O articulista Gideon Levy, denuncia a prática de assassinatos em série por parte de Israel contra palestinos e líderes, ativistas ou cientistas dos países vizinhos do Oreinte Médio em artigo publicado, no dia 29, no jornal israelense Haaretz, com o título “Orgulho de Israel: assassinatos” do qual traduzimos e reproduzimos os principais trechos:
GIDEON LEVY*
Ao lado da irrigação por gotejamento e os tomates cereja, há poucas áreas das quais Israel apresenta mais orgulho do que aquilo que denomina de “morte de alvos” que são de fato assassinatos em larga escala realizados pelo Estado.
Poucos Estados (EUA e Arábia Saudita entre eles) assassinam seus adversários, mas, com certeza não em tão grande número como o faz Israel.
Desde o ano 2000, as forças israelenses assassinaram cerca de 70 palestinos, grande parte deles claramente ativistas políticos e não adeptos da luta armada, em “mortes de alvos” planejadas.
O assassinato de sexta-feira do professor Mohsen Fakhrizadeh no Bulevar Khomeini na periferia de Teerã, não foi o primeiro assassinato de um cientista nuclear iraniano. Antes dele, cerca de dez cientistas foram mortos, muitos deles, se não todos, presumivelmente por Israel.
Como colocou, na mesma sexta-feira, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, com um sorriso mal disfarçado? “Foi uma semana de conquistas”.
Estas “conquistas” de fato inflamam a imaginação. No programa de notícias noturno de sexta-feira do Canal 12, um painel de gigantes debateu se a ação foi de ‘pistoleiros’ ou de algum poderoso dispositivo explosivo, como afirmava um analista de assuntos árabes.
Só houve uma questão que não foi levantada durante a argumentação, neste ou em qualquer outro fórum: se estas “mortes de alvos” são legítimas.
O simples questionamento é considerado uma heresia, traição. Não foi legítimo tirar a vida do Dr. Thabet Thabet, um dentista e líder do partido Fatah em Tul Karem, em dezembro de 2000? Não foi permitido matar Khalil al Wazir (conhecido como Abu Jihad) em sua cama diante de sua esposa e filhos em Túnis em 1988?
A Israel, tudo é permitido.
Os palestinos que planejaram o assassinato do ministro de Turismo, Rehavam Zeevi, foram condenados à prisão perpétua. Os assassinos de Abu Jihad tornaram-se ministros de gabinete e heróis.
A questão do propósito e da eficácia dos assassinatos quase nunca é discutida. O fato de que as operações são descritas como de estilo James Bond e que os gloriosos Mossad e Shin Bet [serviço secreto interno] estejam por trás deles é suficiente para silenciar qualquer conversa sobre questionamento.
Se uma operação foi tão bem-sucedida como a desta sexta-feira, é sinal de que ela permitida e também vale a pena. Todas as outras questões são simplesmente subversivas.
Ainda assim deve-se perguntar: O que aconteceria se agentes estrangeiros tivessem varrido os professores Israel Dostrovsky e Ernst David Bergmann, Shalhevet Freier ou Shaul Horev, os históricos israelenses que fizeram o trabalho similar a Fakhrizadeh? O que Israel diria? Como responderia o Estado? Teria paralisado seu programa nuclear? Não teria lançado uma campanha de revanche por todo o mundo?
Amos Yadlin, um ex-brigadeiro da Força Aérea, que é hoje o diretor do Instituto para os Estudos de Segurança Nacional da Universidade de Tel Aviv, tuitou no fim de semana sobre Fakhrizadeh: “O homem tratava com todos os aspectos das atividades nucleares ilegítimas iranianas”.
Uma questão: existe algo assim como “atividades nucleares ilegítimas de Israel”? E se sim, seu planejador merece também ser morto? Se não, isso não quer dizer que a Israel é permitido fazer qualquer coisa, incluindo as que não são permitidas a nenhum outros Estado?
Israel tem permissão para matar o “pai do programa nuclear iraniano” assim como lhe é permitido suar todos os tipos de armas e munição proibidas a outros Estados.
A questão que permanece é se o assassinato de sexta-feira vai deter o programa nuclear iraniano ou, talvez, o acelerar. Se o assassinato levará a um duro ataque de represália? Os especialistas todos naturalmente concordaram: o Irã certamente via se vingar. E daí? Ainda assim, valeu a pena? Claro. Afinal de contas, mais uma vez teremos mostrado a eles o que Israel sabe fazer melhor, à exceção da irrigação por gotejamento e os tomates cereja: matar e destruir.
*Jornalista, membro da direção do jornal Haaretz. Foi assessor do presidente israelense Shimon Peres