal assassinato. O órgão diplomático disse ainda que vai exigir respostas sobre as investigações também dos outros casos de congoleses mortos no Rio. O crime está sendo investigado pela Polícia Civil.
De acordo com a embaixada da República Democrática do Congo, o jovem de 24 anos, é a quinta vítima assassinada no país desde 2019, sendo três mortes no Rio, uma em São Paulo e uma em Brasília. Ainda em 2018, um cidadão congolês foi morto a tiros em um bar em Uberlândia (MG) ao ser confundido com outra pessoa, totalizando seis assassinatos em seis anos. De acordo com o delegado Fábio Ruz, responsável pelo inquérito, as investigações indicam que Jacques Onza foi confundido com um desafeto do autor dos disparos por ser muito parecido com o alvo do assassino.
O embaixador do Congo no Brasil, Mutombo Bakafwa Nsenda, disse ao portal G1 que em todos os casos, a representação diplomática do país cobrou do Itamaraty respostas sobre os crimes, mas nunca houve retorno. “Enviamos cartas ao Itamaraty dizendo que a Justiça precisava ser feita. Todas as vezes em que escrevemos, nunca tivemos uma resposta. O último caso foi o de um rapaz assassinado na prisão por outros prisioneiros, que estavam com ele na mesma cela. Contatamos o Itamaraty e não tivemos nenhuma resposta – é um caso que aconteceu há mais de seis meses e não houve reparação judicial ou civil para a família dele”, disse o diplomata.
Segundo o embaixador, por ter a condição de refugiado, Moïse estava sob proteção do governo do Brasil. “A posição do governo congolês está relacionada ao status de Moïse – ele era um refugiado que chegou ao Brasil em 2014. Como todo refugiado, ele e a família estão sob proteção do estado brasileiro”. Nossa embaixada escreveu oficialmente ao Itamaraty para relatar os fatos que nos foram comunicados no Rio”, contou Nsenda, que não recebeu resposta, relata.
Fugindo da guerra no seu país, o congolês que chegou ao Brasil em 2014, juntamente com sua família. Nsenda destaca que o rapaz, por ter tal condição, não era registrado na embaixada do país. “Este é, sobretudo, o caso de um refugiado. Ele não estava registrado ou era conhecido pela embaixada – fomos informados apenas depois da morte dele. Mas como se trata de um compatriota, a embaixada escreveu imediatamente ao Itamaraty e também informou o governo da República Democrática do Congo”, informou o embaixador.
Moïse foi amarrado e espancado até a morte na segunda-feira (24). Ele trabalhava por diárias em um quiosque na Barra da Tijuca, na Zona Oeste da cidade, e teria ido cobrar R$ 200. As agressões foram gravadas pelas câmeras de segurança do estabelecimento. E, segundo um primo da vítima, o autônomo Yannick Iluanga Kamanda, de 33 anos, que conta ter visto as imagens, elas mostram Moïse reclamando com o gerente do quiosque, que pega um pedaço de pau para ameaçar o jovem. O congolês chega a se defender com uma cadeira, diz.
Mataram o meu filho a socos e pontapés
Os familiares do jovem também atribuem o crime ao racismo e à xenofobia, que é o preconceito contra estrangeiros. Meu filho cresceu aqui, estudou aqui. Todos os amigos dele são brasileiros. Mas hoje é vergonha. Morreu no Brasil. Quero justiça” relatou a mãe do jovem, Ivana Lay. A comunidade congolesa do Rio de Janeiro também se posicionou: “Esse ato brutal, que não somente manifesta o racismo estrutural da sociedade brasileira, mas claramente demonstra a xenofobia dentro das suas formas contra os estrangeiros”. “Eles quebraram as costas do meu filho, quebraram o pescoço. Eu fugi do Congo para que eles não nos matassem. No entanto, eles mataram o meu filho aqui como matam em meu país. Mataram o meu filho a socos, pontapés. Mataram ele como um bicho. (…) Ele era trabalhador e muito honesto. Ganhava pouco, mas era dele. No final, chegava com parte do dinheiro e me dava para ajudar a pagar o aluguel”, disse Ivana.
Na terça-feira, a Prefeitura do Rio suspendeu a licença do alvará de funcionamento do quiosque Tropicalia, onde Moïse foi assassinado. Os quiosques da região são administrados a partir de uma concessão privada, a Orla Rio.
Protestos por justiça para Moïse, realizados por familiares, representantes do movimento negro e movimentos sociais ocorreram na cidade; novos atos estão sendo convocada pelas redes sociais para o próximo sábado, às 10h, no Posto 8 da praia da Barra, na avenida Lúcio Costa, altura do número 6.900.
Até o momento, a Justiça do Rio de Janeiro decretou a prisão dos três homens que aparecem nas imagens de vídeo, amarrando e agredindo com pauladas. Imagens mostram o congolês levando ao menos 30 pauladas após ter sido amarrado.